Por Elissandro Santana, Porto Seguro, para Desacato.info.
Porto Seguro, importante polo turístico do Brasil, há muito tempo deixou de ser o paraíso idílico seguro vendido pelas agências que exploram o turismo na região e em todo o país. Nesta semana, um clima pesado estampou-se nas fisionomias dos moradores da cidade. Por todos os rincões do município transeuntes pelo comércio, pelas praças, pelas ruas, pelas avenidas, pelas filas dos bancos, pelas casas lotéricas e até pelas praias declararam suas angústias e medos em relação à falta de segurança na região. A angústia se materializou nos olhares e no discurso da sociedade porto-segurense.
Em um dos bairros mais subdesenvolvidos da cidade ocorreu uma chacina em que oito pessoas foram brutalmente assassinadas. O fato causou assombro e não era para menos, afinal de contas, oito vidas foram ceifadas. Entre os assassinados, estão filhos de policiais e isso assusta ainda mais a população, principalmente os mais pobres, aqueles que historicamente são esquecidos pelo Estado e vivem na outra Porto Seguro, naquela que não aparece nos mapas turísticos, que é esquecida e silenciada, que só é vista quando alguma tragédia com requintes de muita violência surge na mídia, quase sempre com análises sensacionalistas, sem a dimensão histórica dos problemas que afetam a região.
A Polícia Civil de Porto Seguro já identificou os suspeitos pela morte de oito homens, incluindo filhos de policiais, na noite do último domingo (5). Uma nona vítima sobreviveu ao ataque e segue internada em estado grave no Hospital de Base Luís Eduardo Magalhães. [1]
Há a suspeita de que algumas das vítimas tinham envolvimento com o tráfico de drogas, o que teria motivado o crime. A Polícia Civil não divulgou quem seria o alvo dos criminosos. Os jovens foram mortos em uma festa em uma casa em Porto Seguro. Antes, eles tinham participado de um evento do tipo “Paredão” (com som de carro) na orla da cidade. Em seguida, foram para o imóvel, onde foram surpreendidos pelos criminosos. Os bandidos, que estavam fortemente armados, mandaram as mulheres saírem da casa e atiraram nas vítimas. Entre os mortos, há filhos de policiais civis e militares. [2]
A Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP) informou no dia (6) que enviou unidades especializadas da Polícia Militar para continuar investigando a chacina ocorrida ontem (5), na cidade de Porto Seguro, no sul do estado, a 707 quilômetros de Salvador. De acordo com a SSP, ninguém foi preso após o ataque que deixou oito pessoas mortas e um ferido, em uma residência de Porto Seguro. No entanto, foi informado que policiais da 23ª Coordenadoria de Polícia do Interior (Coorpin) continuam nas ruas da cidade desde as primeiras horas de hoje, “colhendo informações sobre o ataque a uma ‘festa de paredão’” e na tentativa de localizar os responsáveis pelos homicídios. São chamadas festas de paredão aquelas em que se promove competição entre equipamentos de som. [3]
Em protesto e luta pela paz, ontem, dia 8, a população saiu por alguns pontos da cidade e vestiu de branco a estátua de Cabral, um dos monumentos simbólicos mais importantes do descobrimento para a cidade.
Infelizmente, muitos não conseguem analisar o problema da violência como um fenômeno com raízes profundas. Pelas ruas, tive a oportunidade de dialogar com alguns comerciantes, moradores e até visitantes e perceber que sem a compreensão da situação com base nos aportes político-social-histórico-econômicos as pessoas caem em análises conservadoras e retrógradas.
É importante ressaltar que o município há anos aparece nas estatísticas dos mais violentos do país no Mapa da Violência.
O Mapa da Violência 2016 é um estudo que focaliza a evolução dos Homicídios por Armas de Fogo (HAF) no Brasil no período de 1980 a 2014. A edição deste ano, com sua última atualização feita em agosto, aponta Porto Seguro com a 6º cidade com maior índice de homicídios registrados por arma de fogo na Bahia, enquanto no ranking nacional, o município é o 14º colocado. [4] Cabe sinalizar que não somente Porto Seguro aparece no referido mapa como uma das cidades com maior taxa de homicídio por arma de fogo na região. Dentre a cidades com taxas elevadas aparecem Itabuna, Eunápolis e Teixeira de Freitas.
