Para 82% dos professores, ensino a distância não substitui reposição de aulas

Pesquisa da CNTE/UFMG revela ainda que 71% dos docentes tem dificuldade para ministrar aulas a distância e 24% deles usam dados móveis do próprio celular

Foto: Claudia Weinman, da escola 25 de maio, em Fraiburgo/SC.

O ensino remoto adotado por redes estaduais e municipais em todo o país durante a pandemia de covid-19 é insuficiente para substituir a reposição das aulas de forma presencial. É o que pensa a maioria (82%) dos professores que participaram de pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), em parceria com o Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo relatório divulgado hoje (29), é grande também a parcela (71%) daqueles que apontaram dificuldade com o uso das tecnologias necessárias para ministrar aulas nessa modalidade.

Mais da metade dos participantes (53,6%) não recebeu capacitação pelas redes de ensino, o que causa angústia e tensão, prejudicando o trabalho de ensinar. Para completar, apenas três a cada 10 professores da educação básica contam com recursos tecnológicos necessários à realização das atividades.

Há diferença significativa entre os que tiveram acesso à formação em relação à rede à qual estão vinculados. O percentual dos docentes das redes municipais que não receberam nenhum tipo de formação é de 53,6%, mais que o dobro daqueles das redes estaduais (24,6%).

Para os pesquisadores, apesar da falta de qualquer formação para o desenvolvimento dessas atividades, é nítido o compromisso da categoria com seus alunos. Tanto que eles buscam meios para tornar a oferta educativa possível – o que ao mesmo tempo é uma oportunidade de crescimento e amadurecimento profissional.

Alunos

Na percepção dos professores participantes, um a cada três estudantes não tem recursos para acompanhar as aulas e realizar as atividades remotas. E um a cada cinco deles não tem autonomia para acompanhar as aulas. Dependem da ajuda de pessoas da família para ajudar a tirar dúvidas e até mesmo para incentivá-los. Tais limitações são um entrave para realização dessa modalidade de ensino.

Somente 16% dos participantes consideram que o envolvimento dos alunos com as atividades propostas não foi prejudicada com as aulas a distância. Para eles, a participação manteve-se a mesma ou até aumentou. Em geral, o cenário imposto pela pandemia influenciou negativamente o ensino médio, segundo 45,8% dos docentes, e nos anos finais do ensino fundamental, segundo 44,5% deles. Houve redução drástica da participação na educação infantil, segundo 34,1%, e nos anos iniciais do ensino fundamental, conforme a percepção de 29%.

Esse impacto negativo pode ser explicado pelo fato de nem todos os alunos contarem com recursos tecnológicos em casa. Para os professores, 75%  dos estudantes não têm acesso aos recursos necessários para acompanhar as aulas e muito menos realizar as atividades – outro entrave para o sucesso do ensino nessa modalidade. A situação só melhora um pouco nos anos finais do Ensino Fundamental.

Falta de investimentos

Para o presidente da CNTE, Heleno Araújo, alguns pontos chamam a atenção. O primeiro é a alta participação dos professores nas atividades remotas. “84% deles estão envolvidos em atividades remotas, usando seus equipamentos, a sua própria internet, sem a contrapartida do poder público para garantir equipamentos necessários para essas aulas. E pouco mais da metade (51%) que tem equipamento divide com a família, o que também dificulta o trabalho a ser realizado”, disse.

Para o dirigente, falta investimento do poder público em material e equipamentos necessários. A necessidade é evidenciada pela redução da participação dos alunos, percebida por 82% dos participantes, justamente por não terem os equipamentos necessários, acesso à internet e também nao terem assistência de algum adulto em casa para contribuir com a realização dessas tarefas e estímulo à participação.

“Também chama atenção a grande preocupação da categoria. Apenas 17% se diz tranquilo com essa situação. Já 83% tem algum índice de preocupação, estresse, medo, ansiedade e outros receios diversos em toda essa pandemia”, disse.

Segundo ele, a pesquisa é importante para subsidiar o diálogo com os governos municipais, estaduais e do Distrito Federal tanto em protocolos para o pós-pandemia, como também na construção de políticas educacionais consistentes. “Quando 84% está envolvida em atividade remota, mesmo que a maioria não teve formação a respeito, significa que a política de formação é muito importante para pensar o futuro. E o conjunto desses resultados, além de trazer um retrato do aumento da pandemia, indica propostas e ações para políticas futuras na área da educação.”

Amostra

Os dados foram coletados no período de 8 a 30 de junho, por meio de questionário on-line autoaplicado, na plataforma Google Forms. A amostra da pesquisa foi constituída por 15.654 docentes das redes públicas da educação básica, que preencheram o questionário por completo.

As mulheres representam 78% dos respondentes. Metade delas é constituída por mulheres com idade entre 30 a 49 anos. Todos os estados foram abrangidos pela pesquisa, o que permite obter informações sobre a situação do trabalho remoto no contexto da pandemia em todo o país. Ceará, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso do Sul e Paraíba tiveram maior participação, com mais de mil participantes cada um.

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