Violência machista marca o cotidiano das mulheres que vivem em Lisboa

Primeiro inquérito municipal à violência doméstica e de género revela que o impacto deste tipo de violência é maior no quotidiano das mulheres e que 2 em cada 3 situações ficam por denunciar, devido à falta de proteção imediata e apoio às vítimas, sobretudo, às que se encontram numa situação de vulnerabilidade social.

O primeiro Inquérito Municipal à Violência Doméstica e de Género resulta de uma parceria da autarquia de Lisboa com o Observatório Nacional de Violência e Género (ONVG)(link is external) e foi coordenado pelo sociólogo Manuel Lisboa. A apresentação dos resultados teve lugar esta terça-feira, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

O estudo vai ao encontro de outros feitos a nível nacional e permite um olhar de perto sobre um dos territórios nacionais com maior número de ocorrências criminais. No primeiro semestre deste ano, a violência doméstica foi o crime mais investigado em Lisboa, com 2.043 inquéritos abertos, segundo os dados do Ministério Público, citados pelo DN, também esta terça-feira.

O inquérito foi realizado porta-a-porta, a 1314 mulheres e 1302 homens com mais de 18 anos, e revela que a prevalência de vitimação física, psicológica e sexual, em geral, é maior entre homens (61,9 por cento) do que entre mulheres (50,3 por cento). “Eles têm uma maior exposição pública e também uma maior interação”, ficando, por isso, “mais expostos” a situações de violência, explica o investigador.

“A violência contra as mulheres é fundamentalmente baseada na desigualdade de género e nas relações de poder”, salientou Manuel Lisboa.

Porém, há uma prevalência de género nos agressores e também nos motivos da violência, dado que são as mulheres quem mais sofre violência doméstica e na intimidade, por exemplo. Segundo os resultados citados pelo Público, 53,3 por cento dos homens que foram vítimas de alguma forma de violência, foram alvo de agressores masculinos, e as mulheres são também, sobretudo, agredidas por homens (83 por cento). Elas são também as que mais sofrem com atos de violência psicológica, enquanto que no total dos inquiridos foram os homens quem relatou maior incidência de violência física.

No universo masculino, a violência tende a ocorrer em idades mais baixas e em espaços públicos, indica o jornal que já teve acesso ao estudo. No universo das mulheres, a violência ocorre em todas as idades e mais nos espaços privados e no seio de relações familiares ou íntimas. “A violência contra as mulheres é fundamentalmente baseada na desigualdade de género e nas relações de poder”, salientou Manuel Lisboa.

A prevalência, na violência doméstica, até parece ser semelhante: 28 por cento das mulheres e 26 por cento dos homens afirmam já ter sido vítimas. Contudo, estes valores correspondem a “violência acumulada”, explicou o sociólogo, acrescentando que tal “tem muito a ver com processos de socialização, que ocorrem durante a infância”. Quando se analisa apenas a violência dentro das relações de intimidade, o critério do género e o machismo são evidentes: 23 por cento das mulheres inquiridas e 10,85 por cento dos homens afirmaram já ter sido vítimas.

Além disto, o inquérito também revela que a discriminação sociocultural sobre as mulheres é ainda elevada (62,8 por cento) e que o impacto da violência é maior no quotidiano destas: mais de metade (52,9 por cento) teve de mudar as suas rotinas depois de ter sofrido um ato de violência; um terço desenvolveu problemas psicológicos; uma em cada dez sente que a sua sexualidade ficou afetada; e uma em cada vinte pensou em suicídio.

Os dados sobre os piropos ou o assédio verbal e sexual, revelam também uma experiência de violência marcada pelo género: as mulheres dizem-se mais incomodadas (20,1 por cento) e mais ofendidas (3,1 por cento); os homens lideram o critério do “sentiu-se feliz/elogiado, ou achou graça” (26,2 por cento) e apenas 0,4 por cento se sentiu alguma vez ofendido.

Duas em cada três situações de violência de género ficaram por denunciar

O estudo revela ainda que duas em cada três mulheres, que moram em Lisboa e já foram vítimas de violência de doméstica, não denunciaram esses atos às autoridades policiais. Só uma pequena parcela das mulheres vítimas deste tipo de violência contactou as autoridades (6,4 por cento), os serviços de saúde (1,4 por cento), ou alguma organização não governamental (1,5 por cento).

Os motivos que levam ao silêncio são diversos, porém, para Manuel Lisboa, os números mostram que ainda há muito para fazer em matéria de prevenção e combate à violência. Parece-lhe, desde logo, que “é preciso garantir proteção imediata às vítimas e apoio, sobretudo, às que se encontram numa situação de vulnerabilidade social”. Na apresentação do inquérito, o sociólogo defendeu a criação de um centro de atendimento imediato às vítimas de violência doméstica e de género.

Ainda assim, desde que a violência doméstica se tornou um crime público, em 2000, as participações triplicaram. No ano passado, houve 32507 participações, segundo o atual Relatório Anual de Segurança Interna, disponível no site da Assembleia da República. O distrito de Lisboa liderou o número de participações feitas à PSP e à GNR (6161).

Fonte: Esquerda.net.

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