Decisão de Fux abre crise no Congresso, STF e TSE

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Por Livia Scocuglia, Márcio Falcão e Raquel Alves.

Uma decisão liminar do ministro Luiz Fux conseguiu ao mesmo tempo ampliar a crise entre Judiciário e Legislativo e provocar um novo conflito interno no Supremo Tribunal Federal.

O estopim foi a determinação de Fux para que a Câmara refaça a votação do pacote anticorrupção que desconfigurou as chamadas dez medidas de combate à corrupção, proposta de iniciativa popular defendida pelo Ministério Público Federal, em especial pelos procuradores da Operação Lava Jato.

Nos bastidores, ministros afirmaram que a deliberação do colega ainda precisa ser avaliada com lupa, uma vez que não seria tão usual e que há um esforço no tribunal para evitar que despachos da corte possam representar uma interferência em outro Poder, paralisando a atividade legislativa.

Ministros ouvidos pelo JOTA afirmam que o fato de uma decisão desse impacto ter sido tomada de forma individual, além de trazer mais um desgaste para o Supremo com o Legislativo em menos de uma semana, joga luz sobre o clima tenso na Corte – que teve até o cancelamento do tradicional almoço de confraternização dos ministros.

A insatisfação com Fux foi publicizada pelo ministro Gilmar Mendes, que na semana passada chegou a pedir o impeachment de Marco Aurélio que, por liminar, mandou Renan Calheiros (PMDB-AL) sair da Presidência do Senado – decisão que foi derrubada pelo plenário. Segundo Mendes, STF vive surto decisório.

“Nós estamos vivendo momentos esquisitos a toda hora um surto decisório que não corresponde a nossas decisões. Não sei se é água que estamos bebendo no tribunal. Estamos vivendo momentos estranhos. Temos uma tradição de ser cuidadosos. Temos que refletir muito. Respeitar harmonia entre os poderes. Permitir que as coisas funcionem com a dinâmica que elas próprias tem”, afirmou.

Os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros (PMDB-AL) e Rodrigo Maia (DEM-RJ), consideraram mais uma interferência do Judiciário no Legislativo. Os dois tentaram procurar a presidente do STF, Cármen Lúcia para tratar da questão, mas encontraram resistência. Renan telefonou para a ministra, mas ela estava em reunião e não chegaram a se falar. De acordo com interlocutores, ainda há no tribunal indisposição com o fato do presidente do Senado não ter cumprido a liminar que determinou sua saída do cargo.

Renan atacou a medida de Fux. “Essa medida é indefensável, porque ela interfere no processo legislativo. E há uma decisão do Supremo… Vou repetir, essa medida, ela interfere no processo legislativo e há uma decisão do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não pode haver interferência no processo legislativo”, disse Renan.

Maia, por sua vez, afirmou que sua equipe técnica prepara recurso e espera reconsideração de Fux. “Estou muito convencido de que tem muitos problemas na decisão do Fux”, afirmou o deputado.

Renan já afirmou que vai recorrer da decisão liminar. Em nota, o presidente do Senado destaca acórdão de 2013 que classificou como “inadmissível o controle preventivo da constitucionalidade material das normas em curso de formação” e voltou a criticar a decisão sob o argumento de desrespeito a prerrogativas constitucionais do Parlamento.

Nessa quarta-feira (14/12), Fux atendeu pedido do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) no mandado de segurança 34.530. O ministro entendeu que houve um problema na tramitação da proposta, o que inviabilizou o texto aprovado e já encaminhado ao Senado.

Para o ministro, o projeto deve ser registrado como de iniciativa popular e seguir o rito que determina a Constituição. Outro problema teria sido que a proposta foi desconfigurada pelos deputados.

Discussão

O mal-estar chegou ainda ao plenário do Tribunal Superior Eleitoral nesta quinta-feira (15/12), quando Mendes e Fux discutiram.

Fux comentou que, após o Supremo ter chancelado a  constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, não cabe mais aos ministros discutirem a sua aplicação, já que foi opção do legislador estabelecer o tipo de sanção.

“Se este tipo com esta sanção foram desproporcionais, afere-se inconstitucionalidade não só por descumprimento de regras constitucionais como também por descumprimento de princípios constitucionais dentre os quais se inclui a razoabilidade. Isso não foi suscitado, quer dizer, não foi acolhido. Se o STF tivesse entendido que a Lei da Ficha Limpa é irrazoável, ele teria dito”, afirmou.

Além disso, Fux afirmou que o TSE é submetido à jurisprudência do Supremo. A jurisprudência tem que ser íntegra coerente e estável. “Os tribunais locais não vão desrespeitar a jurisprudência do STJ. Nós não vamos desrespeitar a jurisprudência do Supremo, mas claro que podemos na análise do caso concreto, interpretarmos, somos intérpretes da lei na aplicação ao caso concreto”, disse.

Ao final, Fux ressaltou que não era hora de discutir se o que foi aplicado pela Lei da Ficha Limpa era um absurdo ou não. Até porque, “O absurdo está chancelado pelo Supremo. E o Direito é aquilo que os tribunais dizem que é”.

Nesta hora, Gilmar interrompeu o colega alegando que os ministros não poderiam chancelar algo que julgam absurdo. “Se o Supremo chancelar absurdos, o Supremo não faz do quadrado redondo. Data vênia. Isso não é conceito que se possa sustentar. Nem o Código Fux sustenta isso e nós não podemos chancelar. E eu mesmo vou defender a insurreição contra este tipo de jurisprudência”, ressaltou.

“E só para deixar claro, não se trata de aplicação cega de jurisprudência em lugar nenhum. O modelo americano propicia o overruling ou o distinguish. Então é isso. Se se cabe isso, é uma forma das Cortes dialogarem. Do contrário, se torna uma aplicação cega”, disparou Gilmar.

O ministro ainda criticou a forma como a Lei da Ficha Limpa foi aprovada ao afirmar que os ministros tiveram um “caso excepcional” que foi ter aceito uma “ação declaratória mambembe”, porque não atendia aos requisitos e pressupostos de admissibilidade. Não teve a controvérsia dos casos concretos. Não teve. De fato, não teve, não atendia aos requisitos”.

“Assim como o Congresso foi pressionado, nós também fomos pressionados e atendemos a recados de rua. Foi isso que aconteceu com o Supremo naquele caso. Depois tivemos esta… Depois nós tivemos tempero nesta jurisprudência. A única hombridade que tivemos foi não aplicar a questão da lei naquele ano. Ainda assim, se queria votar. Uma lei que era casuística e tudo mais. Nós estamos vendo aqui: aplica-se uma pena restritiva de direitos, o sujeito cumpre essa pena, se estende o prazo e se diz: “não, tem que cumprir”.

Fux afirmou então que concorda com o colega e ressaltou: “Podemos ponderar que a aplicação da Lei constitucional ela pode gerar decisão no caso concreto inconstitucional”.

Ministro Gilmar, disse Fux, “acho que nós acabamos de estabelecer uma belíssima equação. Ou seja, a Lei da Ficha Limpa ela tem a sua tipologia, só que às vezes a aplicação daquela previsão legal no caso concreto gera uma decisão absurda”.

E Gilmar respondeu: “É isso que estamos discutindo aqui”.

Fonte: Jota.

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