Entidades denunciam estado de exceção imposto a indígenas e quilombolas por governo federal

Por Guilherme Cavalli.

A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, juntamente com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul e a Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas do Rio Grande do Sul divulgaram uma nota pública onde questionam o parecer chancelado pela Presidência da República na última quinta-feira (20).

O governo federal adotou uma orientação da Advocacia-Geral da União (AGU) que determina a toda administração federal que julgue as demarcações de Terras Indígenas (TI) a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a TI Raposa-Serra do Sol (RR), de 2009. Entre os pontos mais inconstitucionais encontra-se o entrave de que só tem direito à terra os povos que estavam sob posse de seu território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

“Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual (e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento”, redigem as instituições signatárias.

O documento assinado pelas instituições afirma que o parecer “está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais”. O texto assegura que essas são articulações do governo para “impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio”.

A partir da análise de conjuntura que denuncia o “compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista”, a nota pública manifesta as artimanhas governamentais que se “valem de todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo” para sustentar um governo ilegítimo e “ implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente”.

O governo de Michel Temer, segundo as entidades, deseja “surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro”.

O parecer foi assinado por Michel Temer com o objetivo de blindar seu governo – a ser julgado pela Câmara que decidirá se a acusação de corrupção seguirá ou não para o STF. No centro das negociações, como moeda de troca para garantir o apoio da bancada ruralista (41% dos parlamentares da Câmara), encontra-se a agenda ambientalista. Nas últimas duas semanas, Temer direcionou ao Congresso projetos que diminui o tamanho da Reserva do Jamanxim (PA) e aprovou o parecer que paralisa a demarcação das Terras Indígenas. A flexibilização de regras para licenciamento ambiental, a liberação de agrotóxicos e venda de terras para estrangeiros também se apresentam como futuras moedas de troca do peemedebista.

“Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie”, encerra a nota das entidades.

Leia na íntegra:

Nota para a Opinião Pública
O governo federal e o estado de exceção em relação a indígenas e quilombolas.

No dia 20 de julho de 2017, a par de uma clara e inequívoca articulação com a bancada de parlamentares ruralistas formada no Congresso brasileiro, a Presidência da República chancelou parecer  da Advocacia Geral da União que para além de limitar os direitos dos povos indígenas e quilombolas, avança no sentido de constranger o Supremo Tribunal Federal que pautou para o próximo mês de agosto o julgamento de ações que dizem diretamente a esses povos, ou seja, quanto ao direito, ou não, de terem assegurados seus ancestrais direitos à luz do que prevê e fixa a Constituição de 1988.

Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual ( e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento, simplesmente afronta de modo ignóbil e direto a Constituição da República fazendo – o ato chancelado – tábua rasa dos preceitos fixados na Constituição Federal, arvorando-se  em uma decisão da Corte Suprema para uma caso específico e que não tem – e nunca teve – a extensão pretendida pelos setores do agronegócio e da mineração. Ou seja, uma decisão questionável e ainda em discussão tomada por parte do Supremo Tribunal Federal quando julgou, caso pontual (estamos nos referindo a o julgamento concernente à terra indígena Raposa Serra do Sol ), está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais claros e taxativos de modo a manietar e impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio.

Esse texto não permite por sua extensão que nos aprofundemos em detalhes técnicos e legais, mas inexorável e irretorquível que o compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista não tem limites – o que comprovam outras contrarreformas sociais de autoria do mesmo governo e que vêm sendo arrancadas a fórceps de um Congresso quase que totalmente comprometido com o rentismo e a exploração dos debaixo, contando com forte apoio da mídia burguesa. Para tanto valem todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo, ainda que isso signifique rasgar a Constituição da República e implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente.

A releitura, melhor, a interpretação casuísta e absolutamente descompassada   do conteúdo do disposto nos arts. 231 e 232 da Constituição da República, assim como do art.68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sem embargo das regras regulamentares dessas balizas constitucionais, é meio e modo de, mais do que negar, surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro.
O ato de chancela do (ilegítimo) Presidente da República é típico do arbítrio e atentatório aos princípios civilizatórios inscritos no Preâmbulo da Constituição de 1988. Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie.

Fonte: CIMI.

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