“Digam para seus parentes que avancem! Que não parem! Que não calem! Vamos lutar até o último guerreiro”

 No Sul do país, indígenas de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul, se organizam para grande mobilização que acontecerá nesta quarta-feira, dia 11 de novembro. Eles prometem: “A gente não vai desistir. Enquanto tiver um guerreiro em pé, a gente não vai desistir. Isso vocês podem ter certeza”.

Por Cláudia Weinman, para Desacato.info.

Fotos: Pedro Pinheiro/PJMP-PJR-SC

A mobilização nacional contra a PEC 215, a qual possibilita ao Congresso Nacional tomar a decisão sobre a demarcação das terras indígenas, e reforça o genocídio dos povos autóctones do Brasil, continua. Em reunião realizada na aldeia Toldo Chimbangue, em Chapecó-SC, indígenas e organizações populares de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul, discutiram na última sexta-feira, dia 06, sobre a mobilização que acontecerá a nível nacional na próxima quarta-feira, dia 11, além dos impactos de uma possível aprovação da PEC 215 e o que fazer para barrar este projeto de morte que também deturpa os artigos 231* e 232* da Constituição Federal.

Além de ser inconstitucional e ferir os direitos dos povos indígenas do Brasil, a PEC 215 também desconsidera a existência e vida dos povos originários antes da constituição de 1988. “Parece que passamos a ser gente depois da constituição de 1988. É importante dizer que antes da constituição nós éramos tutelados pela Fundação Nacional do Índio, e não tínhamos direito de fazer ação contra o Estado porque éramos considerados incapazes. A partir de 1988, somos considerados como parte legítima da nação mas somente a partir de 1998 é que conseguimos nos organizar como tal”, explica um dos representantes do povo Kaingang, do Rio Grande do Sul, Alvandi Ribeiro.

A discussão da PEC 215, feita a partir da bancada dos latifundiários, também apresenta em clarividência, interesses sobre as terras que estão em processo de demarcação. “Estamos muito preocupados com as terras onde o povo tem feito luta para conquistá-las novamente. O nosso temor está nesse projeto impedir a demarcação das terras que estão em andamento para suas demarcações”, apontou Marciano Rodrigues, representante do povo Guarani Nhandewa, do estado do Paraná.

Em conversa com indígenas Kaingang, Xokleng e Guarani, as lideranças demonstraram preocupação com o território brasileiro, considerando que a PEC 215 afeta além de populações indígenas inteiras, também os recursos naturais que o país ainda tem preservado. O Cacique Kaingang do Rio Grande do Sul, Luis Salvador, aponta para um futuro de desespero caso a PEC seja efetivamente aprovada. “Afeta as populações indígenas no país, afeta os ribeirinhos, afeta os quilombolas, Fere a humanidade. Afeta nossa água, a vida do nosso ar, que são nossas árvores. Se chega passar isso vai afetar o povo do Brasil”, garantiu Salvador enfatizando ainda que o interesse dos latifundiários, donos de grandes extensões de monocultivo, é vender e lucrar sobre a vida que ainda está presente nas águas, nas árvores e nas demais preciosidades encontradas nas matas.

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Em reunião, indígenas Guarani, Kaingang e Xokleng discutem a PEC 215 e seus impactos

 “Estão pagando gente para tirar a vida das lideranças indígenas”

 Em conversa com o representante do povo Kaingang do Rio Grande do Sul, Isaias Jacinto da Rosa, ele falou sobre os constantes ataques que os indígenas têm sofrido no Sul do país. Disse que a realidade do Mato Grosso do Sul, onde foram divulgados os mais recentes ataques, está presente no Brasil inteiro. Além dos fazendeiros que contratam pessoas para matar as lideranças indígenas, deputados tem se beneficiado em campanhas eleitorais, levantando a bandeira favorável a PEC 215. O indígena ainda contextualizou a realidade de seu povo afirmando que os agricultores estão sendo induzidos a ‘atirar’ no povo indígena.

No dia 03 de agosto, Isaias foi vítima de uma emboscada no estado do Rio Grande do Sul. Foram 15 tiros disparados contra o carro onde ele estava. Um deles acertou sua coluna e a bala permanece alojada. “Fomos várias vezes atacados por arma de fogo, estamos sofrendo ameaças, estão pagando gente para tirar a vida das lideranças indígenas. Eu estou esperando agora para fazer uma cirurgia, não sei se vou poder continuar a andar por conta da bala que ainda está alojada na minha coluna”.

Mediante este cenário de truculência e genocídio das populações indígenas, as lideranças analisam a atual configuração da sociedade fazendo analogia a Ditadura Militar. “Depois do período militar, este é um dos piores momentos. Todos os nossos direitos estão em risco, por uma bancada do agronegócio, ruralista, evangélica, que votam sempre contrários a questão indígena. Não temos uma legislatura popular, mas da classe dominante do capital”, reflete o indígena Kaingang de Santa Catarina, Rildo Mendes.

Após passar pela Comissão Especial, o andamento das discussões sobre a PEC 215 está sendo acompanhada pelos indígenas que farão no dia 11 de novembro, quarta-feira, grande mobilização. “A gente está atento. Não vamos esmorecer. A gente não vai desistir. Enquanto tiver um guerreiro em pé, a gente não vai desistir. Isso vocês podem ter certeza”, enfatizou o indígena Ivan Bribis Rodrigues, Kaingang do Paraná.

“Se a terra é nossa mãe, a terra não se vende, não se aluga, não se troca”.

         Certos de que uma grande batalha estará acontecendo nos próximos dias em todo o Brasil, na luta contra a PEC 215, indígenas dos três estados do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, apontam a necessidade da sociedade Brasileira assumir a causa que reflete na vida de todo o planeta terra, o qual, nas mãos dos capitalistas, resultará na autodestruição de todo o território. “Essa PEC tira o que há de mais sagrado para a cultura Kaingang e para todos os povos do Brasil, que é a mãe terra. Se a terra é nossa mãe, a terra não se vende, não se aluga, não se troca, por ela ser mãe”, argumentou Adroaldo Antonio Fidelis, representante Kaingang de Santa Catarina.

         A terra no controle dos sócios do capital representa, segundo a representante Kaingang de Santa Catarina, Vanisse Domingos, o extermínio dos povos. “Sem a terra não há sobrevivência. A gente sabe que nossas crianças estão vindo. Daqui um tempo só as terras que temos não vai ser suficiente. A gente percebe que a terra é nossa vida, é vínculo, sustento, é nossa mãe. Os povos serão exterminados se essa vida não for garantida”, aponta.

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         Ao fortalecerem as mobilizações em todo o Brasil, os indígenas prometem lutar incansavelmente para que a PEC 215 não seja efetivada. Woie Patte, é Xokleng, de Santa Catarina, e garantiu que os povos não vão calar a voz para o Capitalismo. “Vamos brigar não entre nós, mas pelo nosso território. Digam para seus parentes que avancem, que não parem, que não calem, vamos lutar até o último guerreiro. Quando este guerreiro tombar, ai acabou”.

*Para entender: Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

 

Foto de capa: Indígenas se preparam para grande mobilização nesta semana

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