O que acontece com as mulheres que denunciam fotos de futuros médicos misóginos?

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Por Elika Takimoto.

Sabe o que acontece com as mulheres que denunciam fotos de futuros médicos fazendo “piada interna” com calça arriada e as mãos simulando uma genitália? São processadas por danos morais e proibidas de falarem a respeito.

Eu poderia explanar sobre a quantidade de mulheres que sofrem assédio e são estupradas diariamente. Poderia citar outro tanto que tem medo de andar nas ruas. Poderia contar para vocês quantas mulheres morrem por dia por não atender as expectativas do homem. Mas não. Falarei apenas de uma que foi a primeira a postar a foto dos futuros médicos de Blumenau.

Rosane Magaly Martins recebeu a foto dos garotos em um grupo do WhatsApp. Horrorizada com o que viu, acabou publicando-a em seu perfil. Não tardou para que a foto fosse para o resto do Brasil. Eu, particularmente, recebi a imagem de uma outra moça por inbox que me pediu sigilo absoluto da fonte. Quem me mandou deve ter, por sua vez, recebido de algum outro grupo do WhatsApp.

O jornal O Globo chegou a me citar dando a entender que eu teria sido a primeira a publicar a foto nas redes. Não foi, mas não faz diferença porque o que Rosane está passando é como se fosse comigo. E se falo sobre isso agora é porque ainda não estou proibida de falar.

Vai chegar a minha vez. Já estou avisada.

Os homens da foto poderiam ter vindo a público a la José Mayer explicar a tal “piada interna” e pedir desculpas pela postura. Enquanto não traduzirem para nós o que foi aquilo interpretaremos facilmente como uma apologia ao estupro e uma ode ao machismo sim senhores.

Já disse e repito: brincadeira é quando todos os lados se divertem. Se somente um lado ri, isso tem outro nome.

A situação piora porque esses que assim “brincam” fazendo fumaça com a ética serão médicos, quiçá ginecologistas, em um futuro próximo.

A postagem que eu fiz de outra foto (do ES) com o mesmo teor teve mais de 150 mil curtidas, quase 20 mil comentários e meu inbox explodiu de relatos de mulheres. A grande maioria contando-me histórias de assédios nos consultórios.

Cheguei a suspeitar (perdão se exagero mas quase concluí isso dado tudo o que li) que essa postura seria a regra e não a exceção dos homens que usam jaleco branco. Sei que não chega a isso, mas o número de mulheres que vão em busca de cuidados e recebem cantadas, apalpadas e dedadas nada profissionais é muito maior do que sonha a sua vã filosofia. Pode acreditar.

Não quero desmerecer a classe com essa postagem. O objetivo é apenas compartilhar parte de uma grande agonia do que nós, mulheres, passamos e mostrar um lado que até então pouco falávamos por timidez e medo e que voltaremos a nos calar porque assim estão nos obrigando.

Quando compartilhamos as fotos era uma tentativa de pedir pelamordedeos parem com isso. Não aguentamos mais sermos tratadas sem respeito. Era uma esperança de que o mundo melhorasse.

Mas não.

Estão nos processando. E se coloco no plural é porque o “mexeu com uma mexeu com todas” é a vera. Somos agora acusadas de danar com a moral dos rostos que mostramos.

Acho que, de fato, cabem aqui as nossas desculpas. Peço perdão em nome das muitas mulheres que compartilharam as fotos desses formandos em medicina para todos que tiveram os rostos expostos.

Fizemos isso no impulso por ter nos recordado ao olhar a fotografia do que sofremos pelas mãos de outros tão parecidos com vocês. Por ter medo de que vocês atendam nossas filhas e nossas netas um dia e as tratem com esse jeito que parece jogar a dignidade da mulher no lixo.

Se vocês sentiram que a moral foi danificada, imaginam o turbilhão de sentimentos angustiantes e das lembranças perturbadoras que nos ocorreram.

Rosane está muda e, como ela, me calarão também a qualquer hora.

Seguimos deixando a moral desses homens intactas, sendo humilhadas e com o patriarcado fazendo a festa.

Mas, até lá, compartilhemos o nosso grito.

Foto: Reprodução do Facebook.

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