Como lidar com Bolsonaro?

A ascensão de Jair Bolsonaro em todas as últimas pesquisas eleitorais, nas quais sempre aparece como segundo colocado atrás apenas do ex-presidente Lula, deveria ser motivo de preocupação para qualquer democrata. Há bons motivos para esperar que sua inconsistência programática, o pouco tempo de TV e a baixa capacidade de construir alianças partidárias vai minar a sua candidatura, mas os contra-exemplos das candidaturas de Donald Trump, nos Estados Unidos, e Marine Le Pen, na França, assim como o sucesso da campanha do Brexit, no Reino Unido, mostram que soluções radicais em momentos de crise política aguda podem ter sucesso.

A candidatura de Bolsonaro é uma aventura de grandes proporções. Ele não tem, nem vagamente, um programa de governo e, com a exceção de um certo corporativismo semi-sindical em defesa do setor militar, se fez como figura pública apenas menosprezando a democracia, os direitos humanos e qualquer forma de desvio da velha norma social.

Em entrevistas, sempre que foi colocado à prova o conteúdo programático da sua candidatura, sua profunda ignorância sobre as políticas públicas prevaleceu. No entanto, quando fala sobre direitos humanos, tortura, feminismo, racismo e anticomunismo, é capaz de despertar grandes paixões —nos seus adversários, mas também nos seus seguidores.

Nenhum dos principais candidatos a presidente para as eleições de 2018 encarna tão bem o papel de antiestablishment como Bolsonaro. O ex-capitão do Exército não tem partido político tradicional (apesar da intenção de voto alta, teve que se contentar com o nanico PEN), não tem a simpatia dos meios de comunicação, não tem apoio relevante entre o empresariado e definitivamente não tem nenhum apoio dos movimentos sociais e sindicatos.

Sua campanha foi construída inteiramente pela base e nas redes sociais, lutando contra tudo e contra todos. Em suas viagens pelo Brasil, Bolsonaro é recebido nos aeroportos por grandes multidões e suas palestras despertam paixões como não se vê em política há muito tempo. Entre os seus jovens seguidores, é chamado de “mito”.

Os analistas se dividem ao tentar explicar a natureza do fenômeno Bolsonaro. A intenção de voto nele parece ser um voto de protesto, profundamente antissistêmico —e o ódio do establishment ao seu radicalismo antidireitos humanos só contribuiria para a ampliação do fenômeno. Outros analistas ressaltam o papel no seu discurso do punitivismo militarista, uma corrente de opinião muito difundida na sociedade brasileira e da qual ele seria uma espécie de porta-voz. Finalmente, parece contribuir para o seu sucesso, a reputação que conseguiu forjar como pessoa honesta, o que, em tempos de Lava Jato, vale ouro.

Seja como for, a não ser que algum imprevisto sobrevenha, a sociedade brasileira precisa começar a pensar em como lidar com o crescimento da sua candidatura.

Num relatório muito influente sobre a ascensão global do populismo (“The Populist Explosion”, da Columbia Global Reports) publicado em 2016, o jornalista John Judis dá alguns elementos para pensar.

Ao tratar dos “populistas de direita”, um fenômeno que em alguns aspectos lembra Bolsonaro, Judis chama a atenção para o abuso conceitual que é tratar essas candidaturas como se fossem “fascistas”. Judis argumenta que, ao contrário do fascismo histórico, que era antidemocrático e expansionista, os novos populistas de direita não tem mostrado qualquer pendor expansionista, têm respeitado a alternância de poder no jogo da democracia liberal e seu racismo tem ficado razoavelmente circunscrito às políticas antimigratórias.

Devemos esperar o mesmo de Bolsonaro? Devemos “normalizar” a sua candidatura? Está mais do que na hora de levantar essas incômodas questões, agora que um em cada cinco brasileiros diz que pretende votar nele. Estamos contando demais que sua incapacidade intelectual, sua deficiência programática, seu isolamento político e que as regras do jogo eleitoral vão dar conta de enterrar sua candidatura a presidente.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos

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