Fascismo nos Estados Unidos? O Caso do Tea Party

b_374_480_16777215_00_archivos_Administradores_Maurício_2013-12_011213_palin-wrapped-in-the-flagPor Vicenç Navarro.

Quando vemos as características e a actuação prática do actual poder nos EUA, pode custar a crer que haja sectores da direita norte-americana que se lhe oponham de forma radical.

Mas existem, como sucede com a extrema-direita organizada no Tea Party, cujos membros estão na sua maioria convencidos de que Obama quer instaurar o socialismo nos EUA.

Existe uma percepção generalizada nos maiores meios de informação espanhola de que o Tea Party dos Estados Unidos é um movimento social de sensibilidade libertária que surgiu em resposta ao que se entendia em amplos sectores da população norte-americana como um aumento de intervenção do Estado federal nos Estados Unidos sob a presidência de Barack Obama. O correspondente António Caño do El Pais nos Estados Unidos foi o promotor dessa visão, que é também a deste movimento e dos meios conservadores e ultraliberais que com ele simpatizam. Mas a realidade é bem diferente. Tanto os seus dirigentes como a sua prática actual apresentam outro tipo de movimento, que tem por objectivo defender os interesses económicos e financeiros de grupos empresariais concretos (que incluem desde empresas tabaqueiras a companhias de seguros, banca e empresas petrolíferas). É um movimento cuja base social é a classe média de renda alta e sectores de classes de poder, que acham que os seus impostos vão sustentar as minorias pobres do país. Está extraordinariamente bem financiado, com grande riqueza de meios procedentes de grupos financeiros e económicos que gozam de grandes recursos políticos e mediáticos. O seu poder político deriva de controlarem o sistema eleitoral através da redefinição dos distritos eleitorais desenhados pelas câmaras legislativas dos Estados controlados pelo Partido Republicano, favorecendo a eleição de políticos ultraliberais, sem nenhuma sensibilidade democrática.

Os seus membros têm características comuns com o nacional catolicismo espanhol. Consideram-se parte de uma pátria escolhida por Deus, num nacionalismo extremo que tem também a missão de salvar os Estados Unidos de «ideologias antiamericanas», libertando-os do governo federal controlado agora por um Anticristo. 62% dos membros do Tea Party (segundo sondagens oficiais) acha que o Presidente Obama quer instaurar o socialismo nos Estados Unidos; 42% acham que o Presidente Obama é muçulmano e quer impor a lei muçulmana no sistema judicial americano; e 21% acham que o governo federal está a matar gente para estimular o medo às armas (sim, leu bem a frase) e muitas outras falsidades óbvias, transmitidas por um imenso sistema de doutrinação, quase como ter 20 Losantos — em horário nobre — em todo o território norte-americano. Rush Limbaugh, Glenn Beck, Michael Savage e a Fox News. O dinheiro que esta aparelhagem tem à sua disposição é imenso.

É o movimento da ultradireita, mais próxima do fascismo europeu, ainda que tenha as suas características próprias, que o separam. O seu poder vem do controle sobre grandes recursos (financiados por esses grupos empresariais) e de grande número de câmaras legislativas dos estados que são, como já foi dito, as que definem os distritos eleitorais das eleições federais. Isso explica que, embora o Partido Democrático tenha ganho as últimas eleições no Congresso (mais de um milhão e meio de votos sobre os Republicanos), hoje o Congresso esteja nas mãos do Partido Republicano, controlado pelo Tea Party. A sua eficácia deve-se também ao profundo sentido de militância e à sua participação activa no processo eleitoral. Como a abstenção é enorme nas eleições para o Congresso (uma das instituições mais desprestigiadas dos Estados Unidos), um grupo muito minoritário, como o Tea Party, pode ganhar facilmente as eleições.

Nas eleições para o Congresso só 30% do eleitorado vota (nas eleições presidenciais, que coincidem com as do Congresso, votam 52%, com o qual, um grupo muito motivado pode acabar (com 16% do voto) controlando os canais legislativos do Estado e do Congresso. A sua motivação é muito acentuada, pois tem um fanatismo religioso que sustenta a sua crença de que estão a lutar contra o anti Cristo, sendo altamente manipuláveis pelos grupos económicos que os financiam. O seu fanatismo é complementado por uma grande ignorância pois acham, por exemplo, que a paralisia do governo federal e a sua inviabilidade de pagar a dívida melhoraram a economia norte-americana. Daí que o seu controlo do Congresso via Partido Republicano represente uma ameaça para o sistema económico dos Estados Unidos, e inclusivamente para o sistema económico mundial.

A situação referente à dívida pública é um exemplo, mas estão a tentar chantagear o presidente Obama para acabar com as reformas da saúde da Administração democrata e as pensões públicas do país. O seu discurso é semelhante ao utilizado pelos governos europeus e espanhol que, sob a desculpa de diminuir o défice público, está a eliminar a Assistência Social, impondo políticas que beneficiam o mundo empresarial e as classes de poder.

*Vicenç Navarro é catedrático de Política Pública na Universidade Pompeu Fabra e professor de Política Pública na Universidade John Hopkins.

Fonte: Diário Liberdade.

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