Filmes, séries e livros que celebram a mulher LGBTQ negra

Uma lista de histórias marginalizadas, de “A Cor Púrpura” a “Bessie” que não passaram por nenhum tipo de suavização antes de chegar ao público mainstream

Imagem: Reprodução

Filmes com personagens queer negros são raridade. É como se a cada dez anos mais ou menos algo fosse criado e fizesse as pessoas prestarem atenção, caso de Paris is Burning no começo dos anos 90, Punks nos anos 00, Tangerina Moonlight nos anos 10. No caso de você ser uma mulher negra queer, fica ainda mais difícil encontrar filmes ou literatura que representem esse tipo de amor. É bem mais provável você acabar projetando relações queer nos personagens heterossexuais que acaba encontrando, meio que como decidindo que Whitney Houston e Angela Bassett seriam o casal perfeito em Falando de Amor se só largassem os homens em suas vidas.

O redator da Vulture Alex Jung escreveu sobre estarmos no auge cultural da representação LGBTQ, ainda que com uma condição um tanto quanto manipuladora: em vez de contar estas histórias marginalizadas com a profundidade e nuance do qual necessitam, a grande mídia escolhou tratar tais narrativas sob a vendável noção de que “estas pessoas são como nós”, nós, no caso, os casais hetero. Ao contar histórias queer dentro de uma indústria heteronormativa que idoliza a repetição de clichês e se guia por brancura, não fica difícil entender porque a exploração de relações queer negras do ponto-de-vista feminino parecem tão incompletas ou ainda, invisíveis.

Por mais rara que tais representações sejam, houveram momentos importantes tanto na literatura quanto no cinema de em que mulheres negras queer ficaram sob os holofotes e tiveram suas relações exploradas com radical intimidade e compaixão que as tornaram inesquecíveis. Abaixo, listamos dez representações que merecem sim destaque neste Mês do Orgulho LGBTQ.

A Cor Púrpura

Celie e Shug são duas personagens da verdadeira enciclopédia cultura da vida negra sulista de Alice Walker cuka relação foi uma das mais profundas e reflexivas a dar as caras na literatura. Walker retratou a realidade de seu amor negro — e como este era afetado pelo patriarcado, racismo e violência doméstica. Sem oferecer a visão de um relacionamento perfeito aos leitores com direito a final do tipo felizes para sempre, Walker optou por retratar o romance como a parte calma de uma tempestade sem fim. Porque ser mulher e negra no sul significa não ter folga alguma da violência, mas Celie e Shug conseguiram ao menos um pouco de calma ao optarem por amar uma à outra.

Até as Últimas Consequências

Este é o filme de golpe mais foda de todos — desculpa aí. A camaradagem, lealdade e sonhos compartilhados entre mulheres que só querem o melhor para elas fez deste um clássico e o melhor dos momentos aqui está na relação intensa entre Cleo (interpretada por Queen Latifah) e sua parceira Ursula (interpretada por Samantah MacLachlan). Não lembro de Ursula se comunicar além de um sussurro e um olhar, ainda assim sua presença era o suficiente para assegurar Cleo de que alguém além de seus amigos a amava e cuidava dela. Além do que, o estilo de Ursula era demais. Pô, aquele cabelo curtinho platinado? As argolas douradas? QUERO.

Zami

Nesta obra autobiográfica de Audre Lorde, ela combinou mitos e experiências pessoais para falar das relações que teve com mulheres com base na força, respeito mútuo e luta pela sobrevivência em meio a um país que vivia um clima de racismo e repressão política em meio ao governo McCarthy. Lorde optou por falar de seu amadurecimento através de relacionamentos que teve com as mulheres que acabariam por moldar sua postura política. O livro trata tanto de amor negro entre mulheres quanto do fracasso dos EUA em amar negros.

