Viradouro: negras escravizadas, resistência e cultura negra

Por Carolina Cacau

Imagem: Reprodução/ Esquerda Diário

Na última quarta feira (26), a escola de Samba Viradouro de Niterói foi campeã do Carnaval 2020 do Rio de Janeiro com o enredo “Viradouro de Alma lavada” em referência as Ganhadeiras de Itapuã, quinta gerações de mulheres negras que lavavam roupa na Lagoa de Abaeté, atividade que remonta o tempo da escravidão no século XIX. O grupo atualmente é composto por 12 mulheres, jovens e idosas entre 08 e 78 anos de idade e carregam consigo não apenas o samba de roda como parte de sua tradição, mas também a história e memória de luta e resistência de escravas de ganho que lavavam roupa, vendiam comida, transportavam mercadoria a fim de comprar sua alforria.

A Viradouro trouxe para avenida parte da história que não é contada nos livros dos historiadores capitalista, onde a tradição e a cultura negra passada desde os negros e negras escravizados até as gerações mais contemporâneas é desfrutada em toda sua beleza e magnitude. Toda essa beleza da história do nosso povo se torna ainda mais emocionante quando representado através da imagem dos escravos de ganho que protagonizaram ao longo da história inúmeras vezes lutas contra senhores de escravos, greves que paralisaram a circulação de mercadoria nas cidades, ajudaram nas fugas para os quilombos, etc, sobretudo as escravas de ganho, as ganhadeiras que por elas se entrelaçavam os fios decisivos de toda atividade colonial, responsáveis pela alimentação dos negros escravizados, vendendo peixes e quitutes pela cidade, muitas vezes se enfrentavam diretamente com a repressão do estado que as proibia de vender ou taxavam diretamente seu comércio.

Enredos como esse da Viradouro, mas também como o da Mangueira que trouxe críticas à repressão policial e ao genocídio povo negro e periférico no governo Witzel, assim como da escola Unidos do Vigário Geral e da São Clemente que criticaram abertamente Bolsonaro, mostram que o carnaval e o samba como expressão da cultura negra e dos trabalhadores são sem sombra de dúvida um ponto de choque e enfrentamento ao projeto de país bolsonarista onde trabalhadores não têm direitos e a identidade negra nada tem a oferecer. Enredos e samba-enredos que trouxeram à avenida críticas anti-racistas e ao projeto de país reacionário de Bolsonaro, como estes, expressam um sentimento legítimo dos trabalhadores e trabalhadoras cariocas.

Assim como a campeã Viradouro fez, trazer a história de mulheres negras que resistiram ao longo da escravidão até os dias de hoje onde o capitalismo e racismo as destroçam todos os dias, mostrando no vocabulários nagô e na cultura religiosa de matriz africana toda força e potencialidade para se enfrentar todos aqueles que a querem destruir, como Bolsonaro, Crivella e Witzel. Em um estado como o Rio de Janeiro onde nem os sonhos das crianças negras são deixados em paz, como foi o caso da pequena Agatha assassinada com um tiro de fuzil pela polícia militar, onde a um número crescente de ataques a terreiros de candomblé e umbanda, reivindicar a cultura e a identidade negra como a Viradouro e outras escolas fizeram é bastante importante. Mesmo assim devemos estar atentos com os limites que uma luta única e exclusivamente pela via cultural tem, sabendo que a cultura negra é um ponto de apoio a luta anti-racista e dos trabalhadores e se entusiasmar com toda expressão legítima e anti-racista de cada trabalhador e trabalhadora que encheu os olhos de lágrimas vendo passar na avenida a história de luta e resistência do nosso povo.

 

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