O que une e o que separa Dilma e Lula

Dilma e Lula celebram posse do ex-presidente na Casa Civil em Brasília. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR
Dilma e Lula celebram posse do ex-presidente na Casa Civil em Brasília. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Por José Roberto Castro.

A ida de Dilma Rousseff ao Senado para se defender pessoalmente no julgamento do impeachment nesta segunda-feira (29) deve encerrar, de forma simbólica, a participação da presidente afastada em uma disputa iniciada ainda em dezembro de 2015, quando a denúncia na qual é acusada de ter cometido crime de responsabilidade foi aceita na Câmara dos Deputados.

Luiz Inácio Lula da Silva, seu antecessor, decidiu estar ao lado da afilhada política. Não se trata de uma tentativa de salvar seu mandato, já que a decisão dos senadores de cassá-la, oficialmente em razão das manobras fiscais realizadas pela sua gestão, já está praticamente selada. O principal líder petista, assim como Dilma – sua aposta eleitoral mais ousada -, miram mais a narrativa que vai ficar da atual crise política.

Trata-se de um momento em que Lula e Dilma estão afinados. No discurso de ambos, o país vive atualmente um golpe parlamentar dado em uma presidente eleita de forma legítima a ser substituída por um vice que pretende minar direitos históricos dos brasileiros, além de privatizar o patrimônio público nacional.

A sintonia vista agora neste epílogo de 13 anos de governo do PT no país, porém, não foi uma constante durante a gestão da ex-pedetista que alimentava a imagem de uma técnica competente e acabou escolhida por Lula para ser sua sucessora no Palácio do Planalto.

Como Lula conheceu Dilma

O líder petista conheceu Dilma pouco antes da campanha que o levou à Presidência em 2002. Ela tinha saído do PDT – partido no qual militou por duas décadas – e chegado ao PT, era secretária de Energia do governo gaúcho. Convidada para participar de uma reunião da equipe que preparava o programa de governo petista, Dilma impressionou.

“Eu sabia que ela era secretária do Olívio Dutra, mas não tinha muito contato, até porque ela era do PDT. Começamos a discutir e percebi que ela tinha um diferencial. (…) Aí eu fiquei pensando: acho que já encontrei a minha ministra aqui. Ela se sobressaiu em uma reunião que tinha 15 pessoas.”

Luiz Inácio Lula da Silva

Entrevista à Revista Piauí em dezembro de 2008

Nomeada para o primeiro escalão do novo governo, Dilma ganhou espaço quando pilares do PT caíram com o escândalo do mensalão, a partir de 2005. Sem José Dirceu e Antônio Palocci, a ministra de Minas e Energia foi para a Casa Civil, se transformou em mãe do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e em candidata à Presidência da República.

Com a eleição de Dilma, herdeira da alta popularidade do padrinho político, Lula parou de dar entrevistas, disse que a intenção era não interferir no governo da sucessora. “É direito dela fazer as coisas como ela acha que tem que fazer”, disse mais tarde.

A relação de ambos, publicamente, nunca foi ruim. Mas notícias de bastidores ressaltavam momentos de distanciamento em razão de discordâncias, principalmente na condução da política econômica e na relação (ou falta dela) da petista com o Congresso Nacional.

No início de 2014, com o país já em crise e depois de ouvir muitas queixas de correligionários sobre a sucessora, Lula rechaçou publicamente a possibilidade de disputar a eleição naquele ano, apesar da vontade de setores do PT. “Minha candidata é a Dilma Rousseff”.

“A minha lealdade ao presidente Lula, além de pessoal, é política. Eu não só sou leal ao presidente Lula como eu gosto dele.”

Dilma Rousseff

Entrevista ao SBT

Juntos, os dois governaram o Brasil por mais de 13 anos. Apesar de muitas políticas públicas serem as mesmas – como os programas de combate à miséria -, Dilma e Lula têm muitas diferenças, principalmente na maneira de governar. Abaixo, o Nexo lista o que une e o que separa a presidente afastada e seu padrinho político.

O que os separa

Dilma discursa em encontro da Cut, em São Paulo. Foto: Nacho Doce/Reuters

 Relação com o Congresso

Lula juntou em seu governo adversários históricos, teve apoio de políticos como Fernando Collor e José Sarney, manteve uma ampla base de apoio parlamentar. Dilma ganhou fama de durona e de não ceder nas negociações com o Congresso Nacional.

Em seu primeiro ano de governo, demitiu seguidos ministros por suspeitas de corrupção. A “faxina” desagradou a base de apoio. A relação se desgastou ao longo dos anos e os parlamentares que no início davam a Dilma a mais ampla base de um presidente desde a redemocratização, agora devem lhe tirar o mandato.

Política econômica

Logo que chegou ao poder, Lula escolheu um economista do PSDB para presidir o Banco Central, manteve os juros altos para controlar a inflação e recebeu críticas da esquerda. Antônio Palocci, seu primeiro ministro da Fazenda, dizia que prioridade era “tirar o país da UTI” antes de promover o “espetáculo do crescimento”.

Dilma é economista de formação e implantou sua própria política, com uma intervelçao mais forte do Estado na economia. Os incentivos ao crescimento e ao emprego, implantados após a crise de 2008, foram ampliados em seu governo. Ela tentava impulsinar a produção da indústria nacional, mas as desonerações de impostos sacrificaram a saúde das contas do governo. Era frequentemente acusada de não dar autonomia à equipe econômica.

Equipe de governo

Até por ter feito a maior parte de sua trajetória política fora do PT, Dilma não é tão ligada aos nomes que comandaram o partido nas últimas décadas. Com ela, ganharam projeção políticos de alas do PT que nunca foram os preferidos de Lula: José Eduardo Cardozo, Aloizio Mercadante, Miguel Rossetto e Pepe Vargas.

A distância entre as equipes aumentou no final do primeiro mandato de Dilma, com as saídas de nomes que tinham força com o presidente anterior, como Celso Amorim e Gilberto Carvalho, este último considerado um dos políticos mais próximos do ex-presidente.

O que os une

Lula conversa com sua candidata durante campanha de 2010. Foto: Reuters

 Projeto de poder

Com todas as divergências que possa ter com a presidente afastada, Lula sabe que ela era a continuação de seu projeto político. E disse isso várias vezes.

Nas duas eleições que disputou, Dilma contou com o apoio explícito do antecessor. Em 2014, mesmo com a popularidade da presidente já em queda, Lula foi à TV pedir que as pessoas votassem “sem medo” porque o segundo mandato de Dilma seria “melhor que o primeiro”.

Momentos de crise aguda

O momento mais importante para o governo Dilma aconteceu em março de 2016, quando ela nomeou Lula como seu principal ministro. Era uma tentativa de salvar o próprio governo e também o ex-presidente, que dias antes tinha sido levado a depor coercitivamente pela Polícia Federal.

Até agora Lula e Dilma se uniram em momentos de dificuldade, quando tiveram adversários em comum. Agora, no julgamento final do impeachment, a situação se repete.

A escolha

A escolha de uma política com trajetória de pouco brilho político para sua sucessão trouxe a Lula duas consequências diretas. A primeira é que seu posto de líder popular foi pouco ameaçado. Mas a segunda, e a que mais importa agora, é que o criador se vinculou de uma maneira muito forte à sua criatura.

Dilma nunca tinha ocupado um cargo eletivo, não é um quadro histórico do PT e não foi escolhida pelo partido. Dilma foi uma opção de Lula e por isso o fracasso do governo dela é também o fracasso dele.

Fonte: Nexo.

 

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