Coronavírus: ‘Estas palavras podem salvar vossas vidas’. Uma carta de Valter Hugo Mãe aos brasileiros.

Foto: Andre Coelho

Por Valter Hugo Mãe.

Caros amigos no Brasil, resolvi escrever esta mensagem por verificar que aí se demora na tomada de consciência acerca do que a covid-19 está provocando no mundo, desde logo, na Europa.

Pela vossa segurança e segurança dos vossos familiares e concidadãos, não tomem por exagerados os alertas que escutam vindos de fora. Preferível que cumpram as regras de protecção achando que talvez seja demasiado, a não terem cumprido e descobrirem que contribuíram para a dor ou morte de alguém.

a covid-19 não tem a taxa de mortalidade superior a outros vírus comuns, a questão é que ela vence os outros por ser infinitamente mais contagiosa, sobrevivendo mais tempo em superfícies e necessitando de um contacto ínfimo com a boca, os olhos ou o nariz para criar infecção.

O novo coronavírus não vai impactar na saúde de cerca de 80% dos infectados, no entanto, nos restantes casos, ele pode levar à morte, com taxas elevadas de óbitos em pessoas de saúde vulnerável, como são os mais velhos e os já enfermos.

A facilidade de transmissão deste vírus é tão grande que ele pode matar muito mais do que seria natural, simplesmente porque existem mais pessoas doentes do que qualquer sistema de saúde do mundo pode atender. Muitas pessoas, nos países onde se perdeu o controle, estão morrendo porque não há mais acesso à UTI. No terreno, igual ao que acontece em tempo de guerra, os médicos precisam optar pelos pacientes aos quais administram o tratamento e aqueles a quem não têm mais oportunidade de salvar.

Estima-se que na Itália e em Espanha (sobretudo na grande Madri), os óbitos já dizem respeito também às pessoas que chegam infectadas com 80 anos e são deixadas sem ventilador porque todos os equipamentos estão tomados por pessoas mais jovens que lutam por suas vidas. Há dias, falava-se que teriam de descer este critério para os 70 anos. É como muita gente precisar de um transplante de fígado ao mesmo tempo. Não vai ser possível transplantar toda a gente. As pessoas são simplesmente deixadas a morrer.

Não morre apenas quem chamamos de velho. Já morreram pessoas muito jovens, inúmeras com bem menos de 50 anos de idade. Não julguem nunca que podem oferecer o coronavírus aos outros e passar seguramente incólumes. Isso é um jogo de sorte e de profundo azar. Qualquer um pode morrer.

As regras para defesa perante esta pandemia passam por uma higiene muito complexa que vocês poderão aprender em páginas oficiais de boa informação. No entanto, a ÚNICA MEDIDA COMPLETAMENTE EFICAZ contra a pandemia de coronavírus, neste instante em que ainda não existe qualquer vacina, é o confinamento tendencialmente absoluto. É o apelo mais desesperado que nos fazem os médicos responsáveis: FIQUE EM CASA, pare todas as suas saídas que não sejam de pura sobrevivência, e NÃO SOCIALIZE de jeito nenhum.

O exemplo de vosso presidente é um desastre grotesco que em praticamente todos os regimes jurídicos configura crime de leviano contágio de doença potencialmente fatal.

Você demorará a entender quem está infectado. As crianças, inclusive, quase nem terão sintomas, no entanto, se estiverem infectadas, elas infectarão suas famílias e poderão com isso oferecer a morte dos mais velhos ou dos enfermos da família. É muito importante que vocês atentem nesta questão: perante o desafio, se vocês precisarem de deixar seus filhos menores com alguém, os AVÓS NÃO SÃO A SOLUÇÃO. Desta vez, vocês precisam separar completamente as crianças dos vulneráveis. Elas são o perigo mais invisível de entre todo este perigo invisível que nos ronda.

Comentei com amigos daí que sinto estar a escrever-vos do futuro, porque esta pandemia abateu-se sobre a Europa antes de ser clara no Brasil, e porque aqui tomamos as medidas que se julgam necessárias um pouco mais cedo. Vocês precisam mobilizar-se voluntariamente para esta preocupação. Infelizmente, o vosso presidente não só não é lúcido para alertar a população do Brasil, como age de modo irresponsável, não cumprindo as mais elementares regras para a segurança das outras pessoas. O exemplo de vosso presidente é um desastre grotesco que em praticamente todos os regimes jurídicos configura crime de leviano contágio de doença potencialmente fatal.

Assim, o Brasil são vocês mesmos, o povo extenso e diverso e de cultura brilhante que me apaixona. São vocês mesmos que, tomando consciência da urgência desta situação, podem escolher parar este vírus antes que os vossos hospitais não tenham nem um pouco de chão para pousar os infectados em estado grave.

Nesta quarta, 18 de março, na Itália, anunciaram que apenas em um dia morreram cerca de 500 pessoas. Num país com um dos melhores sistemas de saúde do mundo. Morreram pelo coronavírus, sim, mas morreram sobretudo porque o sistema colapsou. Vocês acreditam que o sistema de saúde brasileiro é melhor que o da Itália? Vocês vão esperar para descobrir o que acontece se agirem demasiado tarde? Já imaginaram quantas pessoas morrerão no gigante brasileiro se em Itália podem morrer 500 num só dia?

Se eu estiver “escrevendo do futuro”, percebam que não falo de mais de uns dias adiante. Estamos, talvez, 15 dias à frente. São os 15 dias que têm para salvar o vosso país de uma derrocada sanitária e econômica sem comparação com nada do que viram até agora.

Desejo-vos toda a sorte e toda a lucidez. Desejo-vos melhores políticos e sempre a grande arte que vos representa no mundo com esplendor. A paz e a sorte. Só com informação e cuidado pelos outros conseguiremos superar cada crise, cada ameaça.

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