No caso de Teixeira de Freitas, por exemplo, segundo o Mapa da Violência, somou 337 homicídios entre 2012 e 2014, uma taxa média de 81,0. O ranking elaborado pelo Mapa leva em consideração taxas médias 2012-2014 dos casos por 100 mil habitantes. [5]
Os números são alarmantes e possuem explicações histórico-político-econômico-cultural-sociais. Conforme pode ser visto na pesquisa, Porto Seguro desponta como uma das cidades mais violentas de todo o país e quase nada se fez ou se faz para mudar esse quadro. No município, a sociedade segue pulando o carnaval de todos os anos e comemorando outras festas e assim a vida segue.
Segundo matéria no Jornal Correio da Bahia, Catu e Porto Seguro foram as duas microrregiões mais violentas da Bahia em 2014 e estão entre as dez mais violentas do país, junto com lugares como Fortaleza (CE), Maceió (AL), Altamira (PA) e Mossoró (RN). Esses são os dados do Atlas da Violência, publicado na terça-feira (22) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em conjunto com o Fórum Nacional de Segurança Pública. Microrregiões são conjuntos de municípios, agrupados por similaridades econômicas e proximidade geográfica – na Bahia, há 32 delas. Para comparar as localidades, o Ipea foi além da taxa de homicídios, que, segundo o instituto, pode causar distorções em municípios pequenos. Os pesquisadores aplicam uma correção probabilística que leva em conta municípios vizinhos, criando as taxas bayesianas por 100 mil habitantes. Nesse cálculo, Catu ficou com uma taxa de 71,8. Porto Seguro, com 70,6. [6]
Enfim, a chacina ocorrida na cidade deve ser analisada com base nos problemas históricos que atravessam a cidade. A violência não é um fenômeno simplista, pois comporta uma série de explicações e origens. Em se tratando de Porto Seguro, ela nos leva a pensar acerca de injustiças sociais, políticas, econômicas e ambientais. De 1970 até 2017, a cidade passou por profundas transformações no meio urbano com crescimento desordenado, ingerências públicas, sem contar que a cidade atraiu pessoas de várias partes da região e do Brasil, o que contribuiu para um crescimento urbanístico insustentável. Nisso tudo residem explicações para os males da violência, do desemprego, das subcondições de vida e de outras questões. Sem cair em escatologias analíticas, ouso afirmar que se políticas de valorização dos jovens e da população em geral não forem executadas, se a matriz de produção e geração de riqueza na cidade continuar beneficiando apenas a segmentos elitistas do município, se o meio ambiente não for respeitado, se políticas de lazer e diversão não forem aplicadas na cidade, se a educação não for levada a sério, se o emprego e a renda não se tornarem realidade equitativa, a situação piorará e ficaremos no eterno ciclo e círculo de análises superficiais e ralas dos males que assolam a toda a sociedade porto-segurense.
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[1] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://www.correio24horas.com.br/detalhe/bahia/noticia/policia-identifica-suspeitos-pela-chacina-com-oito-mortos-em-porto-seguro/?cHash=06d981c4396bb926196ea40b71901da0
[2] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://atarde.uol.com.br/bahia/noticias/1837039-porto-seguro-policia-identifica-suspeitos-de-envolvimento-em-chacina
[3] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-02/policia-procura-responsaveis-por-chacina-em-porto-seguro
[4] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://www.portoinforma.com.br/2016/11/07/mapa-da-violencia-porto-seguro-sexta-cidade-com-homicidios-na-bahia/
[5] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://www.portoinforma.com.br/2016/11/07/mapa-da-violencia-porto-seguro-sexta-cidade-com-homicidios-na-bahia/
[6] Fragmento de notícia adaptado retirado do http://www.correio24horas.com.br/detalhe/bahia/noticia/regioes-de-catu-e-porto-seguro-sao-as-mais-violentas-da-bahia-diz-atlas-da-violencia/?cHash=b9efb6baf90fb631cd944994c546260c
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Imagem: Porto Informa.
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Imagem: Porto Informa.
