Imigrantes encontram no Brasil maneiras de expressar sua cultura

Por Victor Tineo.

A luta contra preconceitos e estereótipos é uma das motivações de projetos de estrangeiros e refugiados.

Enquanto centenas de pessoas andam apressadas de um lado para o outro no caótico Viaduto Santa Ifigênia, na região central de São Paulo, Hassan Othaman aguarda sentado os primeiros clientes da barraca de comida árabe que ele e amigos abriram há alguns dias. Além do dinheiro necessário para se manterem no país, os refugiados também buscam condições para trazer seus parentes para o Brasil.

Em menos de um mês, este já é o segundo ponto em que Hassan e seus dois companheiros, Abu Thaier e Alaa, vendem seus lanches. No dia 18 de janeiro, eles ofereciam falafel a R$10 na Praça do Patriarca, também na região central. No novo local, o preço continua o mesmo.

Localizada em frente a Igreja de Santa Ifigênia, sua barraca divide espaço com uma barraca de churrasco grego e outra com a tipicamente brasileira tapioca. Sônia e seu neto faziam compras na Rua 25 de Março e aproveitaram o caminho para comer um lanche. Escolheram a barraca árabe por curiosidade e provaram pela primeira vez ofalafel e gostaram.

Cotidiano

Há quatro meses no Brasil, Hassan vive em um prédio no bairro da Liberdade, a ocupação Leila Khaled, organizada pelos movimentos Terra Livre e MOP@T (Movimento Palestina Livre Para Tod@s).

O local, que homenageia a militante da Frente Popular para a Libertação da Palestina de mesmo nome, é a casa de Hassan, de seus colegas de trabalho e de vários outros refugiados. Um deles é seu primo, Rami Othaman, cabeleireiro, que faz cortes masculinos na própria ocupação.

Com o português ainda tímido, o palestino Rami prefere se comunicar em inglês, língua que aprendeu enquanto morava na Síria, país que viveu a maior parte de sua vida antes de vir, há três meses, para o Brasil, onde diz se sentir bem acolhido.

Rami é crítico dos Estados Unidos da América e afirma que os problemas em seu país [Síria] são causados pela influência das tropas norte-americanas.

Sorridente, conversa sobre vários assuntos enquanto corta o cabelo de seu cliente, seja religião, política, sua história de vida ou até mesmo sobre futebol, que assim como aqui, é um dos principais esportes do país. Neste ano, o campeonato nacional funciona em somente três cidades. A seleção síria participará das Olimpíadas no Rio de Janeiro, neste ano.

Solidariedade

No dia 29 de novembro do último ano, os membros da ocupação participaram de um jogo contra o time do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no campo da Escola Nacional Florestan Fernandes.

Apesar da difícil comunicação, os moradores da ocupação tentam conversar com as poucas palavras que sabem do português e oferecerem esfihas e chás para os clientes. 

Sobre os negócios, Rami e Hassan afirmam que graças a divulgação feita pela página de Facebook da ocupação, os atendimentos e vendas da barraca cresceram bastante.

Literatura

Victor Gonzales é peruano e mora em São Paulo. Formado em letras, é tradutor e sempre fez trocas literárias com amigos brasileiros. 

Para difundir o tema, ele e mais três amigos começaram o projeto Ecos Latinos, que busca difundir a literatura latino-americana dos países de língua espanhola. Cada um representa um país (Bolívia, Equador, Paraguai e Peru) e através de intervenções artísticas e sarais buscam quebrar estereótipos e fortalecer as culturas dos povos imigrantes no Brasil.

“Nós fizemos uma intervenção em uma escola que tem muitas crianças imigrantes, foi uma forma de fortalecer a cultura deles e mostrar para os coleguinhas deles a cultura dessas crianças”, conta o peruano, que afirma existirem muitos estereótipos com os povos latino-americanos.

“Mostrar essa riqueza pode acabar com o preconceito. Existe muito bullying nas escolas por causa desses estereótipo, por exemplo, falar que todo paraguaio é contrabandista”, explica. Contra os preconceitos, ele acredita que expor a cultura do país pode melhorar a relação entre os países, “É marcante ver o sorriso das crianças imigrantes e a admiração dos coleguinhas delas. Algumas dizendo ‘Ah, isso é do país do meu pai e isso na cidade da minha mãe’, ou outras dizendo ‘não sabia que tinha tudo isso no seu país’. É muito bom”, contou.

Gonzales explica que há mais comunicação literária do Brasil com a Europa e os Estados Unidos, mas pouco com os países vizinhos. A escolha da literatura foi pensada em uma nova forma de difundir as culturas latino-americanas pelo país: “existem grupos que trabalham com alimentação latina, outros com as danças e nós tentamos mostrar outro lado da produção dos países, através da literatura”.

Além dos saraus, das participações em escolas e feiras latino-americanas, o projeto pretende publicar anualmente um livro. Neste ano, como extensão do trabalho que fizeram em 2015, estão editando o primeiro volume de um livro de poesias. Para o fim deste ano, pretendem lançar um livro de contos latino-americanos.

Imigração e refúgio

Segundo dados do Alto Comissáriado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), o número de refugiados e deslocados forçados até 2014 era o maior desde a Segunda Guerra Mundial, com 59,5 milhões de pessoas afetadas em todo o mundo.

O país com o maior número de registros é a Síria, tanto de deslocados internos (7,6 milhões de pessoas) quanto de refugiados (3,88 milhões). Em seguida estão Afeganistão (2,59 milhões de refugiados) e Somália (1,1 milhão de refugiados).

A mesma pesquisa mostra que os países e regiões em desenvolvimento acolhiam 86% dos refugiados no mundo em 2014.

Em 2014, 90% dos refugiados que entraram no Brasil eram homens, sendo apenas 4% criança., Neste mesmo ano, Senegal, Nigéria, Síria e Gana somaram 4910, dos 8302 pedidos de refúgio no Brasil. Até março do último ano, o Brasil tinha 1.847.274 imigrantes regulares no Brasil. Os dados da Polícia Federal apontam que 4.842 são refugiados.

Foto: Reprodução/Brasil de Fato

Fonte: Brasil de Fato

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