Desdobramentos da grande guerra da mídia

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Por Luis Nassif.

Na semana passada, o Globo publicou série de matérias sobre a espionagem na Internet pela NSA, do governo norte-americano. Havia um gancho, o vazamento de informações sobre a espionagem por Snowden, técnico que trabalhava para a NSA. Mas, a rigor, o monitoramento não era fato novo.

Em parte, a cobertura pode ser creditada ao furo, do acesso aos arquivos. Mas o ponto central provavelmente é a guerra das mídias, dos grandes grupos midiáticos nacionais versus os gigantes da rede mundial. Com as denúncias, o Globo pretende mostrar o risco de se manter a opinião pública brasileira confinada em redes sociais controladas por multinacionais com sede em outros países, como o Google e o Facebook.

Paradoxalmente, o grande aliado será a presidente Dilma Rousseff, alvo de muitos ataques da velha mídia. Antes do episódio Snowden, ela vinha mostrando desconforto com o fato da grande discussão pública nacional dar-se em ambientes dominados por multinacionais com sede em outros países. Depois das denúncias, manifestou-se pessoalmente contra as interferências do Google.

Não se surpreenda se, daqui para frente, Dilma passar a ser poupada pela velha mídia.

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Na mesma semana, foi vazado para blogueiros uma autuação da Globo pela Receita Federal. É caso complicado, principalmente depois que se descobriu que uma técnica da Receita sumiu com o inquérito, tentando apagar os vestígios da autuação, foi presa, processada mas o Ministério Público não procurou saber quem foi o mandante do crime.

É provável que os dois episódios sejam parte integrantes da grande guerra midiática que já explodiu. E terá desdobramentos relevantes nas próximas décadas.

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Nos últimos anos não foram poucas as vezes que os grupos de mídia nacionais mostraram musculatura para os blogs, na atitude típica de quem abusa do poder que tem sem se dar conta dos desafios que terá que enfrentar.

Agora, que explode a verdadeira guerra, toda a estratégia terá que ser revista. A soma de inimigos acumulados nas últimas décadas são aliados naturais dos verdadeiros adversários.

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Por mais que se tema o poder oligopolista dos grandes grupos nacionais, no entanto, não há como fugir dos riscos de redes sociais monopolistas. Como subordinar a discussão pública brasileira ao controle de empresas privadas, sem nenhum controle público?

A Constituição Federal veda expressamente o monopólio na comunicação social.

Diz o parágrafo 5o do Art 220:

§ 5º – Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

Por outro lado, sem as redes sociais não haveria como romper com o pensamento único que dominou os grupos nacionais nos últimos anos, tornando-os baluartes dos maiores anacronismos

Para refrear o poder monopolista das redes sociais, sem comprometer sua inegável importância há que se aprofundar a discussão e entender os mecanismos de oligopolização.

O poder das redes reside na criação de um ambiente social, no qual as pessoas montam correntes de relacionamento permanentes, além de abrir possibilidade de acesso a um amplo universo de usuários. A própria massa crítica de usuários opera como barreira de entrada a novas redes. Não entro na rede B porque ela tem poucos usuários, mesmo que eventualmente tenha sistemas e funcionalidades melhores. E, entrando lá, não consigo interagir com os usuários da rede A.

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Através de um conjunto de práticas – ainda não absorvidas pela jurisprudência sobre cartéis e oligopólios na Internet – redes como Facebook procuram impedir de todas as maneiras que seus usuários possam interagir com o mundo externo.

Algumas das práticas utilizadas:

Hoje em dia, é possível puxar para dentro do Facebook feeds (comandos para trazer notícias de outros sítios), mas não são autorizados feeds para fora. O Facebook só tem porta de entrada, nenhuma de saída.

É possível compartilhar qualquer conteúdo da Internet com usuários de Facebook. Mas o sistema não permite o compartilhamento do seu conteúdo com outras redes. Tem que permitir.

Como usuário Google ou Facebook é possível se cadastrar em uma infinidade de sites e portais. O inverso não pode. Só entra no ambiente Facebook quem é cadastrado por lá.

Se um usuário de um site ou blog entra com o seu perfil Facebook, todos os comentários que ele coloca em posts tornam-se conteúdos da rede. Mas o Facebook não permite o oposto: comentários a notícias de terceiros serem compartilhados com os leitores do post original.

A maneira de reduzir o poder de oligopólio é derrubar essas barreiras de entrada.

O CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico), junto com o Comitê Gestor da Internet, no âmbito dos projetos de lei em discussão no Congresso, precisa garantir a integração de todas as redes em um mesmo ambiente.

Precisa haver um ambiente único, com as mesmas especificações técnicas, de tal maneira que usuários de uma rede possam compartilhar conteúdo ou promover conversas com usuários de outras redes. Ou seja, qualquer que seja o perfil, em qualquer rede, dará condições de interagir com todo o universo de redes sociais do país.

A competição se dará pela oferta de serviços e funcionalidades.

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É tarefa complexa, a começar pelo fato de Google e Facebook operarem em ambientes globais.

Mais cedo ou mais tarde, assim como ocorreu com as práticas monopolistas da Microsoft, os países finalmente entenderão a natureza das práticas adotadas e imporão restrições. E elas quase certamente passarão pelos enunciados aqui apresentados.

Há um conjunto enorme de temas a serem aprofundados para impedir a consolidação daquele que, por sua abrangência, poderá se constituir no mais temível cartel jamais imaginado pela economia ocidental.

Imagem: SOMaMFyC

Fonte: Luis Nassif Online

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