Grafites de Carolina Itzá expõem a experiência cotidiana das mulheres periféricas

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Carolina é artista visual e moradora do Campo Limpo (Foto: Reprodução)

A artista visual Carolina Teixeira, tem 33 anos, assina suas obras como “Itzá” e é moradora do bairro Campo Limpo, na zona sul de São Paulo. Até o dia 31 de março, Carolina expõe na Oficina Cultural Alfredo Volpi, na zona leste a mostra “Peles da Cidade”, que apresenta percepções sobre a corporalidade feminina e a ocupação do espaço urbano por meio do grafite. As potências e florescimentos, encruzilhadas e espinhos da experiência cotidiana das mulheres periféricas são geradores das imagens e palavras que compõem a exposição.

Itzá conheceu o grafite na época da escola. “Comecei na adolescência, pixando com o povo da escola. Nem sabia ainda o que era feminismo mas fizemos uma crew só de minas na época ‘The Flapper’s’, que quer dizer ‘As garotas’ ou algo assim. Não nos sentíamos à vontade de pintar com os manos nessa época. Ao invés de estudar ficava desenhando nas carteiras, matava aula para pixar. O primeiro muro que grafitei sozinha faz, se bem me lembro, uns 10 anos”, relembra a artista, que atua como ilustradora, educadora.

Carolina conversou com o Nós, mulheres da Periferia sobre feminismo, arte e trabalho. Confira!

Nós, Mulheres: Para começar, quais mulheres são suas grandes inspiradoras para criar?

Carolina Itzá: Minhas referências são em grande parte, da América Latina. Elas são minhas referências por terem aberto os caminhos e que respeito muito os passos são Ana Clara (Maçãs Podres), Nene Surreal, Coletiva Mujeres Creando da Bolívia, Rizca. Também acompanho o trampo da mulherada à minha volta, muitas hermanas são bastante referência para mim. As muralistas do México, Bolívia, Colômbia, Chile, Peru, Argentina e a artista Swoon me influenciam muito também.

Nós, Mulheres: Você se considera feminista? Para você o que é ser mulher na periferia?

Carolina Itzá: Me considero feminista, mas esse não é um lugar sem conflitos. Feminismo é uma palavra construída que por diversas vezes já excluiu as mulheres periféricas do debate. Então me considero feminista pois reconheço a luta das mulheres historicamente, mas não tenho dificuldade de construir uma outra palavra para nosso processo de resistência, se for necessário. O principal, acho, é estar sempre em movimento, atenta às contradições do caminho e de olho na experiência que temos no nosso dia-a-dia, que é daí que parte nossa ação política.

Nós, Mulheres: Como as pessoas recebem seu trabalho ? Você já sofreu preconceito por retratar nudez, úteros?
Carolina Itzá: Meu primeiro grafite foi há 10 anos e foi censurado. Eu tinha feito três mulheres com facas e panelas na mão, escrito “Destruidoras de Lares”. Esse desenho foi um retrato meu e das minhas amigas, a gente fazia comida pra vender pra fora e nessa época eu tinha acabado de entrar na faculdade, estava pensando: “Escapei de ser mulher de alguém”. Então foram lá e apagaram, porque era muito “violento”. Mas como desenho úteros, direto eles são prontamente apagados, o povo confunde com pornografia ou têm uma relação ruim mesmo com a imagem. Comecei a fazer os úteros na rua por isso mesmo. Não foi pra dizer: MULHER = ÚTERO, essencializar o feminino. Mas que esse é um lugar chave pra entender como nosso corpo é vulnerabilizado na sociedade, não há dúvidas.

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Carolina Itzá desenha úteros e comenta que são prontamente apagados, pois as pessoas confundem com pornografia ou têm uma relação ruim com a imagem (Foto: Reprodução)

Nós, Mulheres: Quais desafios você enfrenta como mulher e artista visual no seu dia a dia?

Carolina Itzá: No grafite você tem que enfrentar os riscos de ocupar a rua, coisa que é difícil para qualquer mulher. O ateliê que faço parte, a Goma, das 10 pessoas que frequentam, eu sou a única mulher. Já fui assediada no caminho e sempre fico ligeira para andar por ali. Sei que os manos não precisam passar por esse medo, e pra mim é difícil mostrar essa fragilidade porque já é uma batalha se impor como artista. As dificuldades vêm desde caminhar até meu ateliê, até as inseguranças com o próprio trabalho. A maioria das mulheres que ocupam o espaço público têm muitas inseguranças, porque fomos criadas por todo um sistema patriarcal para sermos tímidas com nossas criações. Esse peso é uma coisa que gera bastante sofrimento pra mim. Fora as vezes que nossa luz é roubada, quando temos uma ideia e os manos levam crédito.

Não deixe de ir!
Peles da Cidade
Oficina Cultural Alfredo Volpi
Rua Américo Salvador Novelli, 416 – Itaquera
Visitação até 31 de março
Terça a quinta-Feira das 13h às 22h
Sexta-feira e sábado das 10h às 18h

Fonte: Nós, mulheres da periferia.

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