Pequim + 20: os direitos humanos sem os direitos das mulheres não são humanos

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Por Paula Guimarães.

“Os direitos humanos sem os direitos das mulheres não são humanos. Reivindicávamos o direito de ter direito”, lembrou Clair Castilhos, secretária executiva da Rede Feminista, que em 1995, participou da Conferência sobre a Mulher, realizada pela ONU, em Pequim, na China. O documento assinado por 189 países, na última conferência da organização, é considerado um marco histórico para a igualdade de gênero por introduzir o conceito de direitos reprodutivos.

A primeira mulher a ser vereadora de Florianópolis – na década de 80, apresentou uma palestra na mesa-redonda “Políticas Públicas para as Mulheres”, na tarde de terça-feira, no miniauditório do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A proposta era avaliar os avanços em políticas públicas para as mulheres no Brasil, depois de 20 anos do documento.

Clair traçou o histórico da conferência, inaugurada em 1975, no México, e falou das dificuldades encontradas no caminho até Pequim. Lembrou do protagonismo do movimento feminista do Brasil na conferência de Viena, em 1993, quando articulou a participação de uma professora que teve parte de seu corpo queimado, como exemplo de mulheres vítimas de violência. “A Lei Maria da Penha é a mais importante e concreta política pública de combate à violência contra a mulher, resultado da semente plantada na conferência de Viena”, destacou.

Políticas públicas podem decorrer de acordos internacionais
A secretária apresentou de forma didática o conceito de políticas públicas: como elas têm origem e o processo político para sua implementação. Explicou que a formulação das políticas públicas se constitui quando os governos democráticos traduzem suas plataformas eleitorais em programas e ações que “produzam resultados no mundo real”. Depois de formuladas, as políticas se desdobram em planos, programas, projetos, bases de dados e informações. Quando postas em ação, são submetidas a sistemas de acompanhamento e avaliação. “Políticas públicas podem decorrer de acordos internacionais, como esses das conferências da ONU”, destacou.

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Inclusão de saúde sexual na conferência
Na conferência do Cairo, em 1994, as mulheres introduzem a discussão sobre direitos reprodutivos e tiram o foco meramente demográfico do debate. Direitos reprodutivos é um conceito que engloba pré-natal, parto, puerpério, contracepção, aborto, tratamento de fertilidade, todos os aspectos referentes à reprodução. Clair lembrou da aliança histórica entre o vaticano e países islâmicos para impedir a entrada desses direitos no relatório. Apesar da negativa, a inclusão da saúde sexual reprodutiva no texto foi considerada um avanço. “O debate sobre os direitos reprodutivos irritou os setores fundamentalistas. Não se podia falar em direitos reprodutivos de jeito nenhum, porque estava implícita a palavra aborto. Hoje, no Brasil não podemos falar em gênero porque está implícito o homossexualismo. Parece que o Brasil vive no colégio de freiras, que somos todos normalistas”, brincou.

Segundo a feminista, os retrocessos quando se trata de direitos humanos das mulheres, devem-se à opressão cultural de determinados setores e ao modelo neoliberal, adotado pelo Brasil, que resulta na focalização de políticas sociais em detrimento da universalização e em quebra na política de saúde dos princípios do SUS. Apontou como “absolutamente perversa” a proposta materno-infantil “Rede Cegonha” que substituiu uma Política Nacional de Assistência Integral à Saúde da mulher. “A gente sabe o que significa isso. A estratégia se preocupa se o feto chegue a bom termo e com saúde. Se a mãe morrer no caminho não importa muito, porque a morte materna é um destino esperado para as mulheres. Só a maternidade nos redime do pecado original. Essa coisa que permeia o imaginário dos entes políticos. Os evangélicos amam”, afirma.

Segundo a palestrante, para que o terceiro milênio pertença às mulheres, como destacado na última conferência, é preciso ampliar a participação nas esferas de poder, que além de mínima, encontra resistências. Citou casos de violência contra as legisladoras dentro do próprio parlamento. Recentemente, a vereadora de Porto Alegre, Jussara Cony (PcdoB), foi agredida pelo vereador Nereu D’Ávila (PDT) durante uma sessão. “As parlamentares estão sendo agredidas por colegas quando tomam posição contrária. Quando os legisladores não têm argumento, partem para a agressão. E ainda dizem ‘querem brigar como homem, vão apanhar como homem. Assim é o parlamento nacional, o machismo está cada vez mais agressivo e exacerbado”.

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