É essencial discutir o risco de golpe militar no Brasil

Por José Álvaro de Lima Cardoso.*

O Brasil acabou de sofrer mais um golpe, com o envolvimento de todos os poderes da República, a grande imprensa e o chamado Dinheiro. Golpe com decisiva influência do imperialismo norte-americano, a principal força da coalizão que atropelou a Constituição em 2016. Uma das possibilidades colocadas no intrincado xadrez conjuntural atual é a possibilidade de um golpe militar, deslocando ainda mais à direita o atual processo político. Para nós trabalhadores este é um debate crucial, pois sabemos o que representam na história do Brasil (e América Latina) os golpes militares. Não só para direitos trabalhistas e políticos, como para a própria vida dos patriotas e democratas, em geral. À exemplo de 1964 um golpe militar neste momento seria dado a serviço do imperialismo e contra as organizações populares. É ilusão imaginar que haveria golpe militar com características nacionalistas, seria um golpe contra o povo e contra o país. 

Quais são as probabilidades de desfecho de um golpe militar no Brasil na atual conjuntura? Existe um aspecto que não fecha na equação golpista, que é o fato de que um candidato de esquerda está na frente nas pesquisas de intenção de votos e tem chance real de vitória nas eleições de 2018. Se espera, inclusive, que as chances de vitória da esquerda estarão maiores ainda em 2018, visto que o saco de maldades colocado em ação pelos golpistas estará ainda mais evidenciado, em estágio mais avançado, como a destruição da CLT, congelamento de gastos sociais por 20 anos (Emenda da Morte), liquidação do patrimônio público, desmonte da Petrobrás, entrega do pré-sal, desmonte da Seguridade Social, e os demais ataques a 99% da população.

Outro dado concreto, que é essencial: setores das forças armadas já disseram que não só pensam em dar um golpe caso “as coisas saiam de controle”, como já têm um plano elaborado. O General Mourão, há alguns dias, em palestra numa loja maçônica, que aparentemente vazou na internet, disse que as forças armadas têm um plano montado de intervenção militar, caso se faça necessário. Não foi uma fala cautelosa ou protocolar: disse com todas as letras que dispõem de um plano que irão executar se for necessário. Para o militar, um general de quatro estrelas, diante de uma determinada situação de “iminência do caos”, as Forças Armadas interviriam para restituir a ordem no país. Divulgada essa fala do general, vários outros militares deram declarações, ou em apoio explícito ao militar, ou em relativização do que foi dito, como no caso do Ministro do Exército. Que tipo de situação significaria o “caos” para os militares é uma definição que só eles sabem o que significa. Por exemplo, um candidato do campo da esquerda ser o preferido nas intenções de votos pode ser interpretado como uma situação de caos. O que não seria nenhuma surpresa, dada a posição conservadora em geral das forças armadas, e do general mencionado em particular. 

Frente aos indícios de golpe militar, ainda que estes fossem muito fracos (e não), não tem sentido simplesmente negar que haja a possibilidade de sua concretização. Essa é uma posição extremamente ingênua, que desconhece a própria história do Brasil e da América do Sul. Os militares, especialmente nas últimas décadas, sempre tiveram muito poder no controle do regime político. Negar a possibilidade de golpe militar é especialmente grave porque isso representa risco real de mortes, prisões e tortura de pessoas. 

A negação pura e simples do golpe tapa também os olhos para o fato de que as Forças Armadas apoiaram o golpe em 2016. Na melhor das hipóteses os militares foram consultados e consentiram com o golpe no ano passado. Mas a hipótese mais provável é que tenham participado das articulações golpistas. Caso contrário, já teriam se posicionado em relação a um conjunto de ações que ferem dramaticamente a soberania nacional como a entrega do pré-sal, a inviabilização do projeto de fabricação do submarino à propulsão nuclear, fundamental para proteger a Amazônia Azul, prisão do vice-almirante Othon Silva, a tentativa de vender terras a estrangeiros, e assim por diante. 

Na prática não faz sentido ficar polemizando se haverá ou não golpe militar no Brasil. É como se, no interior de uma família residente num centro urbano do Brasil, houvesse uma divergência entre os seus membros se a casa correria o risco de ser assaltada ou não. A discussão ficaria ainda mais estranha se a casa já tivesse sido assaltada algumas vezes. Independentemente do grau de risco, ou de quem está mais certo ou mais errado, se já aconteceu antes e há algum perigo de assalto, as medidas preventivas devem ser tomadas, esperando-se o pior. 

Se os militares de alta patente ficarem fazendo declarações desse tipo e não houverem protestos incisivos das organizações sociais e sindicatos, se os protestos se limitarem a um ou outro discurso no Congresso Nacional, a tendência é irem elevando o tom, e medindo a reação da sociedade. Ninguém sabe se o golpe ira se concretizar. Mesmo porque a existência do plano não significa a garantia de sua implementação. Inclusive porque, em qualquer plano complexo se deve levar em conta inúmeras variáveis complexas, como é o caso de uma ação desse tipo. Num plano desse tipo têm que ser organizados planos de contingência. 

Golpes nem sempre são exitosos, podem ser derrotados, por isso vale a pena encaminhar ações preventivas. Por exemplo, em 2016 a tentativa de um golpe na Turquia foi derrotada pelo governo e pelas forças sociais daquele pais. É uma questão de correlação de forças. Mudança na correlação de forças é algo que pode ser construído. O que não tem sentido é ficar discutindo indefinidamente a possibilidade de um golpe, como se fosse um debate acadêmico, e ficar aguardando o seu desfecho. Temos que denunciar o risco, que é real, e mobilizar as forças sociais para evitar que aconteça. 


*Economista.

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