O Coringa, a pólvora e os “maricas”: sinais de esgotamento do bolsonarismo. Por Roberto Antonio Liebgott.

Devemos ler esses fatos, da mídia e da política, a partir da simbologia que eles representam. Nesse caso, e ao que parece, a mensagem, não a dos "comunistas", mas a dos grupos políticos, econômicos e sociais que elegeram e sustentam Bolsonaro, parece bem objetiva: a paciência tem limites e as falas da pólvora contra os Estados Unidos de Joe Biden e o "país de maricas" transbordaram o copo que estava quase cheio d'água.

Foto: Evaristo Sá / AFP

Por Roberto Antonio Liebgott, para Desacato. info.

A capa da “Revista Isto É”, publicada no final de semana das eleições, entre 13 e 15 de novembro, vestiu Bolsonaro de Coringa misturando as duas figuras psicopáticas – sendo um personagem de ficção das histórias de quadrinhos da DC e dos filmes do Batman; o outro, presidente do que já foi uma das maiores economias do mundo.

O Coringa representa a imagem de uma pessoa excluída, insana e movida pela maldade. Ao associar Bolsonaro ao ‘Joker’, a revista quis passar a imagem de um presidente inconsequente, irresponsável e insano. Uma boa escolha?

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Imagem: Reprodução.

Não sei se seria a melhor combinação de imagens – a do Coringa com Bolsonaro – para representar a situação política do governo, uma vez que o personagem da ficção é, acima de qualquer coisa, arte, estética e expressa uma maldade combinada com esperteza.

Bolsonaro, ao contrário, é real e vincula-se à antipolítica, à destruição dos bens públicos, à promoção de milícias urbanas e rurais, governa para as elites, que nos quadrinhos representam uma das causas de revolta no Coringa, e ao fundamentalismo de caráter religioso. Conduz o país no rumo de uma certa imbecilidade social e cultural.

De todo modo, a capa da revista apresenta também, no meu modo de ver, a mudança de relação das elites e da direita com o governo, demonstrando que nem elas mais suportam esse ser abjeto e que tornou o Brasil, na visão de fora para dentro, um país comandado por incompetentes lunáticos.

Os militares, ao que parece, também resolveram dar um recadinho e mandaram o presidente fechar a boca, porque governo, segundo a mensagem, muda a cada quatro anos, mas eles permanecem; são parte do Estado.

Devemos ler esses fatos, da mídia e da política, a partir da simbologia que eles representam. Nesse caso, e ao que parece, a mensagem, não a dos “comunistas”, mas a dos grupos políticos, econômicos e sociais que elegeram e sustentam Bolsonaro, parece bem objetiva: a paciência tem limites e as falas da pólvora contra os Estados Unidos de Joe Biden e o “país de maricas” transbordaram o copo que estava quase cheio d’água.

As elites estão se dando conta de que o governo delas promoveu o isolamento político e econômico do país e o conduziu para dentro de um túnel com atoleiros e sem saída. Até o agronegócio já percebeu que a postura do presidente é péssima ao setor. O Brasil, nesta semana pós-primeiro turno das eleições municipais, deixou o grupo das dez maiores economias mundiais.

O barco faz água em meio a uma tempestade. Porque não basta a pandemia, o desastre como presidente e a economia em frangalhos. Agora, a partir da eleição do Biden, esses setores ligaram o sinal de alerta, porque sabem que, sem os EUA, a economia irá naufragar e o sistema financeiro buscará se salvar sacrificando quem for necessário.

As elites, e os partidos do Centrão, têm consciência de que lá na frente haverá tão somente uma parede intransponível e no caminho de volta há o atoleiro. Ou seja, deram-se conta de que agora devem regressar ao país que havia antes do Bolsonaro.

Os resultados das eleições municipais sinalizam, mais do que nunca, para o fortalecimento dos partidos de direita – puxados pelo Centrão – e uma certa retomada das pautas políticas dos partidos mais progressistas.

De todo modo, neste contexto de simbologias, metáforas e gestos políticos, é preciso atenção, análise e observação para saber como as elites reagirão com e contra o governo. Não é de estranhar, no próximo ano, se um daqueles pedidos de afastamento de Bolsonaro, dentre os mais de 30, venha a ser posto em discussão na Câmara do Deputados.

Bolsonaro está com uma faca no pescoço e finge não perceber: ou se adapta ao Centrão, aos interesses do grande capital e busque saídas com os seus aliados, respeitando as instituições e abandonando a retórica lunática e violenta, ou morrerá sozinho como aconteceu com Trump, que hoje se tornou um lunático de internet falando sobre fraude eleitoral e ridicularizado em todo o mundo.

Uma boa parte da população está torcendo por essa possibilidade. As eleições municipais rejeitaram o bolsonarismo e deixaram o governo ainda mais isolado politicamente. Os sinais do fim da era do populismo de extrema direita já são intensos e expressivos. No tabuleiro, os liberais já se movimentam com o apoio da mídia hegemônica que trabalha a falsa ideia de dois extremismos: o bolsonarismo e a esquerda. Por sua vez, a esquerda dá sinais de retorno à base com pautas concretas trabalhadas pela escuta e não pelo messianismo salvacionista.

A capa da” Isto É”, em síntese, reproduz o sentimento do sistema financeiro, dos grandes grupos econômicos e dos partidos que aderem.

O Coringa, a pólvora e os “maricas” parecem metáforas do esgotamento.

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Roberto Antônio Liebgott é Missionário do Conselho Indigenista Missionário/CIMI. Formado em Filosofia e Direito.

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