Por Erick Gimenes.
Enquanto as ações do governo não chegam aos trabalhadores informais, movimentos ligados à categoria organizam as chamadas “vaquinhas” para ajudá-los a atravessar a pandemia do coronavírus no Brasil. Sem direitos trabalhistas, eles estão entre os mais expostos em meio à crise de saúde pública.
As campanhas de solidariedade buscam financiar itens básicos, como comida e remédio, para populações em situação de vulnerabilidade. Estão nesse grupo, por exemplo, catadores de recicláveis, pessoas sem-teto, vendedores ambulantes e camelôs, que viram sua renda despencar em função do isolamento social recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para combater a transmissão da covid-19.
Uma das iniciativas é encampada pela União Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras Camelôs, Feirantes e Ambulantes do Brasil (Unicab). Articulada com representações em dez estados, o movimento busca criar um fundo de emergência para quem precisa.
Maíra Vanucci, representante da Unicab, explica que a ideia é distribuir o que for arrecadado para as bases e, ao mesmo tempo, cobrar o poder público sobre ações como renda básica para o comércio informal, isenção nas contas de luz e água, proibição de despejos e distribuição de cestas básicas.
“Eles já estão sem dinheiro, sem comida. Tem muita gente mandando mensagem, pedindo acompanhamento, porque o marido morreu, por exemplo. A pessoa não tem nem como ir para rua, trabalhar para recuperar o dinheiro dos dias que ficou fora”, relata.
Segundo Vanucci, mesmo em situação de vulnerabilidade, os trabalhadores têm se unido para ajudar uns aos outros. “É incrível, porque eles são os que menos têm recursos, mas já estão com esquemas para conseguir arrecadar cesta básica e dividir entre várias pessoas. Já chegaram fotos de gente que vai na padaria, pega uma parte do pão e distribui para as pessoas”, diz.
“O recado é esse: se organizar, formar essas redes de solidariedade, para que ninguém passe por essa situação de extrema escassez e vulnerabilidade”, pontua.
Renda comprometida
Outra classe que se uniu em solidariedade foi a dos catadores de materiais recicláveis. Além de várias ações de ajuda entre eles, também lançaram uma campanha de financiamento coletivo.
“Neste momento precisamos de assistência, de uma colaboração da sociedade. Nós, catadores, há mais de 50 anos estamos prestando serviço de utilidade pública, na questão do meio ambiente. Nada melhor do que termos uma ajuda coletiva, de todos os parceiros, tanto da parte do governo federal, municipal, estadual, como também empresa e a própria sociedade”, apela o catador Eduardo Ferreira de Paula, líder do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).
Ele conta que, embora muitos catadores ainda sigam em atividade durante a pandemia, não há como vender, porque os compradores suspenderam as atividades. Em meio à crise, surgem aproveitadores.
“As indústrias pararam, tem indústria que não está pegando. Os compradores não estão comprando nada. E aí tem alguns aproveitadores que ainda querem comprar o material do catador a preço de banana, lá embaixo, explorando mais ainda os catadores”, lamenta.
O coordenador de comunicação da MNCR, Davi Amorim, estima que o dinheiro arrecadado na campanha será destinado a 1,7 mil organizações de catadores do país todo.
“Muita gente está procurando, vindo oferecer ajuda. Isso é positivo. É dessa forma que a gente vai superar esse período. Sabemos que é preciso cobrar dos governos a responsabilidade deles, e estamos fazendo isso. Mas essa rede de apoio e solidariedade é um diferencial neste momento”, agradece Amorim.
O movimento Pimp My Carroça, também de catadores, iniciou um financiamento coletivo para auxiliar três mil trabalhadores autônomos cadastrados no aplicativo Cataki, plataforma criada para conectar os catadores às pessoas que produzem resíduos recicláveis e entulho.
“Estou cheia de material, mas não tenho condição de passar, mas se eu não passo esse material, não recebo nada. Então preciso repassar urgentemente para ter dinheiro para minha família. É através desse material que eu sustento minha casa”, diz a catadora Elismaura Pereira dos Santos, ligada ao projeto.
“É importante ficar em casa, mas teriam que ter pensado nisso antes. O poder público, as organizações que defendem o trabalho dos catadores e catadoras, de ter uma emergência”, reclama Sérgio Bispo, que trabalha na coleta de recicláveis no centro de São Paulo.
Para o grafiteiro Mundano, idealizador do Pimp My Carroça, ajudar os catadores é, além de tudo, um ato de gratidão.
“O trabalho dos profissionais da reciclagem sempre beneficiou a todos nós. Por isso, eu considero extremamente covarde a postura de, especialmente nesse momento, a gente cruzar os braços e se conformar com nossos privilégios. É hora de demonstrar solidariedade com quem mais faz pela reciclagem e pelo meio ambiente no Brasil”.
Como ajudar
Unicab: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/fundo-de-emergencia-para-ambulantes-crise-coronavirus
Cooperativas de SP: https://benfeitoria.com/cooperativassp
Pimp My Carroça: https://www.catarse.me/renda_minima_catadores
MNCR: https://solidariedadeaoscatadores.com.br/