Foto: Leo Couto/Divulgação

Do interior paulista, Paranga segue com shows apoiados na densa obra do maestro

Festas, Fogos, Para-Raio é o nome do último álbum do grupo Paranga, lançado este ano e gravado ao vivo em sua terra natal, São Luiz do Paraitinga (SP), durante a tradicional festa do Divino Espírito Santo.

O repertório abrange canções desde o primeiro trabalho da banda, o clássico Chora Viola Canta Coração (1983). Das 15 faixas desse novo disco, 10 são de Elpídio dos Santos (1909-1970), luizense que deixou vasta obra de diversos ritmos, além de ter suas músicas registradas nos filmes de Mazzaropi.

Desde o início dos anos 1980, quando o Paranga chegou a São Paulo para se apresentar no Teatro Lira Paulistana, palco principal do movimento da Vanguarda Paulista, foi logo chamado de big band caipira pelo grande número de componentes e sua origem. O repertório do grupo tinha como referência a magistral obra de Elpídio dos Santos.

Cinco filhos (dos sete) do maestro nascido em São Luiz passaram pela banda ao longo de sua história, além de outros talentosos músicos, como os irmãos Galvão Frade e Nhô Frade, e Marco Rio Branco e Thar.

Compunha o grupo violas e violões, percussão e metais, coro com mulheres vestidas de roupa de chita, numa junção de música caipira, toques de fanfarra e elementos modernos adotados no mundo da música alternativa daquela ocasião.

De lá para cá, foram lançados pelo Paranga cinco álbuns e dois DVDs, contando este último. A formação mudou assim como a instrumentação, principalmente com a saída dos sopros.

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A gravação de Festas, Fogos, Para-Raio teve como integrantes Negão dos Santos (único filho de Elpídio na banda hoje), Renata Marques, Lia Marques (vozes e mulher e filha do Negão, respectivamente), João Gaspar (violão e guitarra), Nhô Frade (percussão) e Matheus Pé (baixo).

Folia de Reis

Negão dos Santos, compositor, arranjador e líder do Paranga desde 1993, quando seu irmão Pio faleceu, é exímio violonista tanto nas seis cordas de nylon como nas 12 de aço.

Conta ele que o grupo chegou a ter 18 músicos, mas isso se mostrou inviável ao longo do tempo em termos de custo e logística, e o Paranga voltou às origens, na década de 1970, quando os então jovens caipiras se reuniam em bares para cantar com instrumentos de cordas, incluindo a viola, símbolo da cultura rural.

“O Galvão (Frade) disse que estava fazendo em Catuçaba (distrito de São Luiz do Paraitinga) a Folia de Reis. Então fomos atrás”, lembra Negão.

“Chegando lá encontramos o Mestre Luiz (já falecido). Ele pegou a viola que estava pendurada na parede de sua casa, que não devia trocar as cordas há uns 10 anos. Quando ele bateu a mão (nas cordas da viola) as lágrimas começaram a escorrer do meu rosto…”

Foi nesse ambiente, onde os violeiros iam às portas das casas na Folia de Reis para tocar para as pessoas (tradição popular cada vez mais escassa na roça), que os membros do Paranga foram entendo melhor aquilo que Elpídio dos Santos traduzia em suas músicas.

“Música é sentimento. O calibre é o pelo do braço, quando ele se levanta. Claro que partitura favorece, mas não é a história. O violeiro toca pelo coração”, ressalta o filho de Elpídio, que conheceu ao pé da letra a oralidade e o improviso dos verdadeiros cantadores sertanejos.

Inclusive no LP Chora Viola Canta Coração do Paranga foi registrado uma música do Mestre Luiz de Catuçaba. “Ele nem foi gravar com a gente em São Paulo. Não sabíamos como levá-lo. Ele nunca tinha saído de onde vivia. Tinha ido no máximo a Aparecida (do Norte)”.

Elpídio dos Santos foi um dos poucos mestres da música brasileira a transpor essa manifestação popular à teoria musical. Quando compunha, ele escrevia diretamente a partitura em um pedaço de papel.

As peças de Elpídio vão de valsas, marchas, dobradas, cateretês a sambas, maxixes e choros – aliás, oito choros inéditos foram encontrados recentemente no acervo do maestro e já foram devidamente arranjados por Negão.

O aprimoramento musical de Elpídio foi adquirido com seu pai, que desde criança fazia o filho estudar diversos instrumentos para substituir alguém que se ausentasse da banda de fanfarra formada pela família.

Falta intercâmbio

Naqueles tempos, o intercâmbio foi fundamental para o Paranga tornar a sua música regional pop conhecida e reconhecida além do Vale do Paraíba paulista, onde fica São Luiz do Paraitinga. O caminho do Paranga foi ir até a capital São Paulo, onde a Vanguarda Paulista fazia história como movimento musical.

“Falta movimento desse tipo. O Lira Paulistana era o porão que juntava coisa boa. Hoje, um movimento qualquer está apenas na internet. Mas a internet é apenas um meio. Onde estão as pessoas?”, indaga Negão dos Santos, em meio à indigência musical que tomou conta dos meios eletrônicos e digitais.

O Paranga continua mantendo as tradições, a memória do genial Elpídio dos Santos e a musicalidade da Vanguarda Paulista. São expressões suficientes para se manter à frente de muita gente.

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