Despejo dos moradores do Bairro “Drummond”

Diário de Itabira, MG, em 1º de agosto de 2011

O frei Gilvander Luís Moreira, 47 anos, assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (CONEDH) disse que ainda acredita que a “ordem de despejo” contra os moradores do bairro “Drummond” não será cumprida. Ao Diário, o religioso disse que pretende estar em Itabira hoje para acompanhar o desfecho da polêmica.

Sua vinda é uma tentativa de negociar a prorrogação do prazo para o cumprimento da ordem de reintegração de posse, marcada para amanhã. “O que está sendo perpetrado para as

famílias deste assentamento é uma injustiça que clama aos céus. Porque a propriedade está abandonada pela família Rosa há décadas. Eles nunca pagaram um centavo de imposto, seja IPTU ou ITR. A dívida de IPTU com a Prefeitura de Itabira já chegou a R$ 750 mil”, afirmou o frei ao Diário.

A ordem de reintegração de posse seria cumprida hoje, mas o comandante da Polícia Militar, tenente-coronel Edvânio Carneiro Rosa, deu mais um dia de prazo para que os “sem-teto” saiam espontaneamente. Hoje, ele deverá ir ao “bairro” conversar com os moradores.

Amanhã, os policiais voltam à comunidade para executar a ordem. Para o frei, a ocupação não foi planejada, mas espontânea, pouco a pouco foram chegando mais pessoas. No entendimento do religioso, não houve invasão, “já que a terra estava ociosa e não cumpria sua função social”.

O processo na Justiça começou em 2000 e quase terminou em 2001, com a desistência da causa apresentada por um advogado da família Rosa, por meio de um requerimento. Mas o advogado dos “sem teto” não deu anuência e o processo não foi arquivado.

Gilvander Moreira afirma que o juiz que cuida da causa hoje reconhece que o processo está cheio de irregularidades. “O Tribunal de Justiça de Minas Gerais julgou de forma inconstitucional o processo porque não se respeitou os princípios constitucionais, tais como, respeito à dignidade humana, função social da propriedade, direito à moradia. A promotora de Itabira não poderia defender os ‘sem-teto’. Seu marido tem cargo de confiança na Prefeitura e quem paga o seu aluguel é a própria Prefeitura. Ela atuou como defensora da família Rosa, deixando de defender o público, em detrimento do privado”, acusou Frei Gilvander.

O acampamento na frente da Prefeitura já dura 68 dias. O frei Gilvander entende que nos primeiros 30 dias de acampamento o prefeito João Izael Querino Coelho (PR) estava “intransigente”, chegando até a pedir a reintegração de posse da área em frente à Prefeitura, mas o juiz recusou, entendendo que o acampamento era legítimo. “Depois de um mês e muita pressão e a vinda de um representante do Ministério das Cidades foi celebrado um acordo entre os assentados do Drummond e o prefeito para a construção de casas no programa Minha Casa Minha, Vida e doação de terrenos para os sem-teto”, disse o frei.

No mesmo dia deste acordo o prefeito e o bispo da Diocese de Itabira e Coronel Fabriciano, dom Odilon Guimarães, pediram ao juiz o adiamento do “despejo”, já que seriam

necessários de seis meses a um ano para a construção das novas casas. Mas, o juiz não aceitou o pedido, facultando à família Rosa à condição de aceitar o acordo – ele negou. Outro entrave apontado pelo frei Gilvander é que a área no entorno do bairro “Drummond” “está cheia de

mansões” e a intenção da família Rosa seria fazer um bairro nobre no local. “É uma gula sem fim, do espírito capitalista da família Rosa que quer fazer um condomínio de luxo no local. Esquece-se que são 296 famílias que estão ali que a própria Prefeitura constatou que possuem renda entre zero e três salários mínimos. A Prefeitura prometeu abrigo para 30 famílias e bolsa aluguel para poucos. Para onde vão os outros?”, perguntou o religioso. Para o abrigo montado

no galpão da extinta Fio de Ouro devem ir 50 famílias. Ainda segundo ele, de 15 e 20 famílias já deixaram o “bairro”. Existem recursos tramitando no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) contra a desapropriação. Além disso, foram enviados ofícios pedindo o adiamento da reintegração de posse para o Governo do Estado, que até agora não foram respondidos.A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, a Comissão de Direitos Humanos

da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG), o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (CONEDH), a Rede Nacional dos Advogados Populares (RENAP) e o Sindicato dos Advogados de Minas Gerais assinaram um documento pedindo o adiamento das desocupações em Itabira e Uberlândia.  O documento afirma que a lei estadual 13.604, de 28 de junho de 2000, determina que para efetivação de desocupação de assentamentos rural ou urbano seja criada uma “comissão especial” para acompanhar os processos com representação dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e isso não foi cumprido nos casos de Itabira e Uberlândia. Além disso, as entidades alegam que o “despejo” destas famílias fere a Constituição, que prevê “moradias dignas” para elas. O documento foi encaminhado para o governador Antonio Anastasia (PSDB) e os secretários estaduais Wander Borges (Desenvolvimento Social) e Maria Coeli Simões Pires (Casa Civil e Relações Institucionais; juiz da 1ª Vara Cível de Itabira, André Luiz Pimenta, juiz da 4ª Vara Cível de Uberlândia, Walner Barbosa Milward de Azevedo, o comandante do 26º BPM de Itabira, Edvânio Carneiro Rosa, o comandante do 17º BPM de Uberlândia, o tenente-coronel Hércules dos Reis Silva, o prefeito João Izael Querino Coelho (PR) e o prefeito de Uberlândia, Odelmo Leão (PP).

