O Brasil inserido na geopolítica

Por Moacir Francisco Pires, para Desacato.info.

Do interior do Oeste Catarinense: Escrevi um texto abordando sobre crise, corrupção, mídia, progressistas, conservadores e desigualdade, situando a temática na disputa geopolítica. Dedico aos amigos.

Dizia Osvald de Andrade que “a gente escreve o que ouve, nunca o que houve”. Corro este risco, mas a frase do escritor ganha sentido, cores e vida diante do noticiário brasileiro. A mídia nativa parece ter apenas um redator, por isso você vai ouvir a mesma pauta, escolhida segundo os interesses dos donos, mas raramente ouvirá aquilo que houve, especialmente quando ela estiver falando do futuro econômico e político do Brasil. Dessa maneira, a crise brasileira fica mal entendida porque a mídia esconde o seu contexto geopolítico.

Grosso modo, a Sociedade Capitalista produz e comercializa mercadorias para ter lucro. Sem problemas nisso. Os investimentos não são feitos conforme o que as pessoas precisam para viver, mas se produz aquilo que dá mais lucro. Assim, as empresas vão acumular e os trabalhadores sobreviver! A mercadoria que é produzida precisa ser consumida. Mas como os trabalhadores recebem salário básico, o consumo vai se concentrar nas camadas ricas da população, que não conseguem comprar toda a produção. Então, os produtos vão sobrar, criando crise, exatamente por causa da superprodução ou subconsumo.

Os Estados deveriam fazer a mediação para corrigir as desigualdades do Sistema. Os Estados têm demonstrado fragilidade diante do poder aniquilador representado pelo Capital Financeiro, que a partir dos anos 1980 desfila soberano a ditar suas regras para especular, aumentando as desigualdades entre os trabalhadores, entre as empresas e entre os países. Depois da crise de 2008, os ricos saíram mais ricos e os pobres, mais pobres. Agora o capitalismo já está colhendo o fruto em que 1 % da população mundial, umas 85 pessoas, possui mais bens e riquezas do que os outros 99 % de toda a humanidade. Pausa para chorar… Abordagem sobre este “sucesso” você não vai saber nem ouvir na mídia!

Estamos na quinta crise desde os anos 1980. Mas o capitalismo não pode perder tempo no processo de acumulação. Em alguns momentos históricos ele vai recorrer a um “remédio’ amargo, criando uma guerra para satisfazer a gula perversa da acumulação. Por isso, os países nacionalistas são classificados como ameaça a esse processo de concentração, por teimarem em não entregar suas riquezas e recursos naturais para a rapinagem. Neste contexto dá para entender porquê os EUA e os europeus bombardeiam algumas “ditaduras”. Depois de ficar terra arrasada, as suas empresas terão ótima oportunidade para financiar, reconstruir e acumular cada vez mais. País nacionalista ou emergente, perigo constante! Volte a chorar!

Entretanto, ditaduras que praticam torturas e execuções sumárias como o Kuwait, Catar e Arábia Saudita vivem sem incômodo, porque entregam as suas riquezas através de acordos favoráveis aos EUA. Que ninguém se engane pensando que o preconceito e o ódio inventados e divulgados na mídia Ocidental contra o Afeganistão, o Iraque, a Líbia e os árabes em geral, é por causa do Islamismo ou de seus governos ditatoriais. O Ocidente não possui qualquer compromisso com aqueles povos oprimidos. A cobiça são as reservas de petróleo. O mesmo vale para a versão construída a respeito da Rússia, do Irã, da Síria e da Venezuela. Após a descoberta da reserva de 300 bilhões de barris do Pré-Sal pela estatal Petrobras, o Brasil entra no clube dos maiores produtores de petróleo do mundo. Está na mira!

A convivência pacífica entre as empresas privadas e as estatais existe enquanto o Capital acha oportunidades para crescer. Vai concentrar de forma diplomática ou radicalmente. Estrategicamente, o neoliberalismo foi imposto à América Latina (AL) na década de 1990 para possibilitar que o Capital lucrasse. Impuseram a austeridade fiscal, a desregulação da legislação trabalhista, o livre comércio entre países desiguais, o sucateamento estratégico das estatais para depois privatizar. Assim, os tucanos aplicaram a cartilha neoliberal, criando uma série de novas oportunidades para as transnacionais rapinar.

