O analfabetismo político

SOS forças armadas

Por Thiago Burckhart, para Desacato.info.

O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais […]. 

                                                                                                                                                                                                                                        Bertold Brecht

Os versos acima foram escritos pelo poeta e dramaturgo Bertold Brecht, há mais de cinquenta anos. Apesar de escrito há tanto tempo, eles adequam-se perfeitamente à realidade brasileira atual. Esses versos permanecem mais vivos que nunca, quando grande parte da população brasileira encontra-se imersa num mar de ignorância e despolitização.

Neste último domingo as ruas de inúmeras cidades brasileiras foram ocupadas por manifestações contra a corrupção e o governo federal, eleito democraticamente no final do ano passado. Os manifestantes reivindicaram o impeachment da Presidenta da República. Muitos alegam que o ato se deve aos escândalos de corrupção da Petrobrás. Ocorre que não há nenhum elemento técnico-jurídico que garanta – ou que enseje – o impeachment da Presidenta.

De fato, aqueles que pedem o impeachment não tem a noção da profundidade dos problemas políticos do país. Não entendem ou não participam da vida política o Legislativo e do Executivo em qualquer esfera. Não conhecem – e talvez nem saibam o que é – a nossa Constituição. Creem que a corrupção foi inventada ontem, ou ainda por um determinado partido político, esquecendo-se da promíscua história brasileira marcada pelas relações fisiológicas entre o público e o privado. Acreditam que tirar a Presidenta resolve o problema.

Como disso Gregório Duviver em entrevista para o jornal gaúcho Zero Hora, “o que há é uma histeria coletiva”.

Ainda não sabemos o que é viver em uma democracia?

Para além daqueles que pediram o impeachment da Presidenta, também tiveram aqueles que reivindicaram pautas como a intervenção militar.

O analfabetismo político é um mal que ainda nos assombra, e que implica no esquecimento do nosso passado. O analfabeto político é aquele que não entende de história política, que não sabe interpretar os acontecimentos históricos e contextualiza-los com o que vive-se hodiernamente. O analfabeto político não entende que uma das grandes conquistas do Brasil nas últimas décadas foi o fim da Ditadura Militar e a promulgação da Constituição de 1988, que estabeleceu o período democrático mais sólido e duradouro na história do nosso país. Aqueles que pedem uma intervenção militar certamente não conheceram os porões da ditadura, e os cruéis crimes de Estado praticados durante a mesma.

Muitos apareceram nas ruas reivindicando o “fim da doutrinação marxista”, o “fim do Partido dos Trabalhadores”, pregando o linchamento da Presidenta e a “luta contra o ‘comunismo’”. Essas reivindicações demonstram uma sublevação da burrice coletiva. A burrice aqui é tratada, nos dizeres de Marcia Tiburi, como uma categoria de alta epistemologia acadêmica, que define os ignorantes que não querem saber, ou seja, aqueles que estão fechados para o diálogo, o debate livre e aberto.

A estes, falta-lhes o esclarecimento.

Por uma reforma política

O que ocorre na verdade é que as reivindicações, tanto a favor do governo federal (ocorridas no dia 13), quanto contrários ao mesmo, criam um pano de fundo para a discussão daquilo que realmente é necessário para a consolidação da democracia brasileira: a reforma política.

Desde muito se chama a reforma política como a mãe de todas as demais reformas, como um conjunto de ações e medidas que proporcionariam uma profunda revisão das bases fundantes da política brasileira. De fato, a reforma política tem um grande potencial de sê-la. Desde que bem manejada, a reforma política pode ser um grandioso instrumento para uma mudança radical – na raiz – dos problemas políticos que ainda assolam o nosso país. Temas como o fim do financiamento privado de campanhas políticas são de importante efetivação, pois é essa uma das grandes questões que perpetuam a corrupção no Brasil.

De fato, muitos que saíram às ruas neste último domingo não compartilham das absurdas reivindicações aqui relatadas, realizadas por determinados setores. Há muito o que se criticar no governo Dilma. O seu segundo mandato está sendo marcado por inúmeros erros e escolhas políticas que não são, por óbvio, as mais adequadas para o momento, como o “ajuste fiscal”, dentre outros.

Contudo, no contexto onde o ódio alimenta a ignorância e a irracionalidade torna-se cada vez mais difícil dialogar sobre política com pessoas que, nutridas pelas visões midiatizadas – diga-se, controladas pelos meios de comunicação –, repetem e repetem clichês sem a menor reflexão sobre o que falam. Criam-se discursos infundados e ilógicos, negando o espírito democrático e alimentando o fascismo e o analfabetismo político.

Não se sabe qual será o desfecho dessa história. Mas é evidente que tempos difíceis virão!

Thiago Burckhart é estudante de Direito.

Foto:  Anna Beatriz Anjos

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