Crônica de um domingo que passou. Por Claudia Weinman.

Por Claudia Weinman, para Desacato. info.

“Tem dias que nem dá vontade de viver”. Ela começou a prosa assim e eu fiquei na escuta formulando um tema para rebater a frase. As ideias foram se misturando até que pensei:  

Está certa a mãe, vestida com a sua blusa preta, que desenha o corpo e me faz ver alguns quilos a menos. Está certa ela, com a calça de moletom, já sem aquele algodão que vem junto quando a roupa é nova. O moletom que o pai ganhou, mas não serviu, está certa ela de fazer bom uso.

Está certa ela com o chinelo de dedo, mesmo com ventinho frio tocando os pés. Está certa, cobre uma parte e deixa a outra respirar pelos chinelos já bem surradinhos de tanta calçada que ela esfregou com sabão em pó.

Está certa minha mãe. Seu lamento faz todo sentido. Mas deixa eu te cobrir de esperança, porque a dor que me causa tua tristeza é tamanha que não consigo permitir que ela tenha mais lugar do que nossos pequenos, grandes sonhos, tecidos na área da tua casa, enquanto tu me alcanças a cuia e eu te lembro que agora não dá para dividir, mas que eu posso te acompanhar no chá ou com a cuia que vai e volta do meu lar para o teu.

Deixa eu te dizer que nesta semana os pássaros finalmente fizeram ninho na casinha que faz tempo, estava vazia, na garagem de casa.  Eles executam melodias lindas e voam tão alto que os gatos se abaixam na janela quando passam.

Gostaria eu de te entregar essas palavras para compor o livro da tua vida. Mesmo com o braço dolorido pela semana puxada que tivemos todos, as palavras vêm como água morna que banha o corpo. Tem quem indique um analgésico para aliviar. Eu insisti na palavra, que preenche a linha como alimento nutrindo o corpo.

Sabe mãe, Jair Rodrigues estava cantando na TV enquanto eu comungava com o vocabulário. A casa até parece uma sala melódica e daqui da mesa de onde eu escrevo, escuto: “Adeus não, me diga até breve, adeus não, eu sou muzemza do reggae”. Então começo a pensar na outra canção que toca com Lazzo Matumbi cantando com Chico César: “Negam que aqui tem preto, negão, negam que aqui tem preconceito de cor”. Aquelas letras dançam pela casa e recebem Cida Moreira, depois a viola mansinha e o piano vaidoso.  Quem sabe ouvir música também te faça bem.

Eu sei que tem dias que nem dá vontade de viver, mas, deixa eu te dizer que eu entendo. Aceita a minha esperança e reparta ela com quem tu amas. Se a gente dividir, fica menos difícil.

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Claudia Weinman é jornalista, vice-presidenta da Cooperativa Comunicacional Sul. Militante do coletivo da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e Pastoral da Juventude Rural (PJR).

A opinião do autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.
#Desacato13Anos #SomandoVozes

 

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