Frei Sérgio: ‘O que não queríamos no Império se preservou no Judiciário. Precisamos enfrentar essa casta’

Frei Sérgio saiu de Brasília com uma visão “muito dura” sobre o que viu no STF: “perderam a sensibilidade humana”. (Foto: Joana Berwanger/Sul21)

Por Marco Weissheimer.

Pela quinta vez em sua vida, Frei Sérgio Antonio Görgen adotou a greve de fome como uma forma de luta e de protesto. Desta vez, o frade franciscano e integrante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) integrou um grupo de sete militantes de movimentos populares (além dele, Jaime Amorim, Zonália Santos, Rafaela Alves, Luiz Gonzaga, Vilmar Pacífico e Leonardo Soares) que foi a Brasília fazer uma greve de fome cujo alvo de protesto foi o núcleo duro do Judiciário do país, o Supremo Tribunal Federal. A escolha do método da greve de fome para realizar esse protesto foi resultado de uma avaliação política. Frei Sérgio resume a lógica que regeu essa escolha.

“Em toda a sua história no Brasil, o movimento social nunca tinha colocado o Judiciário como centro de suas reivindicações e de sua pressão. Até então, era sempre o Legislativo, o Executivo ou os dois juntos. Agora, foi a primeira vez que as baterias dos movimentos sociais se voltaram para o Judiciário. Escolhemos o método da greve de fome porque ele é um protesto silencioso não ofensivo, mas apelativo. Avaliamos que qualquer outro instrumento de pressão que costumamos adotar para o Executivo ou o Legislativo poderia se voltar contra nós”.

Na chuvosa manhã de sexta-feira (31), Frei Sérgio recebeu o Sul21 na sede provincial dos franciscanos no Rio Grande do Sul, na zona sul de Porto Alegre, para fazer um balanço da greve de fome de 26 dias, a mais longa da qual já participou. Ele considera que o protesto cumpriu o papel a que se propunha: sensibilizar a população, confrontar o Judiciário e demonstrar que ele é o responsável principal pelo que esta acontecendo no país e pela continuidade do golpe. O frade franciscano saiu de Brasília com uma visão que define como “muito dura” sobre a experiência que teve no STF e sobre o papel que o Judiciário desempenha hoje no país:

“O que não queríamos no Império se preservou no Judiciário. Um dos motivos que nos levou a criar a República hoje se preserva no Judiciário. Temos um grupo de famílias que se reproduzem lá dentro. Um exemplo disso é o desembargador Thompson Flores, presidente do TRF4. Temos aí uma relação de pai para filho que vem desde o golpe de 1964 e vai mais para trás ainda. O bisavô de Thompson Flores chefiou as últimas expedições para destruir Canudos. É uma família de elite anti-povo. Precisamos enfrentar essa casta”.

Sul21Esta foi a sua quinta greve fome. Ela teve um elemento novo, que foi o questionamento do papel que o STF vem desempenhando no país. Neste período de 26 dias de greve de fome, como avalia o contato que vocês tiveram com o Supremo Tribunal Federal e alguns de seus ministros?

Frei Sérgio Görgen: Esta foi a minha quinta greve de fome e foi a mais longa. Até então, a mais longa da qual eu tinha participado foi uma de 22 dias, em 1992, depois da crise da Praça da Matriz aqui em Porto Alegre, que foi acompanhada por uma onda de violência muito grande. Agora, a questão do Judiciário é uma novidade em todos os sentidos para o movimento social. Em toda a sua história no Brasil, o movimento social nunca tinha colocado o Judiciário como centro de suas reivindicações e de sua pressão. Até então, era sempre o Legislativo, o Executivo ou os dois juntos. Agora, foi a primeira vez que as baterias dos movimentos sociais se voltaram para o Judiciário. Mais do que isso, se voltaram para o núcleo duro das decisões judiciais e da capa de proteção do Judiciário. A nossa pressão foi dirigida ao STF, mais especificamente a seis ministros e ministras que votaram contra o habeas corpus para Lula.

Escolhemos o método da greve de fome porque ele é um protesto silencioso não ofensivo, mas apelativo. Avaliamos que qualquer outro instrumento de pressão que costumamos adotar para o Executivo ou o Legislativo poderia se voltar contra nós. Além disso, vínhamos avaliando, desde março, que os métodos tradicionalmente eficazes quando o Judiciário não está cooptado por uma ideologia política não estavam mais fazendo efeito. A gota d’água foi o que ocorreu no dia 8 de julho, que ainda entrará para a história como o maior escândalo do judiciário brasileiro. Uma decisão de um desembargador de plantão, que poderia ser questionada ou mesmo revertida, foi desrespeitada. Houve quebra de hierarquia, juiz em férias entrando no processo e demandando o que não tinha autoridade para demandar, e outros desembargadores entrando em ação para desautorizar o desembargador plantonista que tinha poder efetivo naquele momento.

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