Presidente da CPI da Merenda em SP declara deputado tucano inocente antes de apuração

Estudantes protestaram durante a reunião e consideram que comissão tem objetivo de blindar o governador

Em mais um movimento de controle da comissão pela base aliada de Alckmin, o deputado Estevam Galvão (DEM) foi escolhido relator. Presidente e vice também são apoiadores do governador.

Por Rodrigo Gomes.*

São Paulo – O deputado estadual Marco Zerbini (PSDB), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura superfaturamento, desvio de recursos e pagamento de propina em contratos da merenda escolar do governo Geraldo Alckmin (PSDB), inocentou hoje (28) o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, o também tucano Fernando Capez, acusado em delação premiada de receber propina. “Eu sei que quem foi acusado de forma injusta tem desespero grande em provar sua inocência”, disse Zerbini em entrevista coletiva, ao ser questionado se convocaria Capez para prestar esclarecimentos à comissão.

Sem ter ouvido Capez ou qualquer outra testemunha do caso, nem ter tido acesso aos documentos da operação Alba Branca, que investigou o esquema, Zerbini disse ainda que “o dano causado à imagem de Capez é um dano que não pode ser revertido mesmo comprovando sua inocência”. Ao ser questionado por jornalistas sobre o julgamento que acabara de emitir, o deputado alegou ter sido “mal compreendido” e que quem se declara inocente é o deputado Capez.

Para o deputado Alencar Santana (PT), único membro da oposição ao governo Alckmin no colegiado, a declaração expõe o objetivo da CPI, proposta pela própria base do governador. “Vão blindar o Capez. Este pré julgamento de que ele é inocente, vindo do presidente de uma CPI que diz atuar tecnicamente, sem ter ouvido o deputado, nem testemunhas, é preocupante e demonstra que não haverá imparcialidade”, afirmou.

Antes, o presidente da CPI havia declarado que não podia ouvir ninguém ou fazer julgamentos antes de ter acesso aos documentos da Polícia Civil e do Ministério Público. “Não vou convocar nenhuma testemunha ou acusado antes de receber os documentos da investigação. Primeiro vamos solicitar documentos, formar provas, para que todos os deputados tenham conhecimento do caso. A partir disso vamos convocar. Não tenho problemas em ouvir quem quer que seja”, afirmou.

Essa proposta, no entanto, preocupa a oposição por postergar os trabalhos de investigação da comissão, já que o próprio Zerbini não espera que os documentos cheguem logo. “Não creio que em menos de três semanas cheguem os documentos”, afirmou.

Os pedidos de documentos da Operação Alba Branca foram aprovados hoje e serão encaminhados para o Ministério Público, a Polícia Civil e o Tribunal de Justiça de São Paulo. Também foi encaminhado pedido à Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo, sobre a sindicância interna aberta pelo órgão para apurar o esquema de corrupção.

O deputado petista João Paulo Rillo ironizou o presidente da CPI, dizendo que se um dia for investigado, quer ter alguém como ele a seu lado. “O senhor age como um quadro político. Criou o ‘etapismo’. Não precisamos receber todos os documentos para só daí ouvir os envolvidos. Nosso papel não é revisar o trabalho da Polícia Civil e do Ministério Público. Essa Casa tem inteligência e condições para fazer o trabalho desta CPI”, afirmou.

A oposição quer a convocação de, pelo menos, três pessoas para iniciar as apurações. O ex-presidente da Cooperativa Orgânica da Agricultura Familiar (Coaf), Cássio Chebab, que disse, em delação premiada, repassar valores a deputados federais, estaduais e funcionários do  Luiz Roberto dos Santos, o ‘Moita’, ex-chefe de gabinete da Casa Civil do tucano; e Fernando Padula, ex-chefe de gabinete da Secretaria Estadual da Educação.

Ainda está incerto se a CPI vai trabalhar durante o recesso de julho. Nem a base do governador, nem a oposição têm certeza se será vantajoso. Se a comissão aprovar requerimento para trabalhar no período de férias, pode não receber nenhum documento e perder um tempo importante. Se não trabalhar, pode postergar demais o processo e ser abandonada por conta do início da campanha eleitoral nos municípios. Se houver recesso, o período não é contado no prazo da CPI, de 120 dias.

Eleição do relator

A preocupação com a imparcialidade nos trabalhos da comissão foi aumentada hoje com a escolha do relator. Argumentando ter recebido apoio de quase todos os membros da CPI – com exceção de Santana – Zerbini escolheu o deputado Estevam Galvão (DEM), partido historicamente aliado dos tucanos. Galvão também foi o proponente desta CPI, que inviabilizou a proposta original do PT, obtendo apoio da base do governador. “Vamos fazer um trabalho isento e imparcial”, disse o deputado, ao ser oficializado como relator.

“Essa é a revelação de que não querem só ocultar o máximo de informações sobre a corrupção na merenda. Querem passar atestado de idoneidade do governador Alckmin. Temos o partido do governador (PSDB) na presidência, do vice-governador (Márcio frança, PSB) na vice-presidência, e um aliado histórico na relatoria”, avaliou Santana.

Com essa formação, além de ter maioria na comissão que pode aprovar ou rejeitar requerimentos, a base aliada de Alckmin vai decidir o plano de trabalho, o ritmo do processo e quais conclusões serão ou não incluídas no relatório.

O presidente da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes), Emerson Santos, afirmou que, apesar da descrença no andamento dos trabalhos, os estudantes vão seguir pressionando os deputados e expondo os desmandos da CPI. “Estão construindo uma comissão para proteger o governador. Apesar da mobilização dos estudantes, eles seguem na intenção de impedir que seja esclarecida a máfia da merenda. Não vamos parar, vamos acompanhar as sessões e apresentar requerimentos por meio dos deputados”, afirmou.

Tensão na reunião

Presentes em peso na reunião da comissão, os estudantes protestaram em vários momentos contra o andamento da CPI. Com faixas e cartazes pedindo a prisão dos “ladrões da merenda”, o que abalou a paciência do presidente Zerbini, quando este divulgou o relator e quando disse que não ia convocar ninguém até receber os documentos da Operação Alba Branca.

“Ninguém é obrigado a concordar com os deputados, mas devem manter respeito. Se não, vou transferir a reunião para outro lugar”, ameaçou Zerbini. “Ninguém é obrigado a comer bolacha de água e sal na escola todo dia, isso sim”, retrucou uma estudante, seguida pelo coro dos secundaristas: “Eu não roubo merenda, eu não sou deputado, trabalho todo dia, não roubo meu estado”.

Os estudantes reclamaram ainda do desligamento do sinal WiFi de internet aberta da assembleia e da não transmissão da sessão pela TV Alesp e pela internet. Zerbini disse que não houve nenhuma determinação para isso e que desconhecia essas situações.

A CPI é formada pelos deputados Zerbini e Barros Munhoz (PSDB), Alencar Santana (PT), Estevam Galvão (DEM), Adilson Rossi (PSB), Jorge Caruso (PMDB), Gilmaci Santos (PRB), Coronel Camilo (PSD) e Delegado Olim (PP). Não foi marcada nova reunião, já que a Casa deve entrar em recesso na próxima sexta-feira (1º), após aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias do governo Alckmin.

Foto: Renato S. Cerqueira/FUTURA PRESS/FOLHAPRESS

Fonte: Rede Brasil Atual 

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