CPT lança nota sobre decreto que vetava a expansão canavieira na floresta amazônica

Foco de incêndio na Floresta Amazônia em São Félix do Xingu, no Pará, registrado pelo Greenpeace. Foto: Divulgação via MST.

O governo revogou, na semana passada, um decreto que há dez anos vetava a expansão canavieira na floresta amazônica e também no Pantanal. A medida abre caminho para o cultivo da cana e, segundo pesquisadores, para mais desmatamento, queimadas e conflitos por terra. 

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou ontem uma nota sobre a decisão do governo, lembrando que revogar veto à expansão canavieira nos dois biomas é vista por pesquisadores e ex-ministros como ‘catastrófica’.

NOTA PÚBLICA

A cana será devastadora para a Amazônia e insustentável para o planeta

“Dessa maneira, a Igreja se compromete a ser aliada dos povos amazônicos para denunciar os ataques à vida das comunidades indígenas, os projetos que afetam o meio ambiente, a falta de demarcação de seus territórios e o modelo econômico. De desenvolvimento predatório e ecocida.” Documento Final do Sínodo da Amazônia, n. 46.

A perspectiva da sustentabilidade e do bem viver na Amazônia só tende a piorar depois do Decreto 10.084 de 05 de Novembro de 2019 do Governo Federal, que aguardou a finalização do Sínodo da Amazônia para revogar o zoneamento ambiental de 2009 e liberar a produção de cana-de-açúcar para etanol na Amazônia e no Pantanal. As comunidades amazônidas e pantaneiras devem resistir e se opor mais uma vez, como em 2005, contra o plantio de cana e as usinas de etanol, que ameaçam expandir o latifúndio e originar mais violência e conflitos agrários, pois prejudicam especialmente os  territórios da Amazônia e do Pantanal, desequilibrando os ecossistemas e a vida em dois dos biomas naturais mais importantes do Brasil.

A liberação do plantio de cana-de-açúcar já estava prevista e agora aparece claramente como um dos fatores que provocou o aumento da grilagem e das queimadas este ano, assim como o acirramento dos despejos de camponeses em 2019, criando mais cobiça e pressão fundiária acima dos territórios das comunidades tradicionais e de pequenos agricultores. Antes mesmo do decreto, promotores de usinas de etanol já estavam incentivando o cultivo intensivo de cana em algumas regiões amazônicas, como no Estado do Acre e em Porto Velho (RO), oferecendo supostas vantagens aos pequenos produtores, com o objetivo de transformar o território de vida do campesinato nas monoculturas da morte do agronegócio.

Já é comprovado que os problemas ambientais e sociais da monocultura da cana atingem diretamente os povos indígenas e as comunidades tradicionais, afetando todos os camponeses com a contaminação dos entornos dos canaviais pelo uso de agrotóxicos. A monocultura adoece as pessoas, emprega com superexploração ou por trabalho escravo, contamina o solo e as águas, envenena a vegetação e os animais, provoca insegurança alimentar e a morte dos peixes, dos campos naturais e dos cultivos das várzeas. O plantio de cana no Pantanal incidirá diretamente no turismo regional e intensivamente nas áreas indígenas.

Considerando inicialmente que a cana compete com áreas da soja e pecuária, na Amazônia produz-se o deslocamento da fronteira agrícola para os limites das áreas protegidas e territórios tradicionais, traduzindo-se em mais grilagem, desmatamento, violência e conflitos no campo. Ainda, a queima da cana para a colheita traz mais risco de incêndios e queimadas. Assim o plantio também será responsável direta e indiretamente pela redução das chuvas fornecidas pelos rios voadores, que carregam umidade da Bacia Amazônica para o Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil, Um cenário que contribui com o aquecimento global e agrava os efeitos das mudanças climáticas, com resultados negativos na redução de emissões brasileiras de carbono.  É uma falácia achar que o uso da porcentagem de etanol na gasolina dos carros, seja aqui ou na União Europeia, faz mais sustentável o transporte. O etanol na Amazônia e no Pantanal representa um cenário de mais violência, morte e destruição para os povos e para os biomas atingidos, que também não resultará em maiores lucros para o setor sucroalcooleiro, pois deve motivar a redução das exportações sujas com as cinzas das florestas amazônicas, e inclusive comprometer os programas europeus de uso de etanol.

O sacrifício em novembro de 2005 do ambientalista Francisco Anselmo (Francelmo) e a persistência das comunidades abençoadas pela Criação Divina, que protegem e guardam as águas, os campos e as florestas tropicais da Amazônia e do Pantanal, não serão em vão.

Articulação das CPT’s da Amazônia, 14 de Novembro de 2019

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