Riqueza do pré-sal: é o fim da linha?

Por  José Álvaro de Lima Cardoso.*

Na noite do dia 24, o Senado aprovou Substitutivo ao PLS 131 apresentado pelo senador Romero Jucá (PMDB/RR), que retira a obrigatoriedade da Petrobrás ser a operadora única do Pré-Sal, bem como a garantia de participação mínima de 30% nos campos licitados, como prevê a Lei 12.351/2010, que instituiu o regime de Partilha. Caso o projeto seja aprovado na Câmara e sancionado pela presidente Dilma, a Petrobrás deixa de ser a operadora única do Pré-sal, conforme a Lei, passando a ser uma decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), a concessão da preferência à empresa, assim como a participação mínima de 30% do investimento em cada campo explorado.

Se aprovado o projeto, na prática, qualquer campo do pré-sal pode vir a ser explorado com 100% de participação estrangeira e zero de presença da estatal brasileira. Dentre outros argumentos, o senador trouxe também como justificativa para o PLS 131 a possibilidade de que a Petrobrás não consiga abastecer o mercado de petróleo em 2020, se ficar como operadora única do pré-sal. Este argumento é uma falácia. Com os investimentos já realizados e os em andamento, a Petrobrás deverá estar produzindo 5,2 milhões de barris diários em 2020, o que tornará o Brasil um dos maiores exportadores mundiais de petróleo. A empresa, em tempo recorde desde a descoberta do pré-sal em 2006, já está retirando cerca de 900 mil barris diários dessa reserva, cuja exploração exige refinada tecnologia, a qual a Petrobrás é a maior detentora.

O projeto de Serra, na verdade, visa cumprir promessa feita à multinacional norte americana Chevron em 2010, de rever o modelo de partilha e retirar a Petrobrás do controle das reservas existentes no pré-sal. Segundo revelação do Wikileaks em 2013, o senador teve encontros secretos com Patrícia Padral, diretora da Chevron no Brasil, nos quais, se eleito, reveria o modelo de Partilha, proposta defendida ardorosamente pelas multinacionais do petróleo. Tem uma fala de Serra nos vazamentos do Wikileaks que é a seguinte: “Não haverá ofertas” (possivelmente, ofertas das petroleiras estrangeiras nos leilões) “e então nós mostraremos a todos que o velho modelo funcionava… e nós vamos fazê-lo voltar.”

O fim do modelo de Partilha, iria gerar uma corrida para retirar o petróleo daqui, na maior velocidade possível e remeter os dividendos ao exterior. A literatura sobre o assunto mostra que isso aconteceu no mundo todo. Países que não colocaram as suas reservas ao serviço do povo e dos interesses do país, pagaram um alto preço. Com a quebra da exclusividade da Petrobrás no pré-sal, iremos perder o controle e o ritmo da exploração, já que as multinacionais do petróleo são essencialmente predatórias. O sistema de Partilha, com garantia da Petrobras como operadora única em 30% dos leilões, representa inúmeras vantagens para o país. Garante fiscalização e controle na extração de petróleo, possibilita que a Petrobrás priorize a encomenda de insumos, equipamentos e navios brasileiros, impulsionando toda uma indústria, gerando emprego, renda e desenvolvimento do país. É fato largamente conhecido que as multinacionais não investem na indústria nacional, adquirindo as plataformas de petróleo somente no exterior.

É simplesmente absurda a decisão de entregar a garantia que tem hoje a Petrobrás, de exclusividade na operação e de ter, ao menos, 30% das imensas reservas do pré-sal, que já disponibiliza ao país quase 900 mil barris de petróleo/dia, e cuja magnitude ainda não foi sequer precisamente mensurada.  É claro que se o país tivesse uma população mais crítica e atenta, e as multinacionais do petróleo não tivessem tanto poder de formação da opinião pública, após as denúncias do Wikileaks, um projeto deste tipo não teria a menor possibilidade de, sequer, ser apresentado.

Os argumentos utilizados pelo senador, que iludem boa parte dos incautos, têm sido recorrentemente desmistificados pelos especialistas e parlamentares, inclusive durante o debate no senado ao longo desta semana. O projeto vai claramente contra os interesses do Brasil e de seu povo e interessa diretamente às petrolíferas estrangeiras. A Petrobras tem reservas garantidas, como se sabe, de 14,5 bilhões de barris. Por isso é muito curiosa a pressa em fazer novos leilões, especialmente quando há petróleo sobrando no mundo, como ocorre neste momento. Exatamente por isso o barril está custando menos de US$ 30. Qual a lógica de aprovar um projeto destes sem a realização de debates nas comissões do senado, e com pressão direta sobre os senadores, de lobistas, representantes de multinacionais como a Shell e a British Petroleum, como denunciou nos microfones do senado o parlamentar Roberto Requião? Como lembrou o parlamentar paranaense, o projeto aprovado no Senado já era inconveniente e antinacional, antes; agora com os atuais preços do petróleo passou a ser um crime de lesa pátria.

O óleo do pré-sal é cobiçado pela petroleiras, dentre outras razões, pelo volume e baixo custo de extração (US$ 8), fundamental neste momento de preços baixos. O PL de Serra é um primeiro momento da entrega do pré-sal, objetivo maior das multinacionais do petróleo. Se aprovado na Câmara e sancionado pela presidente, o modelo de Partilha passa a ser o próximo objetivo. As multinacionais querem, para a exploração do pré-sal, o modelo de Concessão, no qual a empresa adianta um valor ao Tesouro e embolsa 100% dos lucros do petróleo extraído. Nesse regime, todo o investimento foi bancado pelo povo brasileiro (através da Petrobrás), e o risco para as multinacionais é zero, pois o petróleo já foi todo mapeado.

  *Economista e supervisor técnico do DIEESE.

Imagem: diariodonordeste.verdesmares.com.br

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