Naquela década, as consequências por aqui foram trágicas. Os tucanos dobraram a dívida pública 30 para 61 % do PIB, estancaram o crescimento, aumentando a pobreza e a deterioração das condições de vida de milhões. O Brasil ficou terra sem dono. Acolha como exemplo, o caso de uma fila com 130 mil desempregados para ser Gari no Rio (UOL 05/07/2003). Em 97, a Vale foi liquidada por R$ 3, 3 bilhões, mas tinha valor estimado de R$ 92. Com uma mão entregaram a estatal e com a outra alcançaram o dinheiro do BNDES para os compradores! A receita neoliberal foi imposta como tentativa de saciar a perversidade do Capital, mas na mídia cartelizada só se ouvia e ainda ouve-se elogios ao príncipe das privatizações.

Depois que os governos neoliberais fizeram da AL terra sem dono, diversos candidatos progressistas começaram a ganhar apoio popular e eleições, colocando em prática políticas sociais de distribuição de renda e redução da pobreza, inaugurando um período de esperança. Os conservadores não conseguiram mais voltar ao poder através do voto democrático, no entanto, até agora ainda não aceitaram a quarta derrota nas urnas eletrônicas, suspeitas de fraude, mas fraude só para presidente, não para os governadores conservadores. Pausa para você rir desta dicotomia cínica de má fé.

Os governos do PT cometeram diversos erros. No início deste ano Dilma cedeu às pressões do Mercado, colocando em prática uma política de austeridade, bandeira dos conservadores. Apesar disso, se fizermos uma comparação dos 8 anos do PSDB e dos 12 anos do PT vamos constatar diferenças gritantes: A inflação média dos tucanos foi 12 %, na era PT 6.5 %. O PSDB dobrou o desemprego, levando o país ao segundo lugar, só perdia para a Índia. Com o PT tivemos a menor taxa da história (5.4 %), com a criação de 20 milhões de empregos formais. Os tucanos dobraram a dívida pública de 30 para 61 % do PIB. Ou seja, em apenas oito anos FHC contraiu uma dívida equivalente àquela que o país levou 500 anos para construir. Aumentaram a carga Tributária de 27 para 60 % do PIB, agora reduzida para 35 % do PIB. A função do BNDES era preparar as estatais para depois privatizar. Agora, o financiamento a países estrangeiros não chega a 2 % dos recursos do BNDES, 98 % da clientela são empresas brasileiras. Com os tucanos, o BNDES teve lucro de 550 milhões, em 2013 foi de 8.15 bilhões. As reservas internacionais em 2002, após três empréstimos do FMI eram 37 bilhões, atualmente é US$ 375 bilhões. O valor de mercado da Petrobrás em 2002 era R$ 15,5 bilhões, agora é R$ 104,9 bilhões. Em 2002 o investimento em Saúde foi de 28 bilhões, 106 bilhões em 2013. Em 2002 não havia 1,2 milhões de bolsas PROUNI, 1,3 milhões beneficiários do FIES, 14.7 milhões no PRONATEC, 1,5 milhões de famílias com Minha Casa Minha Vida, 100 mil no Ciências Sem Fronteiras, Mais Médicos, Brasil Sem Miséria, Criação de 18 Universidades Federais e 214 Escolas Técnicas. São dados.

As Estatais brasileiras vivem novamente um período de ameaça por causa da cobiça do Capital. Após a crise de 2008 aumentou a pressão para que o Brasil entregue suas empresas públicas para deleite dos EUA. Os países centrais querem garantir acesso aos recursos naturais estratégicos ao menor preço possível para bancar suas economias. O Pré-Sal é a menina dos olhos do Capital Privado devido à magnífica reserva. A Petrobras sozinha representa 13 % do nosso PIB. Por isso, o maior desafio do Brasil é manter o controle público sobre o setor de petróleo como parte do projeto de desenvolvimento nacional, sem exploração predatória como vem acontecendo com a (Vale) Samarco. O Modelo de Partilha e a política de Conteúdo Local garantem autonomia à Petrobras para selecionar fornecedores brasileiros de bens e serviços, garantindo ao país empregos qualificados. Entretanto, as oposições querem o retorno da Concessão da exploração para beneficiar a Chevron, a Shell, a BP e a ExxonMobil. Neste contexto de interesses externos se insere o projeto entreguista de José Serra que deseja retirar o controle desta riqueza dos brasileiros. Um projeto lesa pátria!

