Deputados tentam censurar obra que retrata Virgem Maria trans

O artista responsável pelo trabalho exposto no Rio de Janeiro vem sofrendo ameaças na internet

DEPUTADO MÁRCIO GUALBERTO (PSL). FOTO: REPRODUÇÃO/ Carta Capital

Por Alexandre Putti

O Centro Cultural Hélio Oiticica, da cidade do Rio de Janeiro, está recebendo uma exposição que vem causando indignação de políticos conservadores. As obras retratam um universo de cinema pornográfico, corpos livres e pessoas que vivem com HIV.

Uma delas gerou ainda mais revolta dos religiosos. É uma representação da Virgem Maria como trans, com uma imagem de um peito e um pênis colada na santa. Ao lado da imagem está escrito a frase “Deus acima tudo, gozando acima de todos”. Essa representação é parte da exposição “Todxs xs Santx renomeado #EuNãoSouDespesa”.

OBRA “TODXS XS SANTXS RENOMEADO #EUNÃOSOUDESPESA”. (FOTO: REPRODUÇÃO)

O deputado estadual Márcio Gualberto (PSL), ligado à igreja católica, esteve nesta quinta-feira 20 na exposição e fez um vídeo pedindo para que o prefeito da cidade, Marcelo Crivella, retire as obras do museu. O pedido também foi feito pelo parlamentar Capitão Paulo Teixeira (Republicanos).

“O espaço, da Secretaria Municipal de Cultura, dedicado à diversidade da produção artística contemporânea, exibe um absurdo escárnio da fé cristã. Um ultraje aos símbolos religiosos e até mesmo a valores caros ao presidente da República. Isso é liberdade de expressão? Vou pedir explicações aos responsáveis pelo espaço e à Prefeitura do Rio de Janeiro”, afirmou Gualberto em sua rede social.

O artista responsável pela obra é o ator Órion Lalli, de 25 aos. O paulistano vive com HIV e resolveu criar obras que retrata o seu corpo soropositivo com encontros com outros corpos. No trabalho da Virgem Maria Trans, o artista diz que não há nenhum interesse de sua parte em atacar nenhuma religião ou a fé. “Quero apenas deixar uma reflexão imagética sobre ícones, falar dessas imagens que povoam e atravessam o nosso imaginário e que de certa forma moldam a nossa maneira de pensar”, disse.

O artista explica que seu trabalho gira em torno do HIV e de uma investigação histórica, que, para isso, precisou falar sobre sexo e sobre instituições que ditam o que é sexo há milhares de anos. “Até quando vamos falar de sexo pautado no conservadorismo por um erro de construção mitológica”, questiona Órion.

Desde que a obra foi anunciada, em 2019, o paulistano vem sofrendo ameaças de morte na internet, o que obrigou o artista a deixar o Brasil no final do ano passado. De volta e agora novamente em evidência, Órion teme por sua segurança.

“Quem me protege do fanatismo religioso e político? Quem cuida dos meu direitos civis? Como posso andar na rua livremente sem medo, sabendo que posso ser morto por um fanatismo exacerbado? Como lido com isso estando no Brasil, sendo artista independente, gay assumido, ativista da causa LGBTQIA+ ? Só resta o medo”, conta Órion.

Na manhã desta quinta-feira 20, uma equipe da Secretaria Municipal de Cultura esteve no espaço e pediu que a classificação, que era de 10 anos, fosse mudada para 16 anos. As peças ainda estão na exposição. Por enquanto, o Centro Cultural Hélio Oiticica informa que não recebeu qualquer determinação para retirar as obras. Procurada, a Secretaria de Cultura da cidade do Rio de Janeiro afirmou que “ não vai emitir pronunciamento sobre a questão”.

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