Hotel parcialmente demolido na Cracolândia tem história e foi tema de documentário

Por Milena Buarque.

“A oportunidade de ter dado uma chance pra poder entrar e de começar tudo de novo. Foi daí que eu diminuí bastante a droga. E hoje eu não fico sem dormir mais”, diz a jovem Angélica Alves, de dentro do famoso Hotel Laid, uma das mais importantes pensões sociais da região da Cracolândia, conhecida por abrigar dependentes químicos e auxiliar na política de redução de danos para os usuários de crack. Hoje (23/5), no Largo Coração de Jesus, uma parte do hotel foi demolida. Perto dali, a demolição de um imóvel com gente dentro deixou três pessoas feridas.

No início de março, um incêndio de causas desconhecidas atingiu e destruiu boa parte do imóvel, que era parceiro do programa Braços Abertos, projeto de reinserção social de dependentes químicos da região da Luz, criado pela gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT). O local, que teve a fachada tombada pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) em 2013, virou tema do documentário Hotel Laíde, lançado no último sábado (20/5), na Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

Atualização em 24/5, às 16h45 – A equipe da prefeitura responsável pelas demolições na região derrubou ontem uma parede na parte de trás do imóvel, segundo o testemunho de Raphael Escobar, militante da Craco Resiste.

Sobre isso, a assessoria de imprensa da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo afirma: ‘Diferentemente do que foi informado na matéria, o Condephaat esclarece que o Hotel Laid, cuja fachada é tombada pelo órgão, não foi demolido. A informação foi confirmada por técnicos da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico (UPPH), braço técnico e executivo do Condephaat na Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, que estiveram no local na manhã desta quarta-feira, 24’.

Dirigido pela antropóloga, pesquisadora e documentarista Debora Diniz, o filme acompanha a chegada de Angélica Alves, de 24 anos, à pensão, depois de mais de 15 anos vivendo na rua. “A mudança não é de dentro de um laboratório que você arruma, é de dentro de si próprio”, reconhece a jovem, cuja primeira internação havia sido aos 17 anos de idade.

Cena do filme “Hotel Laíde”

Além de ser um importante testemunho sobre a urgência da resistência de uma política de redução de danos, o documentário registra os impactos da mudança na vida de Angélica um ano após a sua chegada ao sobrado. “Esse já foi um primeiro passo. Arrumei um canto para dormir, um serviço para poder me dar algo. Foi daí que consegui mudar, diminuir bastante das drogas. Parei de ficar na rua, parei de fazer programa.”

A dinâmica no hotel era permeada por regras de convivência. Brenda Bracho, que recebe Angélica, solta a lista: cama sempre arrumada, nada de entrar nos quartos dos outros, nada de fumar em espaço coletivo e mínimo de um banho por dia. “Aqui é residência, é um lar. É família, entendeu?”, diz Brenda, afirmando ter sido um “zumbi” antes da acolhida de Dona Laide.

A vida poderia não ser um conto de fada, como diz Angélica em uma das cenas do documentário, mas o Hotel Laid era casa. O que, para muitos, era um enorme começo.

No último domingo, uma megaoperação policial, comandada pelo Denarc (Departamento de Narcóticos) e membros da GCM (Guarda Civil Metropolitana), além de desmontar o chamado “fluxo” da Cracolândia – ponto de compra, venda e consumo da droga –, deu o ponto de partida à demolição de hotéis e pensões na região.

Fonte: Ponte.org

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