Em meio à epidemia de zika, o país acelerou para o desmantelamento do SUS

Por Cida de Oliveira.

Da RBA.

O ano que começou com esforços do governo Dilma Rousseff para conter o avanço da epidemia de zika e as suas graves consequências, como o aumento de casos de microcefalia associados ao contágio pelo vírus na gestação – o que incluiu aporte de investimentos para pesquisas, vacinas e para amparo de vítimas – termina com o agravamento de outra doença: o subfinanciamento do SUS.

PEC da morte

Mal crônico, os recursos insuficientes para custear o maior sistema público de saúde do mundo deverá dar entrada na UTI nos próximos anos. A causa: o impacto do congelamento dos investimentos federais no setor com a aprovação da Emenda Constitucional 95/2016. A proposta foi encaminhada ao Congresso pelo governo de Michel Temer (PMDB), pouco depois do impeachment da presidenta Dilma. O Conselho Nacional de Saúde estima perdas da ordem de R$ 135 bilhões a R$ 400 bilhões nos 20 anos de vigência da medida.

Compromisso privado

Para analistas da Saúde, o golpe de Michel Temer à saúde pública começou com a escolha do nome do ministro, Ricardo Barros. “O governo Temer colocou para gerenciar a pasta de maior orçamento do Planalto um engenheiro civil sem qualquer experiência em gestão da saúde. Quando deputado federal (PP-PR), votou a favor da PEC 358, que alterou o cálculo de destinação de recursos para o SUS, diminuindo assim os repasses”, aponta o farmacêutico Leandro Farias, coordenador da organização Chega de Descaso, do Rio de Janeiro, que atua na defesa do SUS.

Comprometido com a saúde privada, que contribuiu generosamente com suas campanhas eleitorais, o ministro passou a declarar, assim que empossado, no início de maio, que era preciso redimensionar o SUS, ajustando-o ao orçamento. A estratégia defendida foi a criação de planos de saúde “populares”, baratos, e de cobertura reduzida. Justamente por custear basicamente consultas e exames simples, como muitos planos já existentes, a ideia está sendo discutida por um grupo de trabalho desde agosto. Se for implementada, em vez de aliviar as contas do SUS vai onerar ainda mais. Caberá ao sistema público pagar o que esses convênios não pagam.

Mais Médicos

“Um ministro, aliás, que já declarou mudanças no Mais Médicos. Um programa tão importante, que levou a medicina para diversas regiões carentes do país por meio do trabalho de médicos que são referência em atenção primária em todo o mundo, os cubanos. Não é à toa que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em visita a Cuba, firmou intercâmbio para capacitar os profissionais norte-americanos”, destaca Farias.

Desde que tomou posse, no início de maio, o ministro Barros passou a colecionar “pérolas” que revoltaram movimentos em defesa da saúde. Uma delas foi celebrizada no começo de agosto, em lançamento de cartilha sobre cuidados com a saúde masculina. Barros afirmou que “o homem vai menos ao médico porque trabalha mais que as mulheres”.

Agrotóxicos

Desde que tomou posse, Barros também não citou qualquer intenção de enfrentar a questão das patentes, que oneram o SUS por meio da judicialização. E tampouco intervir no avanço dos agrotóxicos, que contribuem para aumentar a demanda por assistência à saúde por conta de seus efeitos negativos no organismo pela ação de substâncias altamente tóxicas, proibidas em vários países.

“O ano foi marcado pela autorização de plantas transgênicas tolerantes a herbicidas mais perigosos que o glifosato, que demandam maiores quantidades desses venenos. Nada foi feito para a redução”, destaca o integrante da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida – Agrotóxico Mata, o agrônomo Leonardo Melgarejo. “Além disso, avançaram projetos de lei que ameaçam a saúde, como o que cria uma nova comissão para analisar e aprovar agrotóxicos, da qual são excluídos a Anvisa e o Ibama. Há muitos sinais de que o golpe político-midiático que colocou o Temer na presidência deixará sequelas por gerações.”

Saúde mental

A saúde mental também sofreu duros golpes em 2016. Especialmente com a morte de três militantes da luta antimanicomial. Em fevereiro, foi assassinado na Bahia o psicólogo e militante em defesa da reforma psiquiátrica e dos direitos dos indígenas Marcus Vinicius de Oliveira, mais conhecido como Marcus Matraga.

Em junho, morreu o psicólogo o professor Fábio Belloni,um dos fundadores da Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo, da Frente Nacional de Drogas e Direitos Humanos e seus núcleos estaduais.

No começo de dezembro, a luta pela saúde e pelos direitos humanos perdeu Antônio Lancetti. O psicanalista que atuou na intervenção que transformou Santos, litoral paulista, na primeira cidade brasileira sem manicômios, foi também idealizador e consultor do programa De Braços Abertos, criado na gestão de Fernando Haddad.

Em meio à epidemia de zika, o país acelerou para o desmantelamento do SUS

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