O Projeto conservador representa a destruição do Estado Nacional, porque deixaria o país incapacitado para levar adiante seu desenvolvimento econômico e social e abortaria precocemente o processo de inclusão social e de melhoria na distribuição de renda iniciado em 2003. O desmonte das políticas sociais comprometeria o crescimento econômico com inclusão social. Isto diferencia progressistas e conservadores, conhecidos por esquerda e direita!

Os EUA e Europa ainda não se recuperam da crise de 2008. Por isso, é imperativo avançar as fronteiras em direção aos emergentes onde algumas estatais sobreviveram à devastação das privatizações neoliberais e continuam comandadas pelo Capital Nacional. A cobiça vai além da Petrobras e do Pré-Sal. Inclui setor de Eletricidade, de Infraestrutura, de Transportes, de Saneamento, de Educação, o SUS, o segmento Bancário (CEF, BB, BNDES) e a Embraer. Gana sem fim. Estão na linha de tiro, pois continuam comandados segundo os interesses sociais dos cidadãos brasileiros, motivo para as oposições (mídia e partidos) falar mal diariamente deste Brasil com projeto de futuro e autonomia. Na visão das oposições, todos estes setores deveriam estar sendo dominados pelo Capital estrangeiro, para gerar lucro para 1 %. Pausa para lamentar e abrir os olhos quando os conservadores dizem que o Estado gasta muito e mal, anunciando que só o Mercado salva!

A tradição intervencionista dos EUA exibe sua ficha corrida com inúmeras conspirações e participação em golpes de Estado contra governos na AL. Até hoje foram 25 golpes de Estado, intervenções e guerras comandados por eles para impor seus interesses econômicos e geopolíticos. Praticam o intervencionismo por considerar a AL seu “quintal” e prerrogativa geopolítica inegociável.

Para conter os governos progressistas, os EUA articularam um ambiente político tenso e polarizado. A linha de ataque aos interesses nacionais é formada por “especialistas”, falando na mídia contra todos os projetos de desenvolvimento com autonomia, segundo atestam as pesquisas científicas, no site da UFRJ no endereço www.manchetometro.br.  Vale conferir.

Na AL há cerca de 650 emissoras de TV, combatendo os governos progressistas e os interesses populares. São emissoras ligadas a grupos econômicos e políticos e se converteram em máquinas ideológicas do neoliberalismo, formando um cartel monopolizado na defesa da austeridade sobre a classe trabalhadora. Assim, mídia brasileira reproduz este pensamento único. Na última década, ela alimentou um discurso descontextualizado da realidade, carregado de preconceito político e ódio contra os trabalhadores. Essa overdose de veneno e rancor diários sustenta a fauna despolitizada contra os governos progressistas e o futuro que inclui todos os brasileiros. Os revoltados reproduzem uma agressividade tosca nas redes sociais contra seu grupo de pertencimento, a classe trabalhadora, chegando a sair do armário para atacar como inimigos, qualquer diversidade vista nas ruas, até nos restaurantes.

No documentário Ao Sul da Fronteira, o americano Oliver Stone retrata como a mídia se une aos interesses dos EUA contra os governos progressistas da AL. O cineasta demonstra que o motivo da guerra no Iraque foi o petróleo, o cerco ao Irã é pelo petróleo, na Venezuela também é o petróleo. Financiam e apoiam as oposições destes países, criando um clima de instabilidade política para derrubar governos progressistas. Assim, ocorreu o golpe na Venezuela em 2002, no Paraguai em 2012 e o Brasil continua sob ameaça desde as patrocinadas manifestações de 2013 para que o país seja devolvido aos conservadores, para que estes o entreguem de novo ao deleite das empresas deles. Neste contexto antinacionalista se inscrevem as ONGs Brasil Livre, Vem Pra Rua, Revoltados On-line e outros grupos seletivos, os quais jamais protestaram contra a abundante corrupção praticada pelos políticos conservadores.

