Série de reportagem: Por que evitam a auditoria da dívida pública?

Por Ana Carolina Peplau Madeira, de São José para Desacato.info.

O governador Raimundo Colombo tentou reduzir a zero a dívida do estado com a União. Chegou a entrar na Justiça, com mandado de segurança impetrado no Supremo Tribunal Federal, para questionar a incidência de juro sobre juro nos valores. Já o Governo Federal prefere uma proposta de alongamento da dívida por 20 anos, sem desconto do saldo devedor. O governador diz que continua a apostar no diálogo. Os estados Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Alagoas e Rio Grande do Sul estudam a possibilidade de aderir ao mandato de segurança catarinense.

Segundo o site do governo de SC, a conta é de 1998, quando a União e Estado firmaram contrato de refinanciamento do valor vigente à época: R$ 4 bilhões. Santa Catarina pagou cerca de R$ 13 bilhões e ainda deve mais de R$ 8 bilhões. O Congresso Nacional tentou ajudar, aprovando a Lei Complementar Nº 148/2014, que estabelece um desconto, com base na Selic Simples ou Acumulada (os juros incidem apenas sobre o valor principal).

A Presidência da República então editou o Decreto Nº 8.616, em 29 de dezembro de 2015 para regulamentar a Lei Complementar. Nele, para o recálculo das dívidas, é determinada a utilização da Selic Capitalizada (juro sobre juro), em desacordo com a legislação. Foi onde o governo catarinense não aceitou e não assinou o novo contrato. Como base para cálculo, SC usa a Lei Complementar Nº 151/2015, com valores menores. No fim de 2015 veio o decreto presidencial que “pune” os estados que não aderiram às novas regras com pagamento conforme os valores originais, com base na Selic Capitalizada.

“A aplicação de uma ou outra taxa pode significar que o Estado já quitou a dívida com a União ou que ainda deve mais de R$ 8 bilhões”, afirma o site do governo estadual. Recentemente, uma comitiva catarinense partiu rumo a Brasília para tentar convencer ministros, deputados e a presidência. Dependendo da taxa para cálculo, o estado pode já ter quitado a dívida com a União, tendo crédito de R$ 1 bilhão; ou ainda deve mais de R$ 8 bilhões.

O Núcleo Catarinense tem estudado informações sobre a dívida estadual, com base em contratos que o governo disponibilizou. Hoje, 7/03, a organização divulga nota a respeito. A dívida contratual do Estado de Santa Catarina é composta por quatro indexadores. A maior parte dela, 51,43%, concentra-se na dívida com a União referente a Lei no 9.496/97 e indexada pelo IGPDI. Em seguida, o dólar americano aparece como indexador de 24,70% do valor total e engloba todas as operações externas de empréstimo mais três operações internas – DMPL; CEF PNAF; e BB Caminhos Estratégicos da Produção e Prevenção de Desastres Naturais.

Segundo o economista Gilberto Ferreira, integrante do Núcleo Catarinense de Auditoria Cidadã da Dívida, “o maior problema não é por si só o indexador, mas a maneira como ele corrige o saldo. Se for juro sobre juro (que é o que ocorre atualmente) a dívida aumenta de forma brutal, o que no fundo podemos classificar como agiotagem oficial. Com a troca do indexador aprovado em 2014, trocando-se o IGP-DI + 6% pelo IPCA ou SELIC o que for menor + 4% de juros, mas aplicada de forma capitalizada faz com que ainda estejamos devendo até 2028 (prazo do contrato) 16,5 bilhões, mesmo que desde de 1998(com uma dívida inicial de 1,552 bilhões) tenhamos pago 8,5 bilhões”.

“O que se vê é uma constante federalização das dívidas do estado e faz o ritmo de endividamento crescer muito, assim como endividamento externo, com a depreciação cambial e a decrescente capacidade de arrecadação do estado, devido a dependência do ICMS. Santa Catarina possui três ações judiciais em andamento com valores na casa de R$ 5 bilhões. Conforme os julgamentos, pode comprimir ainda mais os gastos do governo e a federalização da dívida seria inevitável”, acrescenta o também economista e membro do NC da ACD, João Luis Abrantes Bertoli.

Enquanto não houver decisão judicial final para a questão, o Governo do Estado depositará o valor das parcelas da dívida em uma conta própria específica aberta no Banco do Brasil. A parcela de fevereiro, no valor de R$ 89 milhões, e que venceu no dia 29 de fevereiro, já foi depositada”.

A primeira dívida externa catarinense ocorreu para a construção da ponte Hercílio Luz na década de 1920. O banco que havia emprestado 20 mil contos de réis faliu. Precisou-se fazer um outro  empréstimo , atrasando a obra. Uma manobra de banqueiros americanos fez com que o Estado se responsabilizasse  por dívidas do banco falido, levando o empréstimo a 14 milhões 407 mil 107 contos e 479 réis(cerca de 5 milhões de dólares na época), praticamente o dobro do orçamento do Estado. Esta dívida só foi inteiramente quitada em 1978, praticamente 50 anos depois”, completa o economista Gilberto Ferreira.

Imagem: Secretaria Municipal de Turismo

 

 

 

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.