Por que tantas mulheres jovens não se identificam como ‘feministas’

Nos últimos anos, movimentos feministas têm atraído cada vez mais atenção na Europa e na América do Norte. Por que então tantas jovens mulheres ainda não se identificam com o termo?

Foto: REUTERS

Por Christina Scharff.

Pesquisas nos Estados Unidos e no Reino Unido revelam que menos de uma em cada cinco mulheres se declara feminista.

Isso pode ser uma surpresa, considerando que o feminismo – a defesa dos direitos das mulheres com base na ideia de igualdade entre os sexos – tem estado sob os holofotes.

Um dia depois da posse do presidente Donald Trump, em 2017, milhões de pessoas se uniram à Marcha das Mulheres.O objetivo da passeata era chamar atenção para a defesa dos direitos das mulheres, que muitos acreditavam estar sob ameaça.

Outro momento marcante para o movimento foi quando surgiram as denúncias de assédio sexual feitas por mais de 80 mulheres – que ele nega.

A atriz Alyssa Milano pediu que qualquer pessoa que tivesse sofrido assédio ou ataque sexual respondesse ao seu tuíte com a hastag #MeToo, dando novo ímpeto a um movimento iniciado em 2006 pela ativista Tarana Burke.

Meio milhão de mulheres responderam ao tuíte apenas nas primeiras 24 horas, e a hashtag foi usada em mais de 80 países.

Muitas celebridades passaram a apoiar o feminismo publicamente, como a atriz Emma Watson, que lançou uma campanha por equidade com a ONU (Organização das Nações Unidas).

Movimentos como #everydaysexism (sexismo de todo dia, em tradução) e temas de discussão como o Ted talk da autora Chimamanda Ngozi Adichie, Todos Nós Deveríamos ser Feministas, tiveram repercussão mundial.

Rejeição ao feminismo

Eventos como esses ajudaram a trazer atenção para o feminismo. Por que então a autoidentificação como “feminista” não ganhou mais popularidade entre mulheres jovens no ocidente?

No Reino Unido houve um pequeno aumento no número de mulheres que se identificam como feministas.

Uma pesquisa de 2018 do instituto YouGov revelou que 34% das mulheres do país responderam “sim” à pergunta “você é feminista?”, um aumento de 7 pontos porcentuais em relação à 2013, quando cerca de 27% das entrevistadas respondiam “sim”.

Na Europa a situação é parecida: menos de metade dos homens e mulheres questionados em cinco países se dizem feministas, variando de 8% na Alemanha a 40% na Suécia.

No entanto, as pessoas não rejeitam o termo feminismo porque são contra a igualdade de gênero ou porque acreditam que ela foi atingida.

A mesma pesquisa revelou que 8 em cada 10 pessoas disseram que homens e mulheres devem ser tratados com igualdade, com muitos concordando que o machismo ainda é um problema.

Gráfico

Isso parece representar uma mudança que ocorreu ao longo do tempo.

Um estudo com 27 mil pessoas nos EUA em 2016 mostrou que dois terços dos entrevistados acreditavam que a igualdade de gênero é importante, um aumento em relação a 1977, quando pesquisas similares apontavam que um quarto dos entrevistados pensava assim.

Em uma pesquisa feita no Reino Unido em 2018, 8% das pessoas disseram concordar com papéis de gênero tradicionais – que o homem deve trabalhar e que as mulheres devem cuidar da casa. O índice era de 43% em 1984.

Se muitas pessoas acreditam que a igualdade de gênero é importante, e ainda não foi atingida, porque não há mais pessoas – especialmente jovens mulheres – se identificando como feministas?

Pode ser que elas não se sintam representadas pelo termo. Segundo as pesquisas, mulheres de baixa renda tendem a se identificar menos com a palavra “feminismo”.

Cerca de uma em cada três pessoas entre as classes mais altas se consideram feministas, de acordo com uma pesquisa feita na Grã-Bretanha em 2018. Em comparação com uma em cada cinco pessoas de classes mais baixas.

Mas pessoas de baixa renda são tão propensas a apoiar direitos iguais para homens e mulheres quanto pessoas de classes mais altas. Em todas as faixas socioeconômicas, em cada 10 pessoas, oito concordam que homens e mulheres devem ter os mesmos direitos, de acordo com uma pesquisa britânica de 2015.

Isso sugere que pessoas em estratos sociais menos favorecidos tendem a apoiar o princípio por trás do feminismo, mas não gostam da palavra em si.

A questão racial também parece afetar a maneira como a palavra é vista. Pesquisas com jovens dos EUA mostram que cerca de 12% das mulheres latinas se identificam como feministas, mas que o índice sobe para mulheres negras (21% se consideram feministas), asiáticas (23%) e brancas (26%).

Três quartos de todas as mulheres disseram que o movimento feminista fez “muito” ou “algo” para melhorar a vida das mulheres brancas.

O índice cai para 60% quando a pergunta é se o feminismo conquistou muito para mulheres de todas as etnias. Entre as mulheres negras, só 46% acham que o feminismo melhorou a vida de mulheres de todas as etnias.

Lutando contra estereótipos

Mas a principal questão provavelmente são os estereótipos e visões equivocadas que, ao longo dos anos, foram associados ao feminismo.

Na introdução do livro recém-publicado Feminists Don’t Wear Pink and Other Lies (Feministas Não Usam Rosa e Outras Mentiras, sem edição no Brasil), Scarlett Curtis cita estereótipos como o de que feministas não usam maquiagem, não se depilam e odeiam homens.

São rótulos que persistiram por anos. Na década de 1920, feministas eram chamadas de “solteironas” e eram comuns artigos especulando sobre suas preferências sexuais. Quase um século depois, esse tipo de visão continua, de certa forma, existindo.

Para meu trabalho de pesquisa acadêmica, entrevistei um grupo diverso de mulheres alemãs e britânicas. Descobri que associações do termo feminismo a ódio aos homens, lesbianismo ou falta de feminilidade eram fatores cruciais na rejeição ao rótulo “feminista”.

A maioria dizia que não se considerava feminista porque não queria ser associada com características como essas. Isso apesar do fato de que muitas diziam não ser homofóbicas – e algumas se identificarem como lésbicas ou bissexuais.

Então, como é possível melhorar a imagem do feminismo?

Como sociedade, deveríamos fazer mais para desafiar expectativas muito estreitas sobre como uma mulher deve agir ou como deve ser sua aparência.

Trabalhar com mais afinco para tornar o movimento mais inclusivo pode resultar em um tipo de feminismo mais aberto às experiências e preocupações de grupos mais diversos de mulheres.

Apesar de tudo, independentemente do rótulo que mulheres escolherem adotar, é reconfortante a indicação de que, hoje, uma vasta maioria apoia a igualdade de gênero – e reconhece que ela não foi atingida ainda.

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