Saúde do/a trabalhador/a e covid-19. Por Douglas Kovaleski.

Foto: Michel Corvello

Por Douglas F. Kovaleski para Desacato. info.

A epidemia da covid-19 no Brasil precisa ser compreendida por meio da observação do mundo do trabalho. Antes da pandemia já se percebia uma escalada nos índices de desemprego e de redução da taxa de lucros das empresas. Mesmo que o mudo não tivesse a pandemia sérias dificuldades ocorreriam na economia mundial. Processo que tende a acontecer de maneira mais arraigada no Brasil por ser uma país capitalista dependente e principalmente por termos um presidente que trabalha contra o povo.

As desigualdades sociais com a pandemia se acirraram no Brasil, o que se refletiu no maior risco de exposição ao vírus e na incidência, gravidade e letalidade da COVID-19 para as classes subalternas. A desigualdade fez uma divisão epidêmica do trabalho entre os podem ou não ficar em casa, deixando uma parcela significativa da população que depende de ganhos diários, ou dos próprios negócios, os chamados micro-empreendedores individuais (“informais”, “diaristas”, “autônomos”, “uberizados” etc.), totalmente expostos à covid-19 de uma maneira injusta, causando uma acelerada disseminação da pandemia em comunidades pobres. Há que se lembrar também do exagero na cessão de exceções, onde a depender do interesse e do poder do setor econômico, o governo concedia o caráter de serviço essencial, obrigando os trabalhadores a se exporem ao vírus. Isso sem contar que a covid-19 no Brasil escancarou a ausência ou insuficiência do “Estado mínimo”, isto é, o Estado brasileiro não protegeu a vida do seu povo, pois não assegurou renda mínima para restringir de forma efetiva o contágio.

Veja mais: Prefeito Gean: Despejos sumários NÃO! Roda de conversa hoje, às 11h00, ao vivo.

Mas a sociedade e principalmente os patrões precisam reparar o que causaram à classe trabalhadora. A começar por reconhecer a contaminação por covid-19 como acidente de trabalho. Segundo o Art. 19 (Lei 8.213/91): “Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa (…) provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução permanente ou temporária da capacidade para o trabalho.” Art. 20: “Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:I –Doença profissional, (…) desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;II –Doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

Não se pode excluir a covid-19 de acidente de trabalho, pois na mesma lei supracitada são exclusões: “a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.” De fato a covid-19 não é uma doença com a qual toda a população tem que conviver, por isso não é endêmica (assim como a malária em grande parte do Brasil), mas a covid-19 configura-se em um risco especial para parte da população.

No mesmo sentido de reparação aos trabalhadores essenciais desse período de epidemia no Brasil e pandemia mundial, a AMPLA EM DEFESA DA SAÚDE DOS TRABALHADORES, em julho de 2020 lançou uma proposta, onde o acidente de trabalho: “… refere-se aos casos da doença contraída por trabalhadores(as) que precisam exercer suas atividades de trabalho fora de seus domicílios, assim como por aqueles(as) que, em decorrência de atividades econômicas desenvolvidas em seu domicílio, têm contato com pessoas de fora de seu convívio domiciliar. Serão considerados casos, atuais ou pregressos, aqueles com diagnóstico ou suspeita diagnóstica firmada por médico e os assintomáticos com teste positivo. Seu devido reconhecimento e notificação são fundamentais para que trabalhadores(as) adoecido(as) tenham acesso a direitos sociais, bem como para contribuir com a Vigilância em Saúde do Trabalhador.”

Veja mais: Como criar condições para que os moradores da periferia participem dos benefícios da cidade? Entrevista com Valter Costa, candidato a vereador pelo PSOL.

(Proposta da FRENTE AMPLA EM DEFESA DA SAÚDE DOS TRABALHADORES, julho/2020)

A classe trabalhadora não pode se calar diante da tamanha injustiça que o poder judiciário brasileiro defende, a de desconsiderar covid-19 acidente de trabalho. Lutemos por um mínimo de dignidade.

Veja mais: Debate #Eleições2020 – As candidaturas progressistas estão preparadas para a guerra no zapistão?

Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.

A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.