México: o desastre neoliberal que nos inspira

Por Marcelo Manzano.

Desde que a doutrina neoliberal se espalhou pela América Latina, o México foi provavelmente o país que mais profundamente embarcou no canto da sereia que emanava de Washington. Apostou tudo na liberalização comercial, privatizou empresas e serviços públicos e abriu suas porteiras para o regozijo dos grupos financeiros internacionais.

Depois do colapso cambial que solapou o país em 1994/1995, os mexicanos dobraram a aposta, entregando suas reservas petrolíferas às grandes companhias do vizinho ao Norte e rebaixando os padrões de regulação do mercado de trabalho a fim de atrair maiores fluxos capital externo para seu terreiro.

Nada disso adiantou. Nos anos 2000, o México assistiu na rabeira os seus vizinhos de América Latina avançarem, tanto em termos de crescimento do PIB quanto de progresso social. Ao mesmo tempo em que as empresas maquiladoras do norte do país intensificavam o comércio com os EUA – muitas vezes servindo de mero entreposto para produtos da China – o fosso social se ampliava no território mexicano, com o crime organizado e o narcotráfico tomando conta de regiões inteiras do país e se infiltrando pelas instituições políticas.

O retrocesso pode ser visto à toda parte. A despeito de um povo vibrante e de sua cultura tão rica quanto original, o México pós-neoliberalismo talvez seja o retrato mais dramático do que essa doutrina é capaz de produzir.

Apenas a título de exemplo, vale mencionar alguns dos muitos dados que constam de estudo elaborado pelo Centro de Analisis Multidiciplinario da UNAM (leia aqui) a respeito da deterioração do mercado de trabalho e das condições de vida naquele país.

Entre 1987 e 2016 o valor do salário mínimo caiu 79%, levando 32 milhões de trabalhadores mexicanos (60% da PEA) à condição de miséria, isto é, sem renda suficiente para adquirir a cesta básica (cesta de alimentos recomendável). No mesmo período, para cada um peso adicional na renda nominal dos trabalhadores, a cesta básica subia 5 pesos. Consequentemente, enquanto em 1987 o trabalhador de renda média precisava de 4 horas e 53 minutos de trabalho para adquirir a cesta básica diária, em 2007 já eram necessárias 15 horas e 55 minutos e em 2016 ele já teria que trabalhar praticamente durante todas as horas do dia (23 horas e 38 minutos) para conseguir a mesma cesta básica (veja quadro abaixo).

Diante de tamanha calamidade, difícil dizer o que é mais trágico. O prolongado esfacelamento de uma nação vigorosa como o México ou a insistência de muitas nações latino-americanas de perseguir tardiamente o mesmo roteiro rumo ao desastre.

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