Francisco Julião

Por Clóvis Campêlo.

“Operário sem pão / camponês sem terra / panela vazia / tambor de revolução. / Viva a reforma agrária radical / com Francisco Julião.”

Estes são versos de uma antiga canção lembrada pelo povo do Engenho Galiléia, em Vitória de Santo Antão, cidade pernambucana que se tornou símbolo da luta pela terra no Brasil.

Mas, afinal, em poucas palavras, quem foi esse homem que nasceu em 1915, na cidade de Bom Jardim, no Agreste pernambucano, transitou com desenvoltura pelos engenhos e usinas úmidos da Zona da Mata do Estado e foi morrer, em 1999, na pequena cidade de Cuernavaca, no México?

Julião nasceu numa tradicional família de proprietários de terra. Estudou na Faculdade de Direito do Recife, graduando-se em 1939. Foi professor, diretor de colégio e escreveu um livro, Cachaça, antes de se eleger deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro, em 1954. Neste mesmo ano, atendendo a um convite dos camponeses do Engenho Galiléia, tornou-se advogado das Ligas Camponesas, ajudando o movimento a se ampliar e se consolidar, segundo ele, sempre dentro da lei e da ordem.

Em 1962, após dois mandatos como deputado estadual pelo PSB, foi eleito deputado federal pelo mesmo partido. Em 1964, com o golpe militar e a instalação da ditadura no país, foi cassado, indo se asilar no México, onde ficou até 1979.

Com a anistia política, voltou ao Brasil e se filiou ao Partido Democrático Trabalhista (PDT) do amigo Leonel Bizola. Em 1988, ainda tentou ser eleito deputado federal pelo PDT, sendo derrotado. Em 1997, retornou mais uma vez ao México com a intenção de escrever suas memórias. Morreu de enfarte, em Cuernavaca, no dia 10 de julho de 1999.

Segundo Julião, a primeira Liga foi a do Engenho Galiléia, fundada em 1º de janeiro de 1955 e que se chamava Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco.

Ainda segundo ele, o nascimento da Liga coincidiu com a chegada de Juscelino Kubitschec ao poder, com suas propostas desenvolvimentista criando uma euforia na burguesia nacional para quebrar os latifúndios e criar indústrias de transformação, o que favoreceu ao movimento pela reforma agrária.

Ironicamente, as Ligas começaram a perder força a partir de 1962, depois que presidente João Goulart decretou a sindicalização rural, até então inexistente no Brasil, no I Congresso Camponês de Minas Gerais.

Foi esse homem fantástico, que conviveu lado a lado com os grandes protagonistas da história mundial no século XX, como Fidel Castro e Che Guevara, e que chegou a causar preocupações ao homem mais poderoso do planeta na época, o presidente americano John Kenedy, que tive a honra de fotografar em 1992, no apartamento de um dos seus filhos, no bairro de Santo Amaro, no Recife, para o projeto “Escritores Pernambucanos Contemporâneos”, do Grupo 3.

Ao meu lado, estava o escritor José Rodrigues Correia Filho, que fez a entrevista enquanto eu fotografava Julião.

Um homem simples, cordial, discreto e atencioso, com uma certa expressão de cansaço nos olhos, mas sempre com um sorriso franco nos lábios.

Como escritor, além de “Cachaça”, seu primeiro livro editado em 1951, Francisco Julião escreveu “Irmão Juazeiro”, em 1961; “O Que São As Ligas Camponesas”, em 1962; “Até Quarta, Isabela”, em 1965; “Cambão, a Cara Oculta do Brasil”, em 1968, e “Escuta, Camponês”.

Durante o tempo em que esteve preso, foi companheiro de cela de Miguel Arraes, na Fortaleza de Laje, no Rio de Janeiro, e juntos traduziram o livro “A Politização das Massas Através da Propaganda Política”, do russo Sergei Tchakotine.

Recife, 2008

Fotos: Clóvis Campêlo/1992

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