Para quem não tinha entendido o golpe, um desenho: multinacionais levaram até agora 75% das reservas leiloadas no Pré-sal

Por José Álvaro Cardoso.

Enquanto a população se concentra (ou se distrai) no processo eleitoral, o governo encaminhou, no finalzinho de setembro, a 5ª Rodada de Licitação do Pré-sal, na qual, segundo análise da FUP (Federação Única dos Petroleiros), as petrolíferas estrangeiras levam mais de 90% dos barris de petróleo leiloados. Segundo a referida análise, no leilão do dia 28, o preço médio pago por cada barril leiloado foi R$ 0,34. Isso numa conjuntura em que o barril está sendo vendido no mercado mundial por algo em torno de US$ 75, com tendência a aumentar em função dos recentes, e cada vez mais ameaçadores, acontecimentos na geopolítica mundial.

As petrolíferas estrangeiras levaram mais de 90% dos 17,39 bilhões de barris leiloados. Segundo a imprensa, os quatro blocos ofertados pela ANP (Agência Nacional de Petróleo) foram arrematados em questão de minutos. A britânica Shell e a norte-americana Chevron, participantes ativas da construção do golpe no Brasil, arremataram sozinhas o bloco de Saturno, na Bacia de Santos, que contém reservas calculadas em 8,3 bilhões de barris de petróleo. Por outro lado, a ExxonMobil (EUA), a BP (Reino Unido), a CNOOC (China), a QPI (Catar) e a Ecopetrol (Colômbia) dividiram os outros dois blocos da Bacia de Santos (Titã e Pau Brasil). A Petrobrás teve que se limitar ao arremate do bloco de Tartaruga Verde, localizado na Bacia de Campos, e que foi o menos disputado no leilão.

Segundo dados da FUP, em dois anos de vigência do golpe, com quatro leilões realizados no Pré-sal, sob o regime de Partilha, foram leiloados um total de 51,83 bilhões de barris. Destes, 13 multinacionais já arremataram reservas equivalentes a 38,8 bilhões de barris de petróleo. Juntas, essas gigantes do petróleo concentram 75% das reservas, onde são operadoras em seis dos 14 blocos licitados. As britânicas Shell e BP conseguiram se apropriar de 13,5 bilhões de barris desses leilões, mais inclusive, que a própria Petrobrás, que arrematou 13,03 bilhões de barris em campos leiloados nas cinco rodadas da ANP.

Quem não entendeu que o petróleo está no centro do processo golpista em operação no Brasil, terá dificuldades em compreender a conjuntura econômica e política nacional por muito tempo. José Serra, segundo denúncia feita em 2013 pelo site WikiLeaks, havia prometido à Chevron, em 2010, que, se eleito presidente, iria acabar com a Lei de Partilha. Consumado o impeachment da presidenta Dilma Roussef, foi aprovado imediatamente no Senado, o projeto de Serra, que tirou da Petrobrás a exclusividade na operação dos poços do Pré-sal e acabou com a obrigatoriedade da estatal ter participação mínima de 30% nos leilões, fatores fundamentais para a retenção da renda petrolífera no Brasil. Com dois anos de vigência do golpe, estão entregando o petróleo do Pré-sal, a preço de banana, como até as pedras já previam.

É preciso entender que os EUA, principal força no golpe no Brasil, tem uma necessidade dramática de fontes de suprimentos, na medida em que é o maior consumidor de petróleo do mundo, mas não produz em quantidade suficiente para suprir o consumo do país. Por detrás do golpe no Brasil (como ocorreu nos demais países da América Latina que sofreram processos semelhantes) há uma constatação de caráter estratégico, que é definitiva: o petróleo barato de produzir não tem nenhum substituto. Ele acabou, e o mundo já há algum tempo sofre as consequências políticas, sociais e militares deste problema. O produto extraído do pré-sal possui, além disso, alta produtividade e baixo risco de exploração, razões pelas quais, também, motivou o golpe. Este segue, assim, um roteiro criminoso, visando converter o Brasil em mero provedor de matérias-primas para o mundo desenvolvido e, ao mesmo tempo, transformar o pais em importador de derivados do petróleo e de produtos industrializados em geral.

Têm muitos brasileiros bem intencionados, achando que as eleições de 2018 irão “devolver o Brasil de antes”, ilusão que não encontra abrigo nos fatos. O cenário é bastante nebuloso, e não temos informações privilegiadas, mas parece evidente que quem perpetrou um golpe no resultado eleitoral de 2014, não irá entregar o poder pela via eleitoral em 2018. Isso só ocorreria se tivesse havido, no período, uma grande mudança na correlação de forças, o que absolutamente, não aconteceu. Eles continuam cometendo as maiores barbaridades, sem uma reação à altura da população. Independentemente, do resultado eleitoral (que é um processo muito controlado por eles), irão tentar completar o serviço do golpe, que passa por políticas como: apropriação dos recursos do Pré-sal que ainda não arremataram, privatização da previdência social, fim do sistema de seguridade, entrega do Aquífero Guarani para as multinacionais, venda de terras férteis, etc. É grande o risco de as eleições serem apenas um mecanismo de institucionalização do golpe, como aconteceu em Honduras e Paraguai, e/ou do próximo governo não conseguir se sustentar no poder. Independentemente do que ocorrer, tudo indica que as dificuldades do povo trabalhador irão se agravar no próximo ciclo da conjuntura.

José Álvaro CardosoJosé Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.

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