Obviedades sobre o golpe de 2016 que jamais deveriam ser esquecidas. Por José Álvaro Cardoso

 

Imagem: Reprodução Internet

Por José Álvaro de Lima Cardoso.   

A força da Lava Jato, e a capacidade das mentiras espalhadas pela operação se enraizar na sociedade, especialmente em setores de classe média (inclusive no meio do povo sindical) deixou muito claro que tinha alguém muito poderoso por trás do “Mussolinizinho de Maringá” e seu grupinho de intocáveis: era simplesmente a maior força da Terra, o Imperialismo, tendo à cabeça os EUA.

Por que a Petrobrás foi o alvo econômico principal da operação?

1.Se trata de petróleo (elemento causador de todas as guerras nos últimos 100 ou 150 anos e que não tem substituto no curto prazo). Os EUA são os maiores consumidores de petróleo do mundo, mas não são autossuficientes;

  1. Porque não se trata de uma empresa e sim de uma “nação amiga”. É a maior empresa da América Latina, produzia em 2013, 2,6 milhões de barris de petróleo diários, tinha uma força de trabalho de mais de 100 mil trabalhadores, operava em 25 países, tinha um lucro de R$ 23,6 bilhões e era a 13ª maior companhia de petróleo do mundo no ranking da revista Forbes. Era uma empresa (ainda é, não a conseguiram destruir) maior do que a economia de muitos países do mundo. Como alguém já falou: “a Petrobrás é uma outra nação. Felizmente é uma nação amiga.”;

3.Petróleo e Petrobrás são elementos de um projeto soberano de desenvolvimento. Há todo um simbolismo, buscado pelos golpistas, em atacar a Petrobrás.

     Em 2015 o historiador Moniz Bandeira (brasileiro, intelectual de primeira grandeza, exímio especialista em geopolítica, falecido em 2017 – com quase 30 livros) deu publicidade às relações de Sérgio Moro com instituições norte-americanas, a saber:

  1. em 2007 o então magistrado frequentou cursos no Departamento de Estado.
  2. em 2008, passou um mês num programa especial de treinamento em Harvard, na Escola de Direito.
  3. em outubro de 2009, participou da conferência regional sobre (crimes financeiros) promovida no Brasil pela embaixada dos Estados Unidos.

Em 2016 Sérgio Moro foi eleito, pela revista norte-americana, Time, como um dos dez homens mais influentes do mundo. Fazia parte do show: apresentar Sérgio Moro, e a Lava Jato, como “intocáveis”, além de mostrar a operação como algo fundamental para um Brasil “tomado pela corrupção”. Imaginem a que ponto chegamos: os EUA dando lição de honestidade. Um país que é capaz de destruir países para saqueá-los, como fizeram recentemente no Iraque, Afeganistão e Síria, dando lições de moral para o Brasil.

Em função da descoberta do pré-sal em 2006, o governo Lula sancionou em 2010, a lei de Partilha, que visava uma retenção maior da renda petroleira por parte da nação brasileira. Por isso foi tão combatida pelas multinacionais do petróleo e seus aliados dentro do país. Pelo sistema de concessão, que defendem os que tentam derrubar a Lei de Partilha, as multinacionais ficam com 67% do valor do petróleo extraído, em óleo, e deixam no Brasil 10% do valor dele em royalties, pagos em dinheiro, além dos impostos. No sistema de Partilha as multinacionais do petróleo têm que dividir com o Brasil o petróleo retirado, além da Petrobrás ter a exclusividade na operação, o que evita roubos do petróleo retirado.

Os golpistas de 2016 ainda não fizeram uma tentativa mais sistemática para acabar com a Lei de Partilha, pelo menos às claras. Mas por estes dias, o presidente da Petrobrás, fez uma fala contra a Lei, dizendo por exemplo, que a Lei atrapalha os negócios. Segundo ele “O mundo dos negócios não gosta de coisas complicadas, querem coisas claras, transparentes, simples”. Multinacional do petróleo – que, por exemplo, ajudaram a patrocinar o golpe recente no Brasil – gostar de transparência é uma piada pronta.

Se o Brasil não fosse um pais subdesenvolvido e dependente, a extração de todo o petróleo brasileiro teria que ser um monopólio da União, um monopólio da Petrobrás, não teria que ser aberto a multinacionais. Todo o subsolo deveria ter essa política. Mas vejam que as multinacionais não resistiram nem a modesta lei de Partilha. Para exploração do poço de Libra, leiloado em 2013, foi montado um consórcio com uma participação societária de 40% da Petrobrás. Segundo os especialistas no setor (Aepet), e também da FUP, se a Petrobrás não tivesse participação nesse consórcio, o Estado brasileiro arrecadaria R$ 246 bilhões a menos e as áreas de Educação e Saúde perderiam R$ 50 bilhões em royalties, conforme previa a Lei. Além disso, se a Petrobrás fosse contratada diretamente, tendo 100% de participação em Libra ao invés de abrir para leilão, o Estado brasileiro arrecadaria R$ 175 bilhões a mais.

O que explica um país, que tem uma “nação amiga” como a Petrobrás, que é a maior especialista em exploração em águas profundas e ultra profundas do mundo, abrir negócios em uma área na qual o país gastou bilhões de dólares para explorar e mapear? O fato de ser um país subdesenvolvido, com forças armadas fracas, e ser subserviente aos interesses imperialistas. Além de ter, é claro, uma burguesia extremamente entreguista e inimiga do povo.

A estratégia dos EUA para a América Latina é impedir o surgimento de potências regionais, especialmente em áreas com abundância de recursos naturais, como é o caso do Brasil. O modelo dos norte-americano proposto para a região é o de países com Forças Armadas limitadas, incapazes de defender suas riquezas naturais, especialmente o petróleo.

Só se consegue entender o caso da Venezuela, se compreender-se a estratégia do império estadunidense para a Região. Eles não suportam a Venezuela, porque há mais de dez anos, este país reaparelhou suas forças armadas e armou a população para aguentar uma invasão dos yanques, se for necessário. Os norte-americanos há poucos meses cometeram mais um de seus inúmeros crimes contra a Venezuela: cercaram o pais militarmente, impedindo de chegar remédios e comida, em pleno processo de pandemia.

As denúncias da Vaza Jato em 2019 confirmaram o que a gente já sabia, que é o óbvio envolvimento central dos EUA no golpe de Estado no Brasil. A comprovação da atuação, e interesse, dos EUA no golpe são dimensões fundamentais da compreensão do turbilhão de acontecimentos ocorridos no Brasil nos últimos oito ou nove anos. Sem o conhecimento e a concatenação desses complexos fatos, é muito difícil entender o Brasil dos dias atuais. Assim como ocorreu em 1954, 1964, e em outros golpes contra o povo brasileiro, entre os principais grupos de interesses no golpe de 2016, o principal é o do Império.

José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.

 

 

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