Emissora banaliza a reforma agrária na mesma semana em que governo prioriza o Agro

A reportagem sobre Reforma Agrária da emissora Globo é veiculada na mesma semana em que Governo anunciou o Plano Safra 2019/2020 priorizando as políticas para o agronegócio

Foto: Tali Feld Gleiser

Por Patrícia Costa.

A reforma agrária é uma política que vai muito além do direito à terra, ela passa pela defesa da soberania alimentar, valoriza a agroecologia, resgata experiências tradicionais, camponesas, a agricultura familiar, defende um novo modelo de produção com diversidade de culturas, preservação dos recursos naturais e o desenvolvimento sustentável, além de valorizar o mercado local e regional independente das grandes empresas e produtoras de insumos.

Neste domingo uma reportagem da Globo mostrou algumas fraudes que ocorrem no país quando o assunto é assentamento da reforma agrária.

Vale dizer, que a reportagem é apresentada após alguns dias do anúncio do Plano Safra 2019/2020, feito pelo governo Bolsonaro e ministra Tereza Cristina, na última semana, que exclui um plano específico para Agricultura Familiar e prioriza a política para o agronegócio.

Também, diante das denúncias, vale lembrar que o país passa por um grande problema que é o sucateamento das superintendências do Incra, da qual não foi dito pela reportagem, inviabilizando assim a sua efetividade enquanto atividade fim, no que diz respeito a fiscalização.

Enquanto entidade representativa da agricultura familiar do país, destacamos que a reforma agrária não é apenas uma política de acesso à terra, como já mencionamos acima, mas também de resgate dos direitos. É uma política que trabalha a desigualdade social e contribui para a produção de alimentos saudáveis, aliado a segurança alimentar do país. Trata-se de um movimento contrário a expansão do agronegócio que devasta a terra, acaba com o solo, pratica a monocultura e usa de forma exacerbada agrotóxicos, sem falar no desmatamento.

A Pesquisa Qualidade de Vida nos Assentamentos (2010), realizada junto aos assentamentos de reforma agrária de todo o país, organizou um conjunto de indicadores e dados sobre o desenvolvimento dos assentamentos referentes a aspectos socioeconômicos, institucionais, ambientais, dentre outros. A pesquisa apontou que produção agropecuária nos assentamentos representa a maior fatia na composição da renda, contribui em média com 75% das receitas. Na região sul a produção representa 81% das receitas. No aspecto de acesso ao crédito, 52% das famílias assentadas declararam acesso ao PRONAF e 64% delas estavam na condição adimplentes.

Os dados mostram o quanto é relevante a reforma agrária para o país economicamente. Mas, a emissora que falou sobre a reforma agrária se apegou as fraudes, o que é exceção, no universo de 9.374 assentamentos no Brasil.

Também vale ressaltar a defesa do líder do assentamento, que repudiou a venda de lotes destacando que a maioria dos assentamentos produz alimentos e que são inclusive comercializados em feiras, valorizando a economia local.

Ainda, é importante lembrar que em 2017 o governo Temer sancionou a Lei 13.645, uma conversão da Medida Provisória 759, que abandonou por completo a distribuição de terras e direcionou as ações do Incra para a concessão de títulos individuais (provisórios ou definitivos). Isso, provocou a antecipação de títulos impedindo que o domínio dos lotes permanecesse sob o controle das entidades associativas que geriam coletivamente os assentamentos.

Para a Contraf Brasil, a reportagem tratou apenas de um interesse da emissora em manchar a reforma agrária, quando sabemos que ela é aliada a agro pop de uma grande bancada ruralista no Congresso.

Sabemos também que não é interesse da emissora em pautar temas que de fato representem o direito à terra e discuta de forma salutar a redistribuição de terras quando temos, no Censo Agropecuário de 2017, o aumento de concentração de terras.

No censo anterior, de 2006, os dados mostravam que 45% das terras eram de estabelecimentos controlando mais de mil hectares. Agora, são 47,5% das terras. Ainda, há menos estabelecimentos: em 2006 eram 5.175.636 estabelecimentos; hoje são 5.072.152. E eles ocupam uma área maior: antes, eram 333 milhões de hectares; hoje são 350 milhões. E desse total, mais de 16 milhões de hectares estão concentrados nos grandes estabelecimentos. Enquanto os menores, que têm até dez hectares, representam 50,2% do número total de estabelecimentos, mas ocupam apenas 2,3% da área.

Nós, da Contraf Brasil somos contrário a qualquer tipo de ação e atitude que venham ferir a legalidade nos processos e fraudar essa política tão importante para o avanço e desenvolvimento agrário no conjunto da Agricultura Familiar.

Queremos com isso dizer que, é preciso ter responsabilidade com a comunicação pública ao se tratar de um tema que carrega um conflito histórico no país, como também deixar claro que o que foi apresentado é exceção no grande universo de benfeitorias que a reforma agrária traz e contribui para o desenvolvimento rural do país.

Precisamos falar de reforma agrária com a responsabilidade de quem quer colocar na mesa do brasileiro comida de verdade e garantir a segurança alimentar do país, com menos pobreza e miséria no Brasil.

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