The Mask You Live In: sobre estereótipos de masculinidade e o machismo

Por Vanessa Panerari

“Seja homem!”
“Não chore”
“Controle suas emoções”
“Vire homem!”
“Amigos primeiro, vadias depois”

Essas são algumas das frases que o documentário The Mask You Live In (ou A máscara em que você vive em uma tradução livre, disponível na Netflix), dirigido por uma mulher, Jennifer Siebel Newsom, apresenta como sendo dizeres comuns quando se fala em como os homens são doutrinados a enaltecer sua masculinidade em todos os momentos.

The Mask You Live In procura discutir como a sociedade impõe o que é ser homem e como a construção de uma masculinidade baseada em não poder demonstrar sentimentos e em acreditar que ser homem é ser superior, dominar pessoas e situações, torna essa mesma sociedade doente e violenta.

Segundo o documentário, desde a infância os garotos começam a brigar se alguém lhes diz “Quem aqui é a mulherzinha?”, demonstrando como o  não reconhecimento da sua masculinidade parece torná-los fracos e  “menininhas”. Ou seja, inferiores. Ser “menininha” é socializado como  insulto, algo humilhante, inferioridade. A proposta então é apontar  que isso tem início desde os primeiros anos e se arrasta por toda a vida.

A hipermasculinização e hiperfeminilização se impõem às crianças desde a determinação de que azul é cor de menino e rosa de menina. Até os brinquedos que são destinados para um ou para o outro sexo são reflexo de uma tentativa de simplificar o mundo baseado em estereótipos de gênero, cuja origem não passa de mera construção social.

Assim, durante The Mask You Live In, a cientista política e educadora Caroline Heldman, uma das entrevistadas, aponta que “a masculinidade não é orgânica, é reativa. Não é algo que se desenvolve sozinho. É a rejeição a tudo que é feminino”. Isso resulta em homens que rejeitam tudo que é estabelecido como sendo do universo da mulher. Nasce daí a figura do “macho alfa”: violento, dominador, que conquista várias mulheres, tem poder e sua masculinidade nunca é posta a prova.

A masculinidade da forma como é construída produz homens que não possuem empatia, são agressivos, objetificam mulheres e as consideram inferiores, ainda que não o digam. Homens que precisam reafirmar o quanto são machos a todo instante, que por vezes recorrem às drogas como válvula de escape já que foram ensinados a não demonstrar emoções (a menos que essas emoções sejam raiva ou ódio), que acreditam serem donos de mulheres, que exigem subserviência delas e que, em alguns casos, aumentam as taxas de feminicídio.

Trata-se de uma socialização que gera indivíduos que não admitem lidar com frustrações e que acreditam que respeito se consegue à força. Homens que não sabem se relacionar e que, em sua maioria, tiraram da pornografia a noção de como comprar e objetificar o corpo das mulheres e naturalizar o estupro.

A cultura do estupro é resultado do machismo estrutural no qual homens buscam reafirmar seu poder e masculinidade. Estupradores não aparecem ao acaso, uma vez que são resultado de uma cultura patriarcal que ensina a desumanizar mulheres e quem quer que seja considerado inferior ao conceito de masculinidade e, além disso, despreza o significado de consentimento. Nesse sentido, mulheres existiriam para servir aos homens e para que eles possam impressionar outros homens com a quantidade de mulheres que são capazes de seduzir.

Ou seja, a ideia é de que mulheres existem apenas para a manutenção da masculinidade.

A publicidade, a mídia e a educação são responsáveis diretos pela perpetuação do estereótipo de masculinidade que cria homens irresponsáveis e machistas. Elas reforçam e reproduzem ao extremo como um homem deve ser e como ele deve se relacionar com mulheres. E, para além disso, os produtos culturais também estabelecem o que uma mulher deve esperar de “um homem de verdade”, fator que dá abertura para que mulheres sejam oprimidas sem que haja sequer questionamento sobre os papéis de gênero que são limitados e estipulados socialmente.

Quando um homem agride física, emocional ou verbalmente, violenta e subjuga uma mulher, ele o faz porque a sociedade o permite. Ele tem o pretexto da masculinidade para fazê-lo e é o estereótipo de masculinidade que reside a origem do machismo.

De qualquer forma, outros aspectos importantes são abordados em The Mask You Live In: a solidariedade entre homens e a hierarquia em relação às mulheres. A fraternidade masculina parte da premissa de nunca entregar um homem, não quebrar um código de silêncio. Por isso, raramente agressores são responsabilizados; as vítimas do machismo ainda são desacreditadas e o homem quase sempre sai como alguém que estava cumprindo com seu papel social de machão.

 Já de acordo com a pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública ao Datafolha, 85% das mulheres brasileiras temem sofrer algum tipo de violência sexual e 42% dos homens dizem que mulheres que se dão ao respeito não são estupradas. Temos, então, um cenário no qual as mulheres sabem que estão expostas à violência apenas por serem mulheres, enquanto os homens seguem se eximindo de responsabilidade quanto à violência de gênero.

Nesse sentido, o debate proposto por The Mask You Live In sobre as consequências dos estereótipos de masculinidade se faz muito importante. A definição do que é  “ser homem” precisa mudar com urgência e o documentário apresenta caminhos pertinentes a serem seguidos, como, por exemplo, ensinar aos meninos que não é errado ter empatia e que eles não serão fracos ou vulneráveis por isso.

Fonte: Lado M

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