Diário do Brasil: os 10 dias de Temer

Por Thiago Iessim, de São José, para Desacato.info.

13 de maio de 2016. Atravesso uma ponte com destino incerto. Ao terminar de cruza-la me vejo rejuvenescido, 21 anos para ser exato, mas não me sinto mais forte por isso. Agora minhas costas doem.

14 de maio de 2016. Meus amigos estão mais distantes, dizem que eu não sou mais o mesmo. Me sinto mais magro e doente, mas não é como se eu estivesse pior do que antes, mas agora parece que sofro de deficiência de leucócitos. Ainda minhas costas doem.

15 de maio de 2016. Estou preocupado, me sinto mais sozinho e menos plural. Me sinto muito branco, velho e demasiado masculino. Meus amigos(agora distantes) tinham razão, eu não sou mais o mesmo. Não sinto sequer alegria na dança, na música ou no teatro. E cada vez mais minhas costas doem.

16 de maio de 2016. Cada vez menos me expresso, pouco falo ou escrevo, nem A, nem E, nem B ou C, somente repito o que manda o figurino. Falando em figurar, agora me sinto menos masculino, mas somente nas aparências. As dores nas costas agravaram.

17 de maio de 2016. Hoje estive um pouco melhor com o decorrer do dia, meus recentes vazios foram ocupados, meu silêncio foi momentaneamente quebrado, voltei a sentir o eu plural. Pude dançar, rir e chorar com a arte que está em mim. A dor nas minhas costas persiste, mas lutar fez aliviar.

18 de maio de 2016. Como paulada retornei aos meus sensos. Da alegria fugaz restou somente o peso do cassetete e o vermelho-pimenta nos meus olhos. Nem o mais novo em mim foi poupado, nem o que em mim lutava por todos. Além da dor nas costas me sinto também doente.

19 de maio de 2016. Parece que agora nada funciona. As partes que em mim deveriam se fazer presentes não estão. Estou em desalinho com a realidade. Metas, bloqueios, novas políticas reverberam sem parar. Enquanto isso minha parte infantil, sedenta por educação, luta com estômagos vazios e sem adultos em quem se apoiar, tampouco CPI para investigar. O peso de mil vidas arqueiam minhas costas, dói.

20 de maio de 2016. Números abstratos, inquéritos engavetados, jornalismo “arroz com feijão”…respiro fundo para aguentar tudo o que se passa mas me sinto inquieto. Um formigamento que vai dos pés a cabeça não me deixa descansar, acho que vou desmaiar, mas a dor nas minhas costas me força a continuar.

21 de maio de 2016. Hoje estou ressabiado, as artes estão de volta, mas algo não parece certo. Os espaços ocupados me alegram mais do que os “legítimos”, me animam, me fazem pular, dançar e cantar. A arte pulsa nas ocupações! Mas parece morrer nos ressurgidos ministérios… O peso nas minhas costas não diminuiu.

22 de maio de 2016. Estou sendo puxado pelo caminho de volta da ponte, minhas costas doem mas alegremente sou conduzido por uma massa fervorosa. Reparo que infelizmente trata-se de um cabo de guerra, dos dois lados me puxam. Estou estagnado, parado no tempo. Gritos, luta, azul, vermelho, verde e amarelo. Minhas dores chegam ao seu ápice.

23 de maio de 2016. A dor já não me permite mais caminhar, seja para qual lado for, minhas pernas estão cedendo e minhas costas mais e mais arqueiam pondo-me em posição servil. Os acordos internos não me levam em consideração, pouco se importam se estou sofrendo. Apreensivo olho de soslaio para trás e uma melancolia me toma o peito. Eu havia esquecido o peso da bota e do porrete. Não sou mais eu mesmo, novamente sou quintal.

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