Ida: um filme sobre escolhas possíveis

A vida, como um filme, é uma sequência de cenas enclausuradas numa sequência de escolhas. Talvez, na vida, as escolhas sejam menos planejadas que no cinema. Mas, esse repete aquela, evidentemente porque é ele próprio produto da vida humana.

Por Clarissa Peixoto

As escolhas me parecem o cerne do filme Ida, de Pawel Pawlikowski, que se passa na Polônia e narra a história da noviça Anna, prestes a celebrar votos de castidade. Antes de seu juramento definitivo, a jovem é incentivada a conhecer a única familiar viva, sua tia Wanda.

No pano de fundo, a Polônia do regime comunista pós-guerra e os seus impactos no tempo, no espaço, nas pessoas. Por outro lado, um filme que trata das decisões tomadas pelo indivíduo diante da realidade objetiva que se impõe.

O encontro de tia e sobrinha é frio. Wanda revela a Anna que seu nome verdadeiro é Ida e que pertencem a uma família judia, assassinada pelo nazismo durante a guerra. Wanda é uma mulher a frente de seu tempo, dedicada a vida coletiva, mas solitária e infeliz. Sua personalidade entra em choque contínuo com a de Ida, uma jovem que passou toda a vida na clausura de um convento e que acredita na fé religiosa.

Tia e sobrinha saem em viagem para encontrar o local onde foram sepultados os pais de Ida. Durante essa busca, é possível reconhecer a fragilidade da cética Wanda em detrimento da inconteste resignação de Ida. São mulheres que compartilham dores silenciosas, em medida que buscam uma verdade particular. Um processo que revela certezas à Wanda, enquanto promove dúvidas à Ida. Ao mesmo tempo, Wanda se completa na indiferença e Ida renova convicções.

Wanda é o produto das suas próprias escolhas, enquanto nela também estão presentes os elementos de um mundo pós-guerra violento, que deixa marcas profundas no indivíduo. Ida é o produto de uma realidade trágica, se vendo diante do poder das próprias decisões.

Ida é um filme de uma beleza triste, de uma melancolia esperançosa. Um grande ensaio fotográfico em preto e branco, apostando numa estética que promove as sensações das próprias personagens em quem o assiste. Um filme de escolhas inevitáveis, de identidade contemporânea, sintetizando a luta entre as forças do mundo e as forças de dentro.

Ida é sem dúvida, poesia da lástima, esperança tristonha. Ida é o amor camuflado, diante do vazio e da dor. Ida fala de decisões, nem sempre independentes. Ida fala de mulheres e das suas escolhas possíveis, diante de um mundo de insólita amargura.

Imagem: Hoje vivi um filme

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