Nunca é demais lembrar: sexo sem consentimento é sempre estupro

Viralizou o vídeo em que Everson conta sobre noite em que a ex-namorada se recusou a transar. Ele, então, esperou a garota dormir para transar mesmo assim

Quatro homens se reúnem para contar sobre suas experiências sexuais – só as mais “engraçadas”. Entre as histórias, se divertem com uma em especial: a noite em que um deles, louco para transar, espera a namorada dormir para fazer sexo sem o consentimento dela.

Por duas vezes, antes de cair no sono, ela havia avisado que não queria saber de sexo naquela noite. Quando ela acorda, após começar a penetração, ele para. Os quatro caem na gargalhada com a situação.

A essa altura você deve saber que o protagonista é o youtuber Everson Zoio, que tem quase 10 milhões de inscritos em seu canal. O vídeo com a narração da história viralizou na última sexta-feira 27, pelo canal de outro youtuber.

No dia seguinte, Everson gravou outro depoimento, dessa vez para contar que mentiu sobre a história, “porque homem é assim, aumenta as coisas”. E que a “piada de mau gosto que nem deveria ser chamada de piada” é de 2015. Com um show de frases controversas. “Na época [2015] não era esse tal de politicamente correto como é hoje. E não tinha esse efeito todo. Um dia você não pode mais falar nada. Mas estou muito arrependido”, contou. “Estou aqui para pedir desculpa pela piada, uma piada de muito mau gosto, não vou nem chamar de piada. Foi uma coisa escrota minha. Foi uma história inventada.”

Não deveria ser chamada de piada porque não é. Dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo, conseguidos por meio da Lei de Acesso à Informação pela Globonews, apontam que, entre 2016 e 2017, 65% dos estupros no Estado aconteceram em casa. E 80% deles eram amigos ou conhecidos da vítima.

A pesquisa mais completa sobre o assunto, publicada em 2014 pelo IPEA, mostrou dados parecidos. Ou seja, esses crimes acontecem em casa e são praticados por conhecidos. São 79% dos casos entre crianças; 67%, entre adolescentes e 65% dos casos entre adultos. Em 7,1% dos o agressor é o namorado – e em 32,2% a violência vem de algum amigo.

Sexo sem o consentimento dos envolvidos configura estupro. Sempre. Mesmo quando há qualquer vínculo entre vítima e agressor, incluindo o casamento. E se a ex-namorada de Everson estava inconsciente obviamente não houve consentimento.

“O mais importante nessa história é a repercussão. As pessoas, especialmente as mulheres, começaram a entender que estupro acontece também dentro de relacionamentos. E muitos homens ainda não veem isso como estupro”, afirma a advogada Isabela Guimarães Del Monde, da Rede Feminista de Juristas.

A Polícia Civil de Minas Gerais começou nesta segunda-feira 30 a apurar o caso e os envolvidos devem prestar depoimento em breve. De acordo com Del Monde, crime de estupro depende de representação da vítima e precisa ser registrado, no máximo, em até seis meses após a violência. “É uma medida para respeitar a privacidade da vítima. Então uma investigação ainda depende do relato dela”, explica.

De qualquer forma, a “piada” contada por Everson pode ser considerada como apologia à violência. “Podemos falar sobre todos os assuntos, mesmo aqueles considerados ilegais, como drogas ou aborto. O problema é como a gente fala sobre isso. Se o discurso ou texto defende, justifica ou elogia, então pode ser classificado como apologia”, diz Del Monde.

E a exposição da ex-namorada, por si só, já poderia render uma ação. “Houve violação da privacidade dela ao contar publicamente sobre uma violência. Eu processaria por violação moral, danos morais por exposição”, defende Del Monde.

Há poucas semanas, o youtuber Júlio Cocielo também causou polêmica ao fazer comentários racistas sobre o jogador de futebol Kylian Mbappé, da França. Perdeu três grandes patrocinadores: Coca-Cola, Itaú e Submarino. Até agora, Everson só perdeu o convite para participar do evento Curitiba Social Mix, de cultura digital.

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