Dar a César o que é de César

SONY DSCPor Viegas Fernandes da Costa.*

Evangélicos, assim como todo Cristão coerente, pautam-se pelo amor ao próximo, pelo respeito, pela tolerância. Falo, claro, daqueles que compreendem os princípios teológicos do cristianismo, e não daqueles que fazem uso político da fé. Tenho profundo respeito pelos evangélicos, assim como pelos demais cristãos e pelos adeptos de outras fés que respeitam o ser humano e seu direito à felicidade, considerando a ética para consigo, para com os demais e para com o mundo em que vivem. Neste sentido, entendo que a permanência de Marco Feliciano à frente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias é uma afronta aos próprios evangélicos que ele diz representar. O que Marco Feliciano e seu partido, o PSC, estão tentando promover com seus discursos e a permanência do parlamentar na presidência da Comissão, é um verdadeiro confronto religioso que pode atingir proporções preocupantes.

A crítica a Feliciano não se dá porque ele é evangélico, mas porque manifestou-se racista, homofóbico, misógino e, segundo tudo indica, corrupto. Estes atributos não são dignos de alguém que se diz evangélico, de alguém que se diz cristão. Um cristão de verdade “dá a César o que é de César”, um cristão de verdade há muito teria renunciado em nome da paz, do bom senso, da convivência entre as diferenças. Ao se manter no cargo, Feliciano e o PSC procedem como Césares. Calígula, César romano do século I, declarou seu cavalo Incitatus como senador, de modo à defrontar e ridicularizar o Senado. O PSC, ao indicar Feliciano, assim o fez como forma de responder àquilo que considerou demérito político, já que esperava trocar seu apoio ao Executivo Federal por Comissão Parlamentar de maior prestígio político e mobilizadora de maiores recursos financeiros. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias era a sobra do tacho. Marco Feliciano é o cavalo de Calígula no Parlamento brasileiro.

O problema mais grave, entretanto, e criminoso (na minha opinião) é o PSC e o Deputado Marco Feliciano tentarem mobilizar igrejas evangélicas em defesa da sua permanência no cargo, dando a entender que a pressão da opinião pública para a sua saída se dá porque este é evangélico, ou porque é pastor, e isto é não apenas uma mentira e uma tentativa de manipulação de parte do seu eleitorado, mas estratégia criminosa porque: 1) não respeita o caráter laico do Estado brasileiro; 2) cria as condições para um embate religioso na sociedade brasileira, com consequências imprevisíveis, conforme já dito. Estes dois motivos, por si só, já deveriam ser suficientes para que o próprio Congresso Nacional responsabilizasse Marco Feliciano por quebra do decoro parlamentar.

“Dar a César o que é de César”! Se Feliciano é mesmo um pastor sério, preocupado com sua Igreja e coerente com a fé cristã, deve encerrar imediatamente isto que já se transformou há muito em ópera bufa, renunciado à presidência da Comissão. Em permanecendo, assume-se não apenas como representante dos mais vis interesses de uma política pequena e torpe, como incitará (assim como o cavalo Incitatus) a opinião pública brasileira a conflitos religiosos totalmente descabidos e cujos desdobramentos podem atingir proporções nocivas e duradouras.

* Viegas Fernandes da Costa é historiador e escritor.

Foto: http://josetorregrosa.wordpress.com/2012/02/02/lecturas-para-rogelios-9/

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