Manifestantes fecham Extra em SP durante protesto contra a morte de Pedro Gonzaga

Mais de 700 pessoas cercaram o estabelecimento provocando a interrupção das operações

Foto: Mídia Ninja

Por Semayat Oliveira.

O supermercado Extra, localizado na Av. Brigadeiro Luís Antônio, centro de São Paulo (SP), fechou por pelo menos três horas no domingo (17). A loja, que funciona 24h, não enfrentou as centenas de pessoas que se reuniram em frente ao comércio. O objetivo: protestar contra a morte de Pedro Gonzaga, 19, assassinado por estrangulamento na quinta-feira (14) em uma unidade da mesma marca no Rio de Janeiro.

Pedro foi enterrado sábado (16) no Cemitério Jardim da Saudade, na Zona Oeste do Rio. Dinalva Oliveira, a mãe, que presenciou a morte do filho, não teve condições emocionais de comparecer. Davi Ricardo Moreira Amâncio, 31, o segurança que asfixiou o jovem, foi preso em flagrante e liberado logo depois. Ele pagou uma fiança de R$ 10 mil e deve responder por homicídio culposo, quando não há intenção de matar.

Após a notícia da morte, pessoas se mobilizaram nas redes sociais pedindo um boicote à rede de supermercados. Manifestações simultâneas aconteceram na Barra da Tijuca, no Rio, e em outras cidades como Recife (PE), Belo Horizonte (MG) e Campo Grande (MS). Em São Paulo (SP), a concentração começou às 14h. Mais de 700 pessoas cercaram o estabelecimento provocando a interrupção das operações.

Segundo os participantes, o hipermercado tinha se preparado para o ato e aumentado o contingente de seguranças. A polícia também estava presente no estacionamento do local e nos arredores da avenida, que foi completamente bloqueada em alguns momentos. Um funcionário chegou a dialogar com os manifestantes, mas não houve acordo e nem recuo.

“Essas instituições racistas não tem que ver o nosso dinheiro”, disse Mônica Seixas, deputada estadual do mandato coletivo da Bancada Ativista, eleita em 2018. “O capital vem matando corpos pretos, a gente precisa se fortalecer e construir novas formas de existir”, completou.

Violência

Em 2018, o GPA, grupo que controla marcas como Pão de Açúcar, Extra, Assaí e Casas Bahia, faturou R$ 53,6 bilhões. A empresa tem pelo menos 669 mercados alimentícios em funcionamento e não é a primeira vez que suas lojas são palco de violência contra pessoas negras. Em 2017, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) multou o Extra em R$ 458 mil após uma criança de 10 anos ter sido ofendida e acusada de roubo.

O pronunciamento oficial divulgado nas redes sociais do Extra afirmou que os seguranças envolvidos foram “definitivamente afastados das operações” e que “a companhia se solidariza com os familiares de Pedro”. Como resposta, manifestantes levaram cartazes questionando “qual será o próximo negro a virar nota oficial?” e destacando que “desculpas não resolvem o racismo”.

Enquanto alguns presentes pediam que a multidão saísse da rua e adentrasse o estacionamento da loja, outros queriam evitar um possível conflito com os seguranças e policiais. “Não vai ter sangue preto aqui hoje. Não queremos que nenhum dos nossos seja agredido”, alguém gritou. Houve acordo e todos permaneceram na parte de fora, até que uma nova tensão aconteceu.

Os policiais que limitavam a descida dos manifestantes pela avenida ameaçaram a atirar balas de borracha. Em uma tentativa de diálogo, Douglas Belchior, ativista e liderança da Uneafro Brasil, foi contido pelos oficiais. “Eu fui conversar e dizer que não era preciso, que não íamos descer, aí eles disseram: ‘então vamos te prender aqui’”, explicou Belchior. Ele foi liberado minutos depois, após protestos e gritos exigindo que o liberassem.

Nesse momento, parte significativa dos manifestantes seguiu em marcha para a Avenida Paulista. O ato encerrou pacificamente próximo ao MASP. Mas dezenas de pessoas não saíram do Extra e ali permaneceram para garantir que o estabelecimento não voltasse a abrir, com o objetivo de prejudicar as vendas da loja o máximo possível. Os policiais também ficaram. Novas discussão e ameaças aconteceram.

“Vocês sabiam que mais de 60 mil pessoas morrem no Brasil? E vocês aí por causa de uma morte”, disse um oficial. “E você sabia que a maioria dessas mortes são de pessoas negras?’, alguém gritou em resposta.

Estrutural

Erica Ribeiro, atriz e digital influencer, foi uma das pessoas permaneceu no local. Pra ela, o fechamento da loja é desproporcional diante da perda de uma vida, mas é uma resposta significativa. “Esse estabelecimento faz parte de uma rede gigantesca. A gente não abalou a estrutura, mas mexemos em um dos alicerces deles, que é o bolso. E enquanto mexermos nesse capital, os atingiremos. Pode ser por 2h ou 3h, mas temos que fazer isso sempre, de forma contínua”, disse.

Para Jesus dos Santos, deputado estadual eleito no mandato coletivo da Bancada Ativista, é fundamental reforçar que este caso não é isolado. Ele lembrou que há quase dois anos ele estava na porta de uma unidade do Habib’s, em São Paulo, para protestar contra a morte de João Victor Souza Carvalho, 13, que morreu após ser agredido por seguranças.

Em sua opinião, as manifestações podem ser ainda mais potentes. “Parte da população ainda não se enxerga como preta. Afinal, as políticas de embranquecimento continuam de forma exaustiva. Quem já se entende como negra, como negro e atua contra o racismo tem fomentado a formação política do nosso povo para que essa compreensão seja ampliada”, disse.

O ato encerrou por volta das 18h. Todas e todos saíram juntos como forma de proteção.

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