Terreno do ‘despejo’ não foi demarcado, diz religioso

O frei Gilvander Luís Moreira disse que um dos principais problemas envolvendo o cumprimento da ordem de reintegração de posse é que a área de atuação da Polícia Militar não foi delimitada. “O Estado até agora entrou com o braço armado, sitiando o bairro. O Estado deveria dar o braço social, não o armado. Isso é omissão e resolver um problema social com a polícia é algo inadmissível. A Prefeitura alega não ter dinheiro, mas é a sexta maior arrecadação de Minas Gerais. O mais ilegal é que na reintegração de posse não há delimitação da área a ser desocupada e não pode ficar a critério do comandante da Polícia Militar”, protestou Gilvander Moreira.

Ele lembrou que já existe jurisprudência que anulou reintegrações de posses sem a delimitação da área a ser desocupada. O frei também alega que a Prefeitura é dona de uma parte do terreno comprado para a ampliação do Cemitério da Paz. “O prefeito alega não ter dinheiro, mas não executa a dívida de R$ 750 mil de IPTU [da família Rosa] com o Município. A Câmara Municipal poderia aprovar uma lei determinando o terreno de utilidade pública par fins de moradia popular, mas não o faz”, sugeriu Gilvander Moreira.

Governo do Estado precisa construir 800 mil moradias

Dados da Fundação João Pinheiro (FJP) apontam que em 2005 o déficit habitacional

em Minas era de 800 mil moradias. Em 12 anos, o Governo do Estado construiu somente 28 mil casas em Minas. No Brasil, o déficit habitacional alcança a marca de 9,8 milhões de famílias sem moradia. O frei Gilvander Moreira condenou a “opção pelo valor econômico deixando de lado o problema social vivido por estas famílias”. “O que estamos vendo em Itabira é o interesse econômico se sobrepondo ao social, do lado da família Rosa, do poder Judiciário e da classe dominante pisando e humilhando o coração das famílias carentes”, disparou ele.

Como assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o frei também acompanha outros

conflitos em Minas Gerais. Em Belo Horizonte são três acampamentos: Dandara, Camilo Torres e Irmã Dorothy, onde estão 1.200 famílias e foram formadas as Brigadas Populares. Em Uberlândia, 3 mil famílias podem ter que deixar o terreno que ocupam.

 

Procuradoria Federal envia carta ao governador e a secretários estaduais

A polêmica envolvendo os moradores do bairro “Drummond” chegou ao Governo do Estado. A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal (MPF), enviou ofício ao governador Antonio Anastasia, manifestando ser contra o “despejo” das cerca de 300 famílias que moram no bairro “Drummond”. “Preocupa-nos o fato de que os despejos forçados, por si só, possuam efeitos profundos e duradouros na vida das famílias atingidas, sendo incompatíveis com o cumprimento de diversos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, corroborados em nossa Constituição Federal de 1988 e na legislação interna em matéria de proteção à dignidade da pessoa humana e do direito humano à moradia”, diz trecho da carta, assinada pelo subprocurador geral da República, Wagner de Castro Mathias Netto, responsável pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. “É necessário que se resguarde a dignidade das populações antes, durante e após a realocação, com medidas que assegurem os direitos das famílias atingidas na observância dos padrões mínimos internacionais de direitos humanos destacados a seguir”, acrescenta.

Segundo a procuradoria, “as remoções e os despejos forçados são considerados ilegais quando realizados com o uso de força física ou violência”. “Nenhuma remoção deve ser realizada sem o acompanhamento de funcionários públicos devidamente identificados, que devem efetivamente zelar pela segurança da população que está sendo removida; observadores independentes devidamente identificados devem estar presentes para garantir que não sejam utilizadas força, violência ou intimidação; (…) a remoção não pode: fazer uso da violência e da intimidação, em nenhuma circunstância; ser realizada de forma discriminatória ou replicar padrões discriminatórios; Resultar em pessoas e famílias desabrigadas; destruir os bens das famílias afetadas; Ignorar a situação específica de mulheres e grupos em condição de vulnerabilidade (idosos e crianças, assim como outros)”, escreveu o subprocurador.

Assembleia e OAB assinam documento

A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG), o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), a Rede Nacional dos Advogados Populares (Renap) e o Sindicato dos Advogados de Minas Gerais assinaram um documento pedindo o adiamento das desocupações em Itabira e Uberlândia. O documento afirma que a lei estadual 13.604, de 28 de junho de 2000, determina que para efetivação de desocupação de assentamentos rural ou urbano seja criada uma “comissão especial” para acompanhar os processos com representação dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e isso não foi cumprido nos casos de Itabira e Uberlândia. Além disso, as entidades alegam que o “despejo” destas famílias fere a Constituição, que prevê “moradias dignas” para elas.

O documento foi encaminhado para o governador Antonio Anastasia (PSDB) e os secretários estaduais Wander Borges (Desenvolvimento Social) e Maria Coeli Simões Pires (Casa Civil e Relações Institucionais; juiz da 1ª Vara Cível de Itabira, André Luiz Pimenta, juiz da 4ª Vara Cível de Uberlândia, Walner Barbosa Milward de Azevedo, o comandante do 26º BPM de Itabira, Edvânio Carneiro Rosa, o comandante do 17º BPM de Uberlândia, o tenente-coronel Hércules dos Reis Silva, o prefeito João Izael Querino Coelho (PR) e o prefeito de Uberlândia, Odelmo Leão (PP).

 

Imagem: josecarlosalexandre.blogspot.com

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