O compartilhamento de carros virou um fenômeno na Europa — e vai chegar logo aqui

carsharing_parking_704_468_80_s-600x400Imagine uma viagem que começa em uma rua estreita de Roma, banhada pela luz rosada da aurora. Visualize a condução ao longo das estradas ladeadas de pinheiros. Em seguida, ela vai para Paris, Londres e, finalmente, as verdes colinas da Escócia, estendidas diante de você como um campo de golfe gigante.

Matthias Lorenz- Meyer congela estas imagens na tela de seu computador com um clique de seu mouse. Sua viagem de Roma para Edimburgo durou três semanas e dois tanques de gasolina. Mas o veículo não pertencia a ele. Era da Ford. As imagens eram de um comercial. Ele vendeu seu próprio carro, um Renault Twingo, no ano passado. “Eu estou feliz de ter me livrado dele”, diz ele. “Era uma chatice. ”

Lorenz- Meyer é um modelo que faz publicidade e empresário da Internet, não um hippie. Ele é um dos muitos alemães com menos de 40 que vivem em cidades que viraram um quebra-cabeça e uma preocupação para a indústria automobilística. O motivo? Eles não se preocupam em ter seus próprios veículos.

Na Alemanha, a casa do automóvel e onde a indústria automobilística ainda é um setor-chave da economia, isso é quase uma traição.

Cerca de 46% dos habitantes da capital Berlim vivem sem carro. Em Nova York, o número chega a 56%. Residentes urbanos que ainda têm veículos não os utilizam. Em Munique, o veículo é usado em média por apenas 45 minutos por dia. O resto do tempo ele está ali custando dinheiro em seguros, impostos, depreciação e provavelmente taxas de estacionamento.

As vendas caíram drasticamente entre os clientes-alvos de amanhã. Os compradores de veículos novos estão ficando mais velhos. Para os jovens, outras coisas importam mais.

Nos velhos tempos, o automóvel era algo que todo mundo tinha que ter. Ele simbolizava independência e vida adulta. Atualmente, os jovens têm mobilidade geográfica e virtual, e só precisam de um telefone celular. Um veículo não vai ajudá-los a viajar para Honduras, Nova Zelândia ou Vietnã.

“Os celulares realmente abriram as possibilidades de viver em várias partes do mundo”, diz Michael Kuhndt, chefe do Centro de Consumo Sustentável de Wupertal. “Os jovens consideram os automóveis um fardo”.

A indústria automobilística, não querendo perder seus jovens clientes, está lutando contra a partilha do automóvel – na esperança de restaurar o interesse com um sistema de pagamento alternativo. A Mercedes, por meio de sua subsidiária car2go, oferece Smarts em Munique, Hamburgo, Colônia, Berlim e em outros lugares. A BMW fornece Mini Coopers, BMWs Série 1 e X1s através do seu programa DriveNow. A Citroën oferece o elétrico C- Zero. E a companhia ferroviária alemã Deutsche Bahn oferece vários modelos através de seu sistema Flinkster, de Fiat 500 a Volkswagen Golfs.

O uso é geralmente calculado com base no tempo. Um minuto custa a partir de 28 centavos. Os clientes pagam uma taxa de inscrição e recebem um chip eletrônico por correio. Através de um aplicativo de smartphone, eles podem descobrir onde o veículo mais próximo está. Quando terminam de usar, eles estacionam e vão embora. É um serviço simples e funciona: no final de 2011, a Alemanha tinha cerca de 260 mil inscritos nesses programas; no início de 2013 , já havia mais de 450 mil.

De acordo com dados publicados pelo Instituto Fraunhofer, o número de automóveis na Alemanha vai reduzir pela metade até 2050. “As cidades serão verdes, lugares agradáveis ??para viver e amigas do ciclista; existirão amplas vagas para compartilhamento de automóveis”, dizem os autores do estudo “Uma visão de transporte sustentável para a Alemanha”. Mesmo nos Estados Unidos, um carro compartilhado substituirá pelo menos oito veículos no futuro, de acordo com cálculos dos autores do estudo.

O compartilhamento de carros é parte de uma tendência social em que os consumidores preferem compartilhar alguns itens em vez de possuí-los. Smartphones tornaram isso possível. A tendência reflete a flexibilidade de novos estilos de vida e carreiras. Para o empresário de Internet Matthias Lorenz- Meyer, o smartphone é o centro de sua existência. Para Constanze Siedenburg, designer e porta-voz do Partido Verde no distrito de Pankow em Berlim, a vida gira em torno de seu bairro e de sua família, mas como uma viajante ela tem muito em comum com Lorenz- Meyer. Ela também já vendeu seu carro e agora dirige veículos que não pertencem a ela. Eles ilustram como pode ser a mobilidade nas grandes cidades nos próximos anos.

De acordo com Rachel Botsman, especialista baseada em Nova York, a partilha de carros é apenas o começo de mais compartilhamentos em geral. De jardins abandonados transformados em espaços para o cultivo de hortaliças a bicicletas, ferramentas e animais de estimação – uma mudança para o consumo colaborativo está ocorrendo em todo o mundo.

Botsman observa um retorno a uma velha cultura de mercado, com acordos selados com um aperto de mão. Isso agora está se transferindo para a aldeia global com a ajuda da Internet. Depois do eBay e da Amazon, o processo continuou com as redes sociais, comunidades online, compartilhamento de fotos, vídeos, opiniões e conhecimentos. A continuação natural agora é o uso compartilhado de bens de consumo.

Talvez a coisa mais importante neste novo mundo de compartilhamentos é a redescoberta de uma antiga virtude social: a confiança. Quando as pessoas alugam um quarto em sua casa para um casal de estranhos ou emprestam-lhes suas bicicletas em troca de pagamento, eles fazem isso com o pressuposto de que nada pode dar muito errado. E que, se isso acontecer, o seguro vai pagar pelos danos.

Para Bostman, isso é uma resposta ao hiper-consumo do século 20. Uma família americana hoje tem, em média, o dobro de coisas de uma família americana há 25 anos. Garagens estão cheias de patins, brocas, gaiolas, máquinas de fazer pão, celulares antigos etc. Coisas que as pessoas compravam porque não poderiam viver sem agora apodrecem em algum canto porque ninguém precisa mais delas.

Carros são particularmente bons para o compartilhamento. Eles estão entre os bens de consumo mais caros, mas na maioria das vezes só ficam parados. Automóveis estão passando agora pelo que aconteceu com a música há dez anos: eles estão virando posses temporárias.

“Compartilhar é limpo, urbano, pós-moderno; ser dono é maçante, egoísta , antiquado”, diz o escritor norte-americano Mark Levine. Se ele estiver certo, a mudança veio para ficar. Ele acredita que uma vez que indivíduos deixem de ser vistos como “proprietários”, não haverá volta. O processo não poderá ser revertido. “Compartilhar é para o ato de ‘possuir’ o que o iPod foi para o gravador de oito canais, o que o painel solar foi para a mina de carvão”, escreveu no New York Times.

Fonte: Diário do Centro do Mundo.

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