Uma universidade em Blumenau

Por Elaine Tavares .

Fotos de Catarina Gewehr.

O homem estava parado na porta de um singelo bar. Tinha um prato de carne na mão e se preparava para comer. Foi quando viu a multidão que vinha pelo lado esquerdo da rua. Eram milhares os que vinham pela rua afora, coisa difícil de se ver na conservadora Blumenau. A maioria era formada por jovens, mas também se podia ver velhos militantes sociais, sindicalistas e até políticos. Aquela não era uma passeata qualquer. Ela servia para unificar pessoas de todos os matizes num único grito: a universidade de Blumenau agora tinha de ser federal.

A marcha aconteceu depois do anúncio feito pela presidente Dilma Roussef de que haveria uma universidade federal em Blumenau. E esse é um sonho antigo das gentes do lugar. Tanto que desde há anos professores, técnicos-administrativos e estudantes lutam para tornar a tradicional FURB uma federal. Ela nasceu em 1964, com a Faculdade de Ciências Econômicas,  cresceu em 1967, com mais algumas faculdades, mas só teve o estatuto de universidade em 1986, sendo a primeira no interior do Estado. A proposta, já lançada há anos, era de que ela fosse encampada pelo sistema federal, uma vez que já é uma universidade consolidada e, por ser pública municipal, segue todos os trâmites de uma instituição pública, se diferenciando das demais universidades privadas do Sistema Acafe.

Durante anos os estudantes , professores e técnicos-adminsitrativos se mobilizaram, fizeram campanhas, encaminharam documentos. Porque a FURB hoje ainda precisa cobrar mensalidades para se manter, já que o município não dá conta de assumir todos os custos. E, para os filhos do vale catarinense onde fica Blumenau, uma federal é um sonho há muito acalentado. Cidade tipicamente industrial, centro das empresas têxteis, Blumenau é um celeiro de jovens sedentos por conhecimento. Mas, muitos deles ficam pelo caminho, porque não podem pagar as mensalidades, nem conseguem se manter na capital. Por isso a federalização era uma esperança concreta. Isso acontecendo, centenas de jovens poderiam ingressar numa faculdade de qualidade, padrão FURB. Ali, tudo está pronto, são décadas de trabalho. Bastaria incorporar os prédios, os laboratórios, os professores, os trabalhadores e seguir a vida. Mas haveria uma abissal diferença: a gurizada não precisaria mais pagar os altos valores das mensalidades.

Por isso o anúncio de Dilma caiu como um raio em Blumenau. E por isso todos foram ás ruas para lembrar dessa luta, dessa espera, desse desejo.

O homem parado no bar tem uma filha adolescente. Ela quer ser  médica. Ele é vendedor numa loja de ferramentas. Nunca teria condições. “Mas, agora, se a FURB virar federal, ela pode”, dizia, animado, enquanto saía pela passeata adentro, distribuindo carne aos estudantes que cantavam palavras de ordem. Havia uma vibração única naquela multidão. Uma coisa bonita de se ver. Dois estudantes, de braços dados, não acreditaram quando olharam para o lado e viram, em mangas de camisa, o próprio reitor da FURB, João Natel.

– É ele mesmo?

– Claro que é. Ele sempre esteve com a gente!

 E lá se foram todos, aos gritos, esperando a boa nova.

Mas, no fim da tarde veio a decepção. A notícia dada pela imprensa era de que o que iria ser feito era a criação de um braço da Universidade Federal de Santa Catarina, a UFSC. Decepção total. Uma extensão do campus da UFSC exigiria tempo demais, compra de terreno, construção de prédios, contratações novas. Tudo isso iria demorar demais e, além do mais, não ofereceria todos os cursos que já existem na FURB. Ia por água abaixo o sonho da filha do ferramenteiro de ser médica. Baixou um longo silêncio na noite de Blumenau.

Reuniões foram feitas com o povo do PT. Seria possível que os políticos locais não tivessem informado à presidente do sonho das gentes de Blumenau? Seria possível que a ministra Ideli Salvatti não soubesse? Seria possível que a presidente fosse tão insensível aos desejos daquela louca juventude? Ela havia estado ali há pouco tempo e fora informada disso.

O agora deputado Décio Lima, ex-prefeito de Blumenau, e do partido da presidente, colocou uma trava, via imprensa: “Se a FURB for federalizada pode abrir um precedente. O governo não poderá absorver todas”.  Esse é um fato. Mas, alegam os estudantes, a FURB é a única que tem feito uma luta incessante desde há anos para a federalização. Os estudantes de Blumenau merecem isso. Têm sido incansáveis nessa batalha, ano após ano. Isso teria de ser levado em conta.

Não obstante a sentença do deputado parece ainda fazer eco na cidade. O silêncio perdura. O reitor João Natel deverá se reunir com o ministro da Educação em Brasília na próxima terça feira. Vai tentar mais uma cartada. Leva as esperanças dos jovens, essa multidão que saiu às ruas. Resta a pergunta: a presidente ouvirá?

Enquanto isso, na mídia estadual o que se fala é o seguinte: com a federalização da FURB ou expansão da UFSC – não importa – haverá um crescimento muito grande no setor imobiliário em Blumenau. Que coisa, heim? Enquanto as raposas capitalistas esfregam as mãos, a juventude de Blumenau espera que seja feito o melhor.

 

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