Mijão esquerdomacho

Foto: TanteTati / Pixabay

Por Désceo Machado, para Desacato.info.

Naquele carnaval o encontrei. Um beijo alegre e molhado no maracatu. Volúpia, desejo, tato e sexo sem culpa. Entrega mútua. Na noite seguinte saímos para enlouquecer juntos. Há melhor maneira de conhecer alguém do que o ver bêbado, com os diabinhos à solta? Ver por debaixo do politicamente correto, atrás da carapaça progressista. Na verdade não esperava encontrar mais do que um esquerdomacho típico.

E tudo seguia sem nenhum incidente. Embora ele desse um tchauzinho pro seu superego, nenhuma cena de ciúmes, dancei despreocupada com outros homens, estive abraçada com um amigo do mestrado, que não era gay, risos.  E aquele bom pedaço de homem ali, com um sorriso aberto a minha espera…

Mas, na saída ele pediu que esperasse e, defronte a um estacionamento, sem muita cerimônia, entre como quem disfarça e quem age com naturalidade, puxou seu pau pra fora e começou a mijar na mureta. Eu, cheia de vergonha feminina, olhei para os lados para ver se havia alguém olhando. Lembrei de uma conversa com uma amiga que não permitia que o filho mijasse de pé: “O ser humano, nas condições higiênicas em que vive, deve urinar sentado, além do que isso é mais um aspecto da igualdade a ser alcançada entre os gêneros”.

Nisso o homem que cuidava do estacionamento, vendo o mijão de pau de fora, veio como um touro em nossa direção. Aos gritos de “sem-vergonha, tem crianças passando” deu uma bofetada no peito do mijão e aos empurrões e ameaças o afastou dali, comigo ao seu lado. Segui com ele a passos embriagados digerindo a cena. Não houve qualquer reação de meu arlequim, por covardia ou bom senso, continuou feliz ao meu lado, se gabando do resultado relativamente favorável, tudo podia ter sido pior.

Se fosse uma mulher mijando, flagrada por um homem, a tomariam por puta e estaria sujeita a violência sexual. Se uma mulher fosse flagrada por outra, haveria no máximo um certo receio de sofrer algum respingo. Com os homens, o que está em jogo é o poder do falo. Que ameaça era aquela de alguém colocar o pau para fora e marcar um território vigiado por outrem? Briga de cachorros, ofensa a territórios.

Quanta transgressão no vídeo postado pelo capitão. O prazer de ser mijado, em renúncia à luta entre falos. Fiquei imaginando a cena do esquerdomacho mijando e sendo mijado pelo, vá lá, direitomacho, risos. No auge da cachaça, o que pôde esse homem mole, esse gênero masculino que nós feministas estamos ajudando a construir, decalcado da violência viril, no auge de sua liberação alcoólica, mostrou-me um xixizinho envergonhável!

Désceo Machado é repórter em Florianópolis.

A opinião do autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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