Não podemos esquecer a blindagem da mídia cartelizada quando se trata de esconder a corrupção do empresariado e dos políticos conservadores. Você não ouve quase nada daquilo que houve nos casos HSBC e Zelotes. Que você ouve do chamado Cartel dos Trens, terminologia usada para esconder os tucanos? Que ouve da Lista de Furnas que dava mensalidade de $ 110 mil para Aécio? Você não ouve os Procuradores da Receita Federal estimar a sonegação anual das grandes empresas brasileiras em 500 bilhões. O Sonegômetro anual representa quase o dobro de todo investimento do Brasil em Saúde, Educação, Habitação (MCMV), Bolsa Família e Seguro Desemprego deste ano no valor de 300 bilhões. Combatida a sonegação empresarial, o Brasil poderia quase dobrar o investimento e a qualidade da Saúde, Educação… Por isso não se vê revoltados nem indignados seletivos!

A corrupção é um fenômeno com expressão individual, também faz parte do processo de competição econômico-política próprios do capitalismo. Em todos os países há corrupção em maior ou menor proporção! Muitos discursam “A corrupção com o PT blá, blá, blá” Entretanto, agora as investigações estão acontecendo no Brasil. Cunha ainda anda solto, mas você tem visto políticos e empresários na cadeia! A Polícia Federal com os tucanos realizou só 48 operações especiais de combate a corrupção em oito anos. Com o PT foram 1273 operações, causando a impressão de que aumentou a corrupção. Não cresceu, os instrumentos de combate a ela é que aumentaram. Aos fatos, a primeira coisa que o FHC fez quando chegou ao poder foi extinguir a Comissão para Investigar a Corrupção, criada por Itamar Franco. Nomeou um político tucano para chefiar a Polícia Federal, o qual transferia delegados independentes; escolheu Geraldo Brindeiro por quatro vezes mesmo sendo o sétimo candidato da lista, que ficou conhecido como Engavetador Geral da República, com 4 mil processos escondidos no tapete, perdendo prazo. Além disso, a mídia cartelizada blindava, por isso, havia a impressão de não ter tanta corrupção. Você não ouvia, mas havia e há muita coisa debaixo do tapete demo tucano e eles ainda continuam soltos a gritar, pega progressista!

Continua em andamento uma disputa geopolítica. O imperialismo trata de impedir que se avance na construção do multilateralismo proposto pelo BRICS. A estratégia geopolítica de dominação dos EUA visa impedir a emergência de rivalidade em escala global. Por isso, que para eles a participação autônoma do Brasil no bloco BRICS ao lado da Rússia, Índia, China e África do Sul não pode prosperar. Entretanto, o bloco emerge como alternativa de um mundo multipolar, fortalecendo os processos de integração regionais com proposta de livre determinação dos povos, resolução dos conflitos de forma negociada e pacífica, sem submeter-se aos interesses e orientações dos EUA. O BRICS se caracteriza pelo protagonismo do Estado na condução das políticas sociais, que expandem o mercado interno de consumo, fortalecimento das políticas sociais para elevação da qualidade de vida dos trabalhadores, contrastando com a austeridade dos Mercados aceitos pelos governos conservadores.

O bloco BRICS mantém a proposta de construção de um mundo multipolar para que o desenvolvimento universal se sustente sob a bandeira da paz e cooperação entre todos os povos, deixando de orbitar sob as garras belicosas dos EUA e Europa. O bloco articulou a criação do Banco BRICS, com a perspectiva de estabelecer uma moeda própria para o comércio dentro do grupo, quiçá universal, criando alternativas para investimento em países fora do grupo, na conexão Sul. Mas isto você não verá na mídia nativa!

Andrade falou que “a gente escreve o que ouve, nunca o que houve”. A frase do escritor é atual diante jogral diário da mídia cartelizada contra os interesses progressistas, por isso, você somente ouve notícias escolhidas segundo a vontade dos donos. Raras exceções mostram aquilo que está havendo. Consequentemente, poucas coisas boas sobre o Brasil chegarão ao conhecimento da população, assim, a realidade fica encoberta!

Se quisermos um país soberano e para todos os brasileiros precisamos qualificar os trabalhadores e mobilizar as forças democráticas para impedir que os movimentos antinacionais apoiados pela mídia e partidos reacionários alimentem o preconceito e o ódio de classe da fauna, que avança na contramão de nosso futuro, pensando que a sabotagem patrocinada pelos conservadores contra os governos progressistas está acontecendo para evitar a ameaça do comunismo (pausa para rir), também precisamos paciência para ajudar os filhos da mídia a superar o singelo pensamento maniqueísta e conseguir saltar sobre os cacos do muro de Berlim, para um dia finalmente cair na realidade geopolítica contemporânea!

Via Claudia Weinman.

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