Rafiki

O primeiro filme queniano a estrear em Cannes foi banido em seu país natal simultaneamente por conta de “sua temática homossexual e intenção clara de promover o lesbianismo no Quênia, assim contrariando a lei” ousa destacar uma relação entre duas mulheres num país em que tal “crime” é passível de punição com até 15 anos na cadeia. Independente do ambiente bruto presente no filme e na realidade que o cerca, as duas protagonistas da película, Kena e Ziki se apaixonam em uma névoa cor de algodão-doce em que todas as cenas são capturadas através de lentes em tons pastel. Para as mulheres queer africanas, este filme centralizou a realidade tênue de suas vidas ao mesmo tempo em que retratou sua existência e fez dela algo reconhecido, com uma mensagem de “nós estamos te vendo”.

Bessie

Este filme biográfico para televisão sobre a lenda do blues Bessie Smith com Queen Latifah no papel principal tocou em vários pontos que afetaram a trajetória da carreira de Bessie. Do racismo à depressão e alcoolismo. A relação de Bessie com Lucille (interpretada por Tika Sumpter) é um dos relacionamentis mais saudáveis que Bessie tem ao longo do filme, Lucille sendo um misto de diferentes mulheres amadas por Bessie na vida real, que se apresentava aberta e orgulhosamente queer. Em uma indústria musical e cinematográfica que sempre acaba tropeçando na representação de pioneiros negros na arte em gêneros roubados pelos brancos, a história de Bessie é uma mudança muito bem-vinda.

Under the Udala Trees

O romance do autor nigeriano Chinelo Okparanta publicado em 2015 conta a história de Ijeoma, uma jovem nigeriana cuja família se separa durante a Guerra Civil da Nigéria. Tendo como pano de fundo o conflito de três anos, livro mostra as conexões que ligam o amor que Ijeoma tem por si mesma, pela garota com a qual se apaixona e um país cuja cultura tradicional encara seu relacionamento com um tabu, com o adendo de uma violência política que lhe impede de ao menos imaginar levar uma vida longa e produtiva. Ao final ela encontra sua paz, mas não antes de nós leitores acompanharmos a jornada empreendida para descobrir o que realmente lhe importa.

Pária

Tendo estreado em Sundance há quase sete anos, Pária retratava um pesadelo muito temido por grande parte das mulheres queer: se apaixonar por uma mulher incapaz de lidar com sua própria homossexualidade, optando por manter o relacionamento um segredo ou negar sua validade. Foi dolorosa ver Pariah aceitar aquela que seria sua primeira rejeição, a segunda vindo de sua mãe. Ao passo em que Pariah sofria com o que estas perdas significavam para ela, foi gratificante vê-la ao final do filme aceitando por completo quem é e aos poucos se apaixonando com cada parte de si mesma.

The Wire

A detetive Kima Greggs foi uma das únicas personagens femininas principais da aclamda série da HBO e o relacionamento com sua parceira Cheryl foi uma das poucas relações queer na TV da época. Em um seriado conhecido por seu retrato realista e duro da pobreza e crime em Baltimorem seria fácil ignorar o fato de que a homossexualidade de Gregg surgiu sem qualquer conflito interno ou antagonismo externo.

Between Women

Esta popular websérie conseguiu criar um nicho inteiramente seu na rede ao lidar com temas pesados como infidelidade e problemas financeiros com sagacidade e humor que atraíram mais de um milhão de visualizações. Em sua quarta temporada, ela continua atraindo público ao passo em que segue fiel à sua audiência principal: mulheres negras queer.

Dirty Computer

O disco/filme aclamado pela crítica de Janelle Monae foi um dos pontos altos da música neste ano. Lançado quase oito anos após TheArchAndroidDirty Computer mistura ficção científica com as vidas de Zen, Che e Jane 57821, operando em meio a um regime totalitário cujo governo apaga as porções das pessoas consideradas defeituosas e “sujas”. O filme/disco tem mais de 45 minutos de pura magia negra queer com moda, cabelos, cores e batidas que celebram a resistência negra queer em um mundo homofóbico e racista.

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