Um a cada dois operários nas arenas da Copa era trabalhador imigrante

Mundial reacende o debate sobre como os russos recebem e convivem com estrangeiros.

Foto: Divulgação FIFA

Por Poliana Dallabrida.

A Rússia espera receber até dois milhões de turistas durante a Copa do Mundo. Colombianos, brasileiros, peruanos e alemães estão entre os torcedores que mais compraram ingressos para as partidas. Aqueles que chegarem para o Mundial verão que não são os únicos estrangeiros por aqui: um exército de trabalhadores imigrantes realiza as mais variadas funções para fazer rodar a economia do maior país do mundo.

Segundo o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo, 50% dos operários que construíram os estádios são trabalhadores imigrantes. No país todo, eles somam 11 milhões e respondem por 15% da mão de obra, conforme dados de 2016 do governo russo.

O presidente Vladimir Putin costuma dizer que os imigrantes são fundamentais para a economia russa. Em abril deste ano, o presidente da Rússia declarou que “a fronteira russa deve permanecer bem protegida e, ao mesmo tempo, deve ser tão transparente quanto possível para aqueles que a atravessam legalmente e com boas intenções”.

Por outro lado, uma pesquisa de 2017 do Instituto Levada mostrou que 69% dos russos interpretam a migração como uma invasão de cidadãos de países pobres que deve ser freada. Eles também são a favor da criação de medidas que barrem a entrada de imigrantes no país.

Impressões

A estudante brasileira Clarissa Levy está há oito meses na Rússia. Nesse período, ela afirma não ter passado por nenhuma situação de xenofobia, mas presencia atitudes racistas em relação aos trabalhadores imigrantes. “Os russos gostam de pessoas de fora se essas pessoas correspondem ao estereótipo de europeu”, observa. “Já experienciei na rua situações em que você vê que a pessoa está sendo discriminada. São sempre os mesmos tipos de pessoas que são paradas pela polícia no metrô”, exemplifica.

Clarissa percebe no dia a dia que há uma distinção no tratamento de trabalhadores russos e trabalhadores imigrantes da Ásia Central. “É um lugar comum as pessoas falarem ‘lá você não vai ver russos trabalhando’. Geralmente nas universidades, nos setores públicos, as pessoas que fazem a limpeza são sempre pessoas com os olhos puxados, que vêm de países da Ásia Central”, ressalta a estudante. “Eu já cheguei a ver anúncio de apartamentos com um asterisco: ‘para famílias eslavas’. Para famílias que tenham uma origem específica”.

Xenofobia

Na pesquisa do Instituto Levada, cerca de 48% dos entrevistados disseram ser neutros em relação aos imigrantes oriundos de países da Ásia Central, como Tajiquistão, Quirguistão e Uzbequistão, e 38% demonstraram uma atitude negativa.

A mesma pesquisa apontou que 32% dos russos enxergam esses trabalhadores como pessoas “mal educadas e capazes de realizar apenas trabalhos não qualificados”, e 28% dos entrevistados entendem que os imigrantes “são infelizes e forçados a suportar dificuldades extremas”.

Imigrantes da Ucrânia e Bielorrússia suscitam reações diferentes. Cerca de 25% tem uma atitude positiva ao conviver com imigrantes oriundos de países eslavos. A semelhança física ajuda a entender essa relação de empatia.

Em Moscou, a divisão étnica do trabalho salta aos olhos. De um lado, russos e cidadãos eslavos que, em geral, trabalham em funções bem remuneradas, se vestem e comem melhor, moram em bairros de fácil acesso. O trabalho dos imigrantes da Ásia Central parece restrito a funções de limpeza e manutenção das vias públicas, construção civil e restaurantes de redes fast food.

Contexto

Até os anos 1990, todos os quinze povos que viviam congregados na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) eram vistos como um só. Após a dissolução da URSS e a transição abrupta para o capitalismo, os novos países precisaram criar uma economia do zero.

Das sete nações localizadas na região conhecida como Ásia Central, cinco são ex-repúblicas soviéticas: Cazaquistão, Uzbequistão, Turcomenistão, Quirguistão e Tajiquistão. Apesar das reservas de combustíveis fósseis e recursos naturais, quase todos sofrem com a falta de tecnologia para exploração e de infraestrutura para transporte. A maioria têm na agricultura a principal atividade econômica.

O Quirguistão, com 5,6 milhões de habitantes, o país é o mais pobre da Ásia Central. Cerca de 43% da população vive abaixo da linha da pobreza.

A única exceção é o Cazaquistão, que consegue explorar, com investimento estrangeiro, o petróleo e o gás do seu território. Porém, a maior parte da produção é exportada de forma bruta: a Rússia, que tem a capacidade de fazer o refino, é o principal parceiro